25 de maio de 1988, Estugarda, Alemanha. Depois de ter afastado Partizani Tirana, Aarhus, Anderlecht e Steaua Bucareste, o Benfica chegava à final da Taça dos Campeões Europeus pela sexta vez, a primeira desde os anos 60, e à procura do terceiro troféu. Toni era o treinador e o plantel contava com Veloso, Mozer, Magnusson e Rui Águas. Do outro lado estava o PSV de Guus Hiddink e vários internacionais neerlandeses que se tornariam campeões europeus um mês depois, na Alemanha, como Koeman, Van Breukelen ou Van Aerle. Ao fim de 120 minutos, o nulo mantinha-se. Nas grandes penalidades, Veloso foi o único a falhar, o PSV ganhou e o Benfica prolongou a maldição de Béla Guttmann.

Esta quarta-feira, o Benfica procurava vingar Toni, Veloso, Mozer, Magnusson, Rui Águas e todos os outros. Na Luz, com pouco mais de 20 mil pessoas nas bancadas e a lotação permitida totalmente esgotada, a equipa de Jorge Jesus defrontava o PSV 33 anos depois da final de Estugarda — desta feita, na primeira mão do playoff de acesso à Liga dos Campeões, onde uma vitória na eliminatória significa desde logo a presença na fase de grupos da principal competição europeia e o encaixe de 37 milhões de euros. Depois de afastarem o Spartak Moscovo de Rui Vitória na terceira pré-eliminatória, os encarnados cruzavam com um adversário teoricamente mais complexo, que também ainda não havia perdido esta temporada, mas que deixava plenamente em aberto a possibilidade do apuramento.

Ficha de jogo

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Benfica-PSV, 2-1

Playoff de acesso à Liga dos Campeões

Estádio da Luz, em Lisboa

Árbitro: Felix Brych (Alemanha)

Benfica: Vlachodimos, Lucas Veríssimo, Otamendi, Morato, Diogo Gonçalves (Meïté, 73′), Weigl (Everton, 71′), João Mário (Taarabt, 86′), Grimaldo, Pizzi (André Almeida, 71′), Yaremchuk (Gonçalo Ramos, 71′), Rafa

Suplentes: Helton Leite, Gilberto, Waldschmidt, Gil Dias, Florentino, Gedson, Vinícius

Treinador: Jorge Jesus

PSV: Drommel, Mwene, André Ramalho, Boscagli (Obispo, 65′), Max (Teze, 89′), Van Ginkel (Pröpper, 65′), Sangaré, Madueke (Bruma, 73′), Götze, Gakpo, Zahavi (Vertessen, 89′)

Suplentes: Mvogo, Van Lare, Mauro Júnior, Ryan Thomas, Oppegård, Fodé Fofana

Treinador: Roger Schmidt

Golos: Rafa (10′), Weigl (42′), Gakpo (51′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Van Ginkel (57′), a Gakpo (58′), a Rafa (61′), a André Almeida (75′), a Meïté (86′), a Obispo (88′), a Gonçalo Ramos (90+2′)

O Benfica chegava a um dos jogos mais importantes desta temporada à procura da quinta vitória em cinco partidas neste arranque de temporada, naquele que já é o melhor começo de época de Jorge Jesus enquanto treinador dos encarnados. “São duas equipas que começaram muito bem a época, que já deviam estar na fase de grupos. Mas tem de ser e uma das duas vai ter de ficar de fora. Estamos preparados para um adversário que nos vai criar muitos problemas mas temos o nosso valor. Os nossos adeptos vão ser determinantes e podem ajudar-nos, sendo o nosso 12.º jogador. Às vezes até são o 10.º ou o 11.º, são mais importantes do que um ou outro jogador que não esteja a render tanto… O que interessa aqui é Benfica, Benfica, Benfica, é vencer, vencer, vencer”, disse o técnico, que deixou em aberto as duas principais dúvidas sobre o onze que iria apresentar: se ia atuar com quatro defesas ou três centrais e se ia colocar Gonçalo Ramos e Yaremchuk em simultâneo no ataque.

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Ora, as respostas acabaram por apontar na direção dos três centrais, mesmo sem Vertonghen e com Morato ao lado de Otamendi e Veríssimo, mas somente com Yaremchuk no ataque, já que Gonçalo Ramos começava na condição de suplente. Diogo Gonçalves voltava à titularidade na ala direita, depois de ter cumprido castigo contra o Arouca no Campeonato, Grimaldo também voltava à esquerda em detrimento de Gil Dias e Weigl e Rafa também regressavam ao onze face às saídas de Meïté e Everton. Do outro lado, Roger Schmidt deixava Bruma de fora das opções iniciais de lançava o israelita Zahavi no ataque, apoiado por Götze, Gakpo e Madueke. No banco do Benfica, porém, estava um jogador que interessava aos dois lados: Luca Waldschmidt é um dos alvos do PSV neste mercado e os neerlandeses já apresentaram mesmo uma proposta formal pelo avançado alemão, sendo que o Benfica exige 20 milhões e não admite descer dos 15 que desembolsou no verão passado para contratar o jogador ao Friburgo.

Na Luz, o Benfica começou melhor e com o objetivo claro de chegar rápido ao primeiro golo. Com Yaremchuk destacado na frente de ataque, Rafa e Pizzi tinham a tarefa de desequilibrar entre linhas e ir trocando de lado com diagonais, combinações e desmarcações que arrastavam defesas e deixavam as costas dos neerlandeses mais desprotegidas. Foi assim, com velozes variações de flanco, que os encarnados conseguiram aproximar-se da grande área adversária em três ocasiões nos primeiros 10 minutos, empurrando o PSV para trás e nem sequer permitindo muito espaço à equipa dos Países Baixos. Nessa sequência, o golo chegou logo na primeira verdadeira oportunidade.

Pizzi desbloqueou na esquerda e conseguiu soltar, já em esforço e no chão, para Yaremchuk. O avançado ucraniano acompanhou a desmarcação de Rafa e fez um passe de rotura perfeito para o internacional português, que até rematou fraco e enrolado à saída de Drommel mas acabou por conseguir inaugurar o marcador (10′). O Benfica colocava-se a ganhar ainda muito cedo na partida e sublinhava a importância de Yaremchuk na toada ofensiva do conjunto, com o reforço a participar em quatro golos desde que se estreou. Depois do golo, contudo, o jogo mudou totalmente de feição.

De forma natural, o PSV procurou reagir de imediato à desvantagem e subiu as linhas, forçando também o Benfica a recuar pela primeira vez no jogo. Com a lição claramente estudada, a equipa dos Países Baixos tombava totalmente para o corredor direito do ataque, o esquerdo da defesa portuguesa, e tentava explorar as fragilidades defensivas de Grimaldo. Madueke, na ala, partiu diversas vezes para o um para um contra o lateral espanhol e saiu quase sempre a ganhar, deixando a clara ideia de que Grimaldo não podia ficar sozinho na abordagem ao inglês. Com o passar dos minutos, Rafa passou a recuar cada vez mais para fazer as dobras e Morato também ficou mais atento às costas do espanhol para não permitir surpresas.

O PSV chegou a colocar a bola dentro da baliza do Benfica, com Zahavi a bater Vlachodimos depois de tirar Lucas Veríssimo da frente (28′), mas o lance foi anulado por fora de jogo do israelita. Logo depois, Gakpo assustou e obrigou o guarda-redes encarnado a uma grande intervenção com um remate forte na sequência de um passe longo (34′). O Benfica tentava ir subindo as linhas de pressão para encurtar o espaço de ação dos neerlandeses mas deparava-se com uma inferioridade numérica na zona do meio-campo que causava muitos problemas: João Mário e Weigl ficavam sozinhos na luta contra Sangaré, Van Ginkel e Götze, o trio de onde saíam as aberturas para o perigosíssimo Madueke. Os encarnados só conseguiam esticar o jogo através de transições rápidas e no contra-ataque, situações em que Pizzi ficou perto de aumentar a vantagem num lance em que foi desmarcado por Rafa (28′) e noutro em que atirou ao lado (37′), mas acabou por demonstrar novamente a enorme eficácia de que beneficia ainda antes do intervalo.

Nos últimos instantes da primeira parte, logo depois Lucas Veríssimo ter obrigado Drommel a uma enorme defesa com um remate de muito longe, Weigl acabou por aumentar a vantagem na sequência de um canto batido na direita: Otamendi subiu às alturas para ganhar ao segundo poste, a bola sobrou para um pequeno amontoado na pequena área e pingou para o lado, onde o alemão atirou para dentro da baliza (42′). O Benfica ia para o intervalo a ganhar de forma clara, apesar de ter passado um longo período da grande parte a gerir as arrancadas do PSV, e destacavam-se as exibições de Rafa no setor ofensivo e de Lucas Veríssimo no setor defensivo.

[Veja os golos do Benfica-PSV:]

Na segunda parte, sem que Jorge Jesus e Roger Schmidt fizessem alterações, o Benfica voltou a começar melhor e criou desde logo uma boa oportunidade, com Yaremchuk a atirar ao lado à entrada da grande área (47′) — ainda que estivesse fora de jogo. Ainda assim, com o adiantar do relógio, o desgaste físico dos encarnados começou a revelar-se e o PSV assumiu alguma superioridade, embora de forma diferente daquela que havia mostrado no primeiro tempo. Com Grimaldo a encurtar o espaço que permitia a Madueke e Morato a desempenhar bem melhor as dobras ao lateral espanhol, os neerlandeses passaram a apostar nas diagonais da esquerda para o meio, com Gakpo a explodir em velocidade sempre que conseguia ter a bola.

Foi assim, precisamente, que o PSV chegou ao golo. João Mário perdeu a bola no meio-campo, numa altura em que a defesa do Benfica estava algo desposicionada, e Gakpo aproveitou para recolher e para se aventurar num lance individual: levou pela esquerda sem grande oposição, conduziu para o corredor central e atirou forte para dentro da baliza, sem que nenhum defesa encarnado conseguisse evitar ou bloquear o remate (51′). A equipa de Roger Schmidt teve uma boa oportunidade para empatar pouco depois, com Götze a aparecer na cara de Vlachodimos depois de um lance desenhado com regra e esquadro mas a permitir a defesa do guarda-redes (64′), e o treinador alemão decidiu refrescar os setores chave da equipa. Saíram Van Ginkel, que até já tinha cartão amarelo, e Boscagli e entraram Pröpper e Obispo — sendo que o primeiro, principalmente, encaixou perfeitamente no meio-campo do PSV e ofereceu mais soluções à criatividade ofensiva da equipa.

O Benfica ia demonstrando muitas dificuldades para responder à velocidade dos elementos mais adiantados do adversário e não conseguia reter a posse de bola, com João Mário e Rafa a perderem por completo o fulgor que haviam apresentado até ao intervalo. Jorge Jesus procurou reagir com quatro substituições em dois minutos e tirou Diogo Gonçalves, Weigl, Pizzi e Yaremchuk para lançar André Almeida, Meïté, Everton e Gonçalo Ramos. Schmidt voltou a mexer, ao trocar um já fatigado Madueke por Bruma, e o jogo entrou numa fase mais incaracterística, com várias paragens e muita luta no meio-campo.

Até ao fim, já pouco aconteceu. Jesus ainda deu descanso a João Mário, que estava totalmente exausto e foi substituído por Taarabt, e só Gonçalo Ramos conseguiu dar resposta a partir do banco, não tanto no ataque mas com um enorme e assinalável sacrifício defensivo que foi fulcral nos últimos minutos. O PSV ainda assustou nos descontos, num lance em que Bruma procurou o desvio de Vertessen ao segundo poste e o avançado chegou atrasado (90+3′), mas o Benfica conseguiu mesmo resguardar a vantagem e carimbar a vitória.

O Benfica conseguiu derrotar o PSV na Luz e parte em vantagem para a segunda mão do playoff de acesso à Liga dos Campeões, marcada para a próxima terça-feira, em Eindhoven. Os encarnados conquistaram a quinta vitória em cinco jogos neste arranque de temporada e ganharam principalmente graças a uma primeira parte muito eficaz, tanto ofensiva como defensivamente, e a uma enorme exibição de Vlachodimos. O fio condutor do jogo encarnado, porém, foi apenas um: Lucas Veríssimo, que não permite espaços na defesa, que não falha passes verticais e que até ficou perto de marcar. Se já se sabia, o central brasileiro confirmou que é uma das pedras basilares do Benfica.