Na Coreia do Norte os detidos são forçados a trabalhos manuais extenuantes e sujeitos a agressões tão severas que podem mesmo representar “tortura”, afirma a Organização das Nações Unidas (ONU) num relatório que traça uma visão global da situação dos direitos humanos neste país, entre agosto de 2020 e julho deste ano.

O documento, citado pelo jornal The Guardian e que pode ser lido na íntegra aqui, destaca o uso “sistemático e generalizado” tanto de punições cruéis e desproporcionais, como de trabalho forçado, aspetos já assinalados em anos anteriores.

Num país já há décadas repressivo, a pandemia de Covid-19 veio agravar as preocupações com os direitos humanos, com as restrições à circulação a impedir que abastecimentos de bens essenciais chegassem ao país, o que, afirma a ONU, pode ter piorado a situação alimentar da população e, principalmente, dos detidos. Além disto, durante a pandemia, o país asiático viu o comércio com a China a declinar acentuadamente, o que — em conjunto com desastres naturais e sanções internacionais — desencadeou uma crise económica.

A investigação, que contém vários relatos fornecidos ao Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos (OHCHR), testemunha a insuficiência e a pobre qualidade da comida disponível nos estabelecimentos prisionais. Duas pessoas que conseguiram fugir da prisão contaram que havia mesmo mortes em resultado de malnutrição nestes locais.

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Assinado pelo secretário-geral da organização intergovernamental, António Guterres, o relatório escreve que os relatos confirmam “padrões consistentes de violações dos direitos humanos”. Um deles é o de uma mulher que ficou com a pele do rosto aberta, o queixo deslocado e menos quatro dentes, depois de ter sido agredida com um tronco, num centro de detenção pré-julgamento. Também num centro deste tipo, outra mulher narra que foi espancada com um bastão, uma cadeira e um cinto de couro, pelos oficiais do Ministério de Segurança.

Alguns detidos tinham de pôr as cabeças nas grades [das celas] e os guardas batiam-lhes com um bastão pesado… Éramos como sacos de pancada para eles”, disse ainda.

Por sua vez, outra ex-reclusa revelou que ela e os companheiros foram forçados a trabalhos agrícolas, e exemplificou que teve de arrastar carroças que “normalmente são as vacas que puxam”.

A maioria dos testemunhos que compõem o relatório — que será apresentado na assembleia geral da ONU em setembro — são de ex-detidos de prisões, centros pré-julgamento e campos de trabalho. Ainda assim, estas pessoas revelam que há outras que são enviadas para campos de prisão política devido a “deslealdade”: como tentativas de ir para a Coreia do Sul, críticas ao Estado ou ainda atividade religiosa.