O presidente da Assembleia da República considera que os atentados de 11 de Setembro provocaram um aumento das tendências securitárias nas democracias, critica a atuação norte-americana no Iraque e Afeganistão, e defende mais cooperação contra o terrorismo.

Estas posições foram transmitidas por Ferro Rodrigues à agência Lusa, a propósito dos 20 anos dos atentados reivindicados pela Al-Qaeda nos Estados Unidos.

“Nessa manhã de 11 de setembro de 2001, estava no Largo do Rato, sede do PS, numa reunião preparatória daquelas autárquicas que acabaram por ser terríveis no plano eleitoral para o partido, mas também terríveis para mim pelas consequências que tiveram”, declarou Ferro Rodrigues – uma alusão a um ato eleitoral que levou António Guterres a demitir-se das suas funções de primeiro-ministro e de secretário-geral do PS em dezembro de 2001, sendo depois substituído na liderança dos socialistas pelo atual presidente da Assembleia da República no início do ano seguinte.

No dia 11 de setembro de 2001, o presidente da Assembleia da República disse que foi avisado pela sua filha da notícia do primeiro avião que embateu nas torres do World Trade Centre, em Nova Iorque, e que viu já em direto a colisão do segundo avião.

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Foi um momento que é impossível esquecer pelo dramatismo, pela tragédia, pelo horror, pelos muitos mortos, pelos bombeiros que se sacrificaram ao tentar salvar pessoas e que morreram às dezenas e pelos cinco portugueses que também acabaram por falecer nesse dia. Todos tivemos consciência de que começava um novo período na vida global em sociedade. Um ataque como aquele tinha de ter consequências“, concluiu o antigo líder do PS.

Interrogado sobre as principais consequências destes atentados, Ferro Rodrigues começou por observar que “a democracia tem sempre um equilíbrio entre liberdade e segurança”.

A partir de 11 de setembro de 2001, o prato da segurança ficou com mais peso do que tinha até então. É um facto que as tendências securitárias ganharam cada vez mais peso depois do 11 de setembro. Nessa altura, também pareceu a todos lógico que houvesse uma resposta imediata por parte dos Estados Unidos, sabendo-se que o regime talibã tinha uma grande influência nos acontecimentos. Portanto, não foi de espantar o ataque que se seguiu no Afeganistão”, sustentou.

Em 2003, no entanto, quando os Estados Unidos colocaram aos seus aliados o desafio de uma intervenção militar no Iraque, Ferro Rodrigues, então líder do PS, manifestou-se contra, demarcando-se do apoio dado pelo então primeiro-ministro Durão Barroso à administração de George W. Bush.

Estive em várias manifestações contra essa intervenção norte-americana no Iraque, aliás, em algumas delas com o atual secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres. Essa intervenção era já um aproveitamento para levar longe demais – e em circunstâncias que iriam conduzir a resultados muito negativos em todo o Médio Oriente — a tragédia do 11 de setembro”, criticou.

Já em relação ao Afeganistão e à recente retirada militar impulsionada pelos Estados Unidos, o presidente da Assembleia da República salientou que “não serão esquecidas as imagens de Cabul e do pânico de milhares e milhares de pessoas que queriam sair do Afeganistão com receio em relação ao novo regime”.

“Muitas não conseguiram sair”, assinalou, antes de realçar que há 20 anos havia “uma esmagadora maioria [de países] de acordo com uma intervenção bem medida no Afeganistão”.

E as tropas portuguesas foram para o Afeganistão sob mandato do Conselho de Segurança das Nações Unidas, onde estiveram em grande nível do ponto de vista da sua presença e da sua capacidade para ajudar a reconstruir o país”, defendeu.

Porém, na perspetiva do presidente do parlamento, caso se faça um balanço de duas décadas de presença militar externa no Afeganistão, conclui-se que há vários resultados negativos.

Quando vemos o armamento norte-americano nas mãos dos talibãs e quando vemos a situação de grande confusão e de grande dificuldade em se poder acreditar na palavra dos responsáveis daquele regime, é evidente que se chega à conclusão de que houve muitos erros. Houve erros sobretudo norte-americanos neste processo. E são erros que atingem todas as administrações e não apenas a atual. Atingem a de Donald Trump, a que negociou com os talibãs, mas também as de Obama e de George W. Bush, que esteve no início de todo este processo”, indicou.

Na atual situação, de acordo com Ferro Rodrigues, cabe aos portugueses serem “solidários com os afegãos que quiseram um país melhor e correm agora um risco de perseguição”.

É um dever ético que não pode ficar-se pela aceitação em território nacional e implica um esforço no sentido de lhes serem proporcionadas as ferramentas práticas para que possam refazer as suas vidas e ser parte ativa e plena da sociedade portuguesa”, advertiu.

Ainda segundo o presidente da Assembleia da República, no plano externo, cabe a Portugal e às democracias “agir na prevenção, atalhar com celeridade e eficácia situações de atentados à segurança de pessoas e bens”.

Enquanto parceiros e aliados, devemos cooperar na partilha de informação e sermos solidários. Em suma, há que trabalhar juntos, de forma cooperativa. A Al-Qaeda continua a ser motivo de preocupação e há hoje uma metástase de fenómenos terroristas. Basta ter presente a situação em Cabo Delgado, Moçambique”, acrescentou.