Os chineses da Nio dizem ter pronto para entrar em produção um carro eléctrico com 1000 km de autonomia, o ET7. O número é redondo e fica no ouvido por exceder tudo o que existe, de momento, no mercado dos veículos ligeiros a bateria. Mas o alcance prometido pelo ET7 é calculado em NEDC, o que significa que ficará algures na casa dos 800 km em WLTP, o sistema europeu. Mais realista, porque já homologado, é o alcance anunciado pelo Air Dream Edition Range, a berlina da norte-americana Lucid que viu ser certificada, pelo método norte-americano EPA, uma autonomia de 837 km, valor que em WLTP facilmente superará os 900 km, ficando por isso muito próximo do número “mágico” – os tais 1000 km de autonomia.

Ora, sendo a Nio e a Lucid jovens marcas e, como tal, ainda longe de terem os pergaminhos da BMW, os australianos da WichCar aproveitaram a oportunidade de falar com o porta-voz da BMW para a electromobilidade, Wieland Bruch, para lhe perguntar o que é que a BMW pensa fazer a esse respeito. E a resposta, vinda de um construtor que alicerçou, em parte, a sua reputação por procurar estar na vanguarda da tecnologia, surpreendeu: nada!

 Não temos como meta alcançar 1000 km de autonomia com os nossos carros 100% eléctricos”, avançou Bruch, esclarecendo depois quais são os objectivos da marca bávara: “600 km para os modelos puramente eléctricos e 100 km para os híbridos plug-in (PHEV)”.

É um facto que 100 km nos PHEV já garante que grande parte das deslocações se faz em modo eléctrico e sem quaisquer emissões, desde que a bateria seja recarregada. Também não é menos verdade que 600 km de autonomia para os BEV é uma fasquia que a marca alemã já alcançou com o seu i4 eDrive40, que anuncia 585 km em WLTP. Daí a surpresa de ouvir um responsável da BMW a dizer que a marca vai ficar por aqui, estagnada, porque não é preciso mais, defende Wieland Bruch. Mas será que chega mesmo, quando se sabe que os 585 km anunciados pelo i4, na prática, devem baixar para uns 400 a 475 km em condições reais de utilização (numa estimativa optimista), ou cair ainda mais se o condutor decidir dar uso à capacidade de reboque anunciada pelo i4 (1600 kg)?

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Na perspectiva de Wieland Bruch, é suficiente. Das declarações deste responsável da BMW depreende-se que quem quiser fazer viagens mais longas tem de contar com a infraestrutura de carregamento existente. “A rede pública de postos de carga está em rápida expansão. Atravessar a Europa, da Noruega à Itália, já é uma experiência agradável quando se viaja num carro eléctrico”, disse à citada publicação. Agradável até pode ser, mas não para todos, a avaliar pela experiência de Herbert Diess, o patrão da VW, o conglomerado alemão que, tal como o BMW Group, integra a Ionity. O consórcio que junta ainda a Daimler, Ford e a Hyundai-Kia prometeu uma rede europeia de carga super rápida e com ampla cobertura, mas tem ficado aquém dos objectivos no número de postos de carga e, mais grave, no preço a que é cobrada a energia e na experiência de utilização.

Postos da Ionity chegam tarde a Portugal, são caros e não cumprem

A própria BMW já criticou a lentidão da Ionity na ampliação da rede, sem a qual dificilmente os clientes da marca podem desfrutar da rapidez destes postos em viagens de maiores distância. O i4, por exemplo, aceita carga rápida em corrente contínua até 200 kW, sendo que a bateria da berlina alemã (83,9 kWh de capacidade bruta; 80,7 kWh úteis) pode ir de 0 a 80% em meia hora. Mas isso só acontecerá se os clientes efectivamente tiverem onde carregar – em Portugal, existem apenas 4 postos. Contudo, Wieland Bruch considera que os cerca de 600 km do i4 ou do iX já são um compromisso “muito amigável” para o cliente, argumentando que a autonomia deve depender do segmento.

Actualmente, a Lucid lidera em autonomia, seguida da Mercedes com o EQS (até 770 km) e da Tesla com os 652 km do Model S Long Range. Curiosamente, a Tesla chegou a prometer um Plaid+ com 840 km de alcance entre recargas, mas depois fez marcha-atrás por um possível atraso no desenvolvimento das novas baterias 4680.

Actualizado a 29/09/2021 com a substituição do nome David Ferrufino, líder do projecto do BMW i4, por Wieland Bruch, porta-voz da BMW para a mobilidade eléctrica. A WichCar? originalmente atribuiu as declarações a Ferrufino, o que depois rectificou. A BMW veio, entretanto, esclarecer a sua posição.