“A Lenda do Cavaleiro Verde”

Terceira adaptação ao cinema do poema medieval “Sir Gawain and the Green Knight”, que faz parte do ciclo de narrativas relacionadas com o Rei Artur e os Cavaleiros da Távola Redonda e que foi, entre outros, estudado por Tolkien, esta realização de David Lowery sofre do mesmo mal que parece atingir todas as leituras cinematográficas contemporâneas de textos clássicos: uma atitude revisionista e de desconstrução, que põe em causa e critica o conjunto de valores representados naqueles, demonstrando escassa ou nula compreensão do contexto histórico, social e artístico em que foram elaborados. Neste aspeto, e apesar da sua sumptuosidade visual, “A Lenda do Cavaleiro Verde” apresenta-se como o anti-“Excalibur” de John Boorman. Até “A Espada dos Valentes”, a versão em estilo de filme de aventuras que Stephen Weeks tirou do mesmo poema em 1984, com Sean Connery num imponente Cavaleiro Verde, é, com todos os seus defeitos, mais autêntica do que esta de Lowery. Que também não é ajudada pelo “casting” politicamente correto, e claramente absurdo, do ator britânico de origem indiana Dev Patel no papel de Gawain (para quando um Rei Artur chinês?). Mil vezes o canastrão Miles O’Keefe de “A Espada dos Valentes”.

“Má Sorte no Sexo ou Porno Acidental”

Vencedora do Festival de Berlim deste ano, esta desconcertante fita do romeno Radu Jude recorre a tudo, até a uma abertura com sexo explícito, para realçar a sua pose iconoclasta, mas nada feito. O filme está dividido em três partes, a primeira e a terceira preenchidas com a história de Emi, uma professora de um colégio particular de Bucareste que fez um vídeo de sexo que foi parar à Internet, e tem de se defender das pressões para se demitir numa reunião com a diretora e os pais de vários alunos seus. A parte do meio é um dicionário visual  sobre uma série de assuntos, entre políticos e sexuais. Cultivando um absurdismo cómico e pseudo-provocador que poucas vezes tem graça e quase nunca choca, Jude quer, por um lado, atacar vários aspetos da sociedade romena contemporânea e da história recente do país, vários dos quais nos escapam por serem muito específicos; e pelo outro, denunciar a “hipocrisia moral” dos nossos tempos, que é amplificada pelas redes sociais. “Má Sorte no Sexo ou Porno Acidental” não passa do mau filme de um cineasta armado ao pingarelho de “enfant terrible”.

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“Valor da Vida”

Realizado por Sara Colangelo, “Valor da Vida” passa-se depois dos ataques e centra-se em Kenneth Feinberg (Michael Keaton), o advogado especializado em litígios que foi encarregue pelo governo dos EUA para gerir o fundo de compensação criado para indemnizar os familiares das vítimas, e calcular quanto deveria ser pago a cada uma delas. Ou seja, de definir quanto valia cada vida humana perdida nos ataques. Feinberg e a sua equipa, cientes de que não se pode atribuir um valor à vida de uma pessoa tentam abordar o caso da forma mais justa, objetiva e desapaixonada possível, seguindo a letra da lei e evitando considerações filosóficas ou outras que abram lugar à subjetividade.  Surge então Charles Wolf (Stanley Tucci), que perdeu a mulher nos atentados, não concorda com a fórmula concebida por aquele e cria um movimento chamado Fix the Fund, para corrigir as deficiências do fundo e fazer ver a Feinberg que precisa também de ter em causa o fator humano e não funcionar só com equações matemáticas. “Valor da Vida” foi escolhido como filme da semana pelo Observador, e pode ler a crítica aqui.