A canoagem conseguiu aqueles que foram os melhores resultados de sempre numa edição dos Mundiais, entre o ouro de Fernando Pimenta no K1 1.000, as pratas do mesmo Pimenta em K1 5.000, de João Ribeiro em K1 500 e de Francisca Laia/Messias Baptista em K2 200 mistos, e o bronze de Norberto Mourão em VL2, naquele que foi também o ciclo olímpico que culminou com o maior número de medalhas nos Jogos, entre o ouro de Pedro Pablo Pichardo no triplo, a prata de Patrícia Mamona também no triplo e os bronzes de Fernando Pimenta em K1 1.000 e de Jorge Fonseca em -100kg. Cinco anos depois, a página virou.

[Ouça aqui a entrevista no Nem tudo o que vai à rede é bola da Rádio Observador]

“Ganhamos muito mas só temos 3.500 federados”

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Em entrevista ao “Nem tudo o que vai à rede é bola” da Rádio Observador, Mário Santos, antigo presidente da Federação Portuguesa de Canoagem entre 2004 e 2013 e chefe de Missão de Portugal nos Jogos de 2012 em Londres que pertence hoje ao board da Federação Internacional de Canoagem, elogiou a participação da delegação nacional nos últimos Mundiais e explicou também as diferenças de investimento que existem entre os principais países na canoagem, relacionadas com a pequena base de praticantes.

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“Tenho de confessar que pelo nível da canoagem portuguesa nos últimos anos e pela capacidade de chegar a finais que estava à espera, num dia ‘sim’ conseguimos. Foi um balanço positivo, os melhores resultados de sempre em Mundiais, com atletas que já tinham demonstrado o seu nível e felizmente alinharam-se vários resultados no mesmo evento. Vi também a experiência do K2 mistos com enorme agrado, em Portugal nos Jogos Europeus Universitários tivemos um dos primeiros casos e, até noutros desportos, tem vindo a surgir para garantir a igualdade de género a nível de eventos e com enorme competitividade”, começou por dizer, antes de elencar os desafios colocados pela pandemia e pelo calendário.

[Ouça aqui a entrevista a Vítor Félix, presidente da Federação, à Rádio Observador]

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“Tem sido um ano bastante difícil porque tivemos de viver o apuramento olímpico ainda esta época e um calendário que já estava desenhado e que teve de ser conjugado não só com os Jogos Olímpicos mas com as restrições por causa da pandemia que ainda existem em alguns países, quer de treino, quer de competição. Foi difícil mas ao mesmo tempo desafiante e motivador para aquilo que está a ser também a retoma do desporto com quatros competitivos de nível como aconteceu”, salientou Mário Santos.

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Em paralelo, e numa altura em que modalidades de mar como a canoagem vão tendo um número cada vez maior de interessados, o dirigente falou também do que falta para que esse crescendo se possa traduzir depois num aumento do número de praticantes federados para manter a renovação na Seleção.

[Ouça aqui a entrevista de Fernando Pimenta à Rádio Observador]

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“O grande desafio da canoagem em particular e do desporto em geral é mesmo esse, para manter esse nível mais competitivo e de resultados internacionais conseguir alargar uma base de praticantes nos mais diversos níveis e especialidades. Para isso, é necessário repensar o investimento estratégico em algumas modalidades que em Portugal podem equilibrar esse alto rendimento e uma base de prática desportiva que é ainda muito baixa em comparação com os nossos adversários. A Federação de Canoagem e os poucos clubes que temos não conseguem assegurar essa oferta. É um problema transversal a muitas modalidades, não pode estar dependente do talento dos atletas e da boa vontade dos dirigentes mas sim de uma estratégia de política pública que é necessário para que isso se concretize”, considerou.

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“A canoagem, pelo rendimento, pela capacidade de organização de eventos e pela capacidade de atração pode atingir um nível que muitas vezes achamos que não está ao nosso alcance. Distância? Teremos que ver também a população mas também a situação desportiva de outros países porque existe uma disseminação grande e um grande investimento em centros náuticos, treinadores e clubes, tendo essa alavanca do investimento público para dar resposta ao número de praticantes. O número de praticantes nesses países é elevadíssimo enquanto que em Portugal, num momento que subiu bastante, estamos a falar em cerca de 3.500 praticantes. Só para termos noção, os nossos vizinhos espanhóis têm mais atletas federados do que nós só na Galiza. Estamos a falar de países que se calhar investem mais só na canoagem do que Portugal só na sua preparação olímpica”, explicou em comparação com países como Espanha.

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“A canoagem portuguesa tem conseguido resultados contra estes adversários, tem demonstrado no alto rendimento capacidade competitiva, tem demonstrado capacidade de atração, não nos podemos esquecer que temos o maior fabricante de barcos, temos a maior parte das equipas a estagiar em Portugal no inverno, temos várias equipas a competir em Montemor-o-Velho no Centro de Alto Rendimento e agora também noutras especialidades como a maratona e a canoagem de mar. O nosso grande défice é a base e isso está dependente do investimento e de políticas públicas. Se esperava mais investimento? A performance desportiva a nível olímpico, de Mundiais e de Europeus desde sobretudo 2009 tem vindo a somar várias medalhas e finais nos Jogos. Isso tem vindo a ser concretizado. Em relação a investimento, não tem vindo a ver reconhecida essa capacidade e esses resultados não têm sido seguidos por um reforço tendo por base a meritocracia, algo que não é de agora”, acrescentou ainda a esse propósito.

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Já sobre os Jogos Olímpicos, Mário Santos destacou as quatro medalhas conseguidas em Tóquio, defendeu que a bitola nacional deverá estar nesse número e destacou a crescente competitividade que faz com que os pódios sejam cada vez mais complicados de conseguir, seja em Paris, seja nas próximas edições. Sobre as eleições do Comité Olímpico de Portugal e o próximo ciclo de apenas três anos, o dirigente fala ainda da importância de projetar as próximas duas edições de Los Angeles e Brisbane.

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“Os resultados da Missão portuguesa são positivos, os melhores de sempre a nível de medalhas e com um número significativo entre os oito primeiros, ainda para mais num momento difícil porque entendo que em cada edição dos Jogos mais difícil se torna a conquista de medalhas. Entram novas modalidades mas a competitividade, e felizmente, é maior. Dentro de um modelo de insatisfação que é o meu, um País como o nosso tem de almejar esses números e não os 0-3 que é a nossa realidade”, referiu, dizendo ainda que a canoagem em específico tem potencial para ganhar pela primeira vez duas medalhas nos Jogos, “pela qualidade dos atletas e por ser uma geração de ouro que está a fazer também a sua renovação”.

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“Eleições do COP? Não sei se vai haver ou não uma recandidatura, será uma decisão do Professor José Manuel Constantino e também das federações desportivas, que têm de alavancar as candidaturas. Estamos num ciclo mais curto mas que não nos deves desresponsabilizar. Um Fernando Pimenta, um João Ribeiro ou um Emanuel Silva não aparecem de um dia para o outro, é preciso trabalhar estes resultados. Essas decisões estratégicas serão importantes neste ciclo, não para garantir resultados em Paris mas para criar condições para que existam em Los Angeles e Brisbane. Da minha parte, tenho a ambição e sinto-me com capacidade e energia para contribuir para alguns projetos dentro do desporto nacional, com o objetivo de ter mais pessoas a praticar desporto e que isso possa permitir a obtenção de resultados desportivos e um modelo de sociedade na qual o desporto é parte integrante e com uma grande base”, concluiu Mário Santos, que é candidato a vice nas eleições da Federação Internacional de Canoagem.