Os prejuízos do grupo estatal cabo-verdiano Electra, de produção de eletricidade e água, dispararam em 2020 para 505 milhões de escudos (4,5 milhões de euros), mas as dívidas de clientes somam 11.330 milhões de escudos (102,6 milhões de euros).

A informação consta do relatório e contas de 2020 do grupo Electra, a que a Lusa teve acesso esta terça-feira, indicando que as dívidas de clientes — que a empresa descreve como o maior problema que enfrenta na gestão – até desceram ligeiramente no ano passado, 1,7% face aos 11.525 milhões de escudos (104,5 milhões de euros) de 2019.

A maior fatia das dívidas ao grupo — que o Governo pretende privatizar e que integra a Electra SA, Electra Sul e Electra Norte — é de consumidores domésticos, 5.547 milhões de escudos (50,2 milhões de euros), seguindo-se as autarquias, com 2.059 milhões de escudos (18,6 milhões de euros), as empresas públicas, com 1.918 milhões de escudos (17,3 milhões de euros), as empresas privadas, com 1.458 milhões de escudos (13,2 milhões de euros), e o Estado, com 345 milhões de escudos (3,1 milhões de euros).

Da dívida global associada às três empresas do grupo, 61,5% é das contas da Electra Sul, que serve a ilha de Santiago, a mais populosa do arquipélago.

O grupo registou uma quebra de 11,9% no volume de negócios em 2020 face ao ano anterior, para 8.492 milhões de escudos (77 milhões de euros), enquanto os resultados líquidos foram negativos (prejuízos) em 505 milhões de escudos (4,5 milhões de euros), aumentando mais de 35% face aos prejuízos de 368 milhões de escudos (3,3 milhões de euros) em 2019.

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Os impactos resultantes nos negócios da empresa ficaram evidentes em 2020, representando perdas muito importantes para o ano em referência. A dimensão do impacto dependerá grandemente do tempo de duração da pandemia e da capacidade do país em fazer frente à grande crise económica resultante da crise sanitária que ainda atravessamos”, lê-se na mensagem no relatório e contas do presidente do conselho de administração, Alcindo da Cruz Mota.

Segundo o documento, o grupo produziu 419,2 Gigawatt-hora (GWh) de eletricidade em 2020, sendo 83,2% de origem térmica, 15,2% eólica e 1,6% solar.

Em relação a 2019, registou-se uma diminuição da produção de eletricidade em 5,5%, constatando a Electra “uma retração dos níveis da produção de eletricidade em torno de 30,9% na ilha do Sal, a ilha mais afetada pelo impacto da crise, originada pela pandemia covid-19”, sendo também a mais procurada pelos turistas, atividade que parou em março do ano passado.

Na produção de água dessalinizada, através dos centros produtores em São Vicente, Sal e Santiago, o grupo garantiu um abastecimento total na ordem dos 8,3 milhões de metros cúbicos, e registou uma quebra de cerca de 3% nesse consumo.

O grupo Electra fechou 2020 com um total de 813 trabalhadores.

O Governo cabo-verdiano aprovou em julho o processo de privatização da Electra, envolvendo a cisão em duas sociedades, de produção e distribuição de eletricidade, e posterior alienação de até 75% do capital a parceiros estratégicos.

Segundo um decreto-lei do Conselho de Ministros publicada em 21 de julho, que aprova o processo de privatização, o mesmo deverá avançar em 2022 e está “em linha com as reformas económicas e estruturais preconizadas no Programa do Governo”, para “redução dos custos e a promoção e eficiência económica” na área da energia.

O Governo pretende proceder à revisão do modelo de organização do setor elétrico, a restruturação da Electra SA e à subsequente retirada do Estado das duas sociedades em fase de constituição por cisão da atual Electra SA para, respetivamente, o exercício das atividades de produção e de distribuição de eletricidade, mediante alienação de suas participações sociais a parceiros estratégicos selecionados através de concurso público”, lê-se no preâmbulo do decreto-lei.

O processo envolve apenas a componente de eletricidade — a produção e distribuição de água manter-se-á com a Electra, pública — prevê a alienação “a um parceiro estratégico, até ao limite de 75% das ações representativas do capital social de cada uma das sociedades resultantes da cisão e/ou aumento de capital social das sociedades para alienação das ações”, recorrendo a concurso público.

Envolve ainda a “alienação a trabalhadores, emigrantes de nacionalidade cabo-verdiana e pequenos acionistas, até ao limite de 25%”, através de uma oferta pública de venda.

O preço das ações destinadas aos trabalhadores e emigrantes cabo-verdianos “deve ser determinado com o valor médio da avaliação, beneficiando de um desconto de 15%”, prevê ainda o diploma.

Refere também que os processos de alienação “só podem ser iniciados depois da criação das duas sociedades que resultarão da cisão da atual Electra SA, em curso, sendo que esta última mantém a sua personalidade jurídica após a reestruturação operada pela cisão”.

O programa de reformas para o Setor Empresarial do Estado, iniciado na anterior legislatura (2016/2021) pelo atual Governo, envolvia 23 empresas, com privatizações e subconcessões na área dos transportes, eletricidade ou saúde, entre outros.

Segundo um relatório anterior do Fundo Monetário Internacional, 10 dessas empresas públicas apresentaram prejuízos em 2018.