Um empresário e um comerciante admitiram esta sexta-feira  em tribunal terem recebido 225 mil dólares (191 mil euros) de uma empresa de construção civil moçambicana, acusada de ter sido usada como veículo do dinheiro das “dívidas ocultas”.

O arguido Cremildo Jossias Manjate, 41 anos e proprietário de uma empresa que monta caixilharias de alumínio, disse em tribunal que recebeu, em maio de 2014, um depósito no valor de 125 mil dólares (106 mil euros) da empresa MMConstruções.

A empresa de construção civil pagou o dinheiro por ordens de Ângela Leão, arguida e mulher de Gregório Leão, antigo diretor do Serviço de Informações e Segurança do Estado (SISE), para quem o arguido fez vários trabalhos de montagem de caixilharias.

Questionado pelo Ministério Público sobre a razão de o pagamento ter sido feito para a conta do seu irmão, Cremildo Jossias Manjate, o arguido respondeu que a sua conta no banco indicado por Ângela Leão se encontrava inativa.

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A resposta não convenceu o Ministério Público que confrontou o arguido com extratos bancários que mostram que a conta só deixou de ser usada em 2015, após o pagamento dos 106 mil euros.

Antes da audição do empresário, o tribunal ouviu o arguido Zulficar Aly Ismael Ahmad, 49 anos, comerciante, que admitiu que entraram na sua conta bancária 100 mil dólares (85 mil euros) pagos pela Privinvest, empresa acusada de pagar subornos alimentados pelas chamadas ‘dívidas ocultas’.

Ahmad disse ao tribunal que o dinheiro foi depositado na sua conta a pedido de um amigo brasileiro e também com nacionalidade libanesa que morreu, em 2015.

“Facultei-lhe a conta, passada uma semana ou duas, longe de imaginar que fossem 100 mil dólares, fui levantar o dinheiro e devolvi”, afirmou.

O arguido declarou que pela cedência da conta ao amigo brasileiro recebeu dois mil dólares (1.700 euros).

Zulficar Ahmad disse que uma parte do dinheiro foi levantada e entregue ao amigo brasileiro por dois sócios seus numa sociedade de prestação de serviços.

Confrontado pelo Ministério Público sobre o facto de um dos sócios ter dito ao tribunal que ficou com 15 mil dólares (12 mil euros) de compensação pelos levantamentos bancários que efetuou, Ahmad disse que a pergunta devia ser feita ao sócio.

O arguido negou que a sua conta em dólares tenha sido aberta apenas para receber o depósito da t, uma vez que é o único valor creditado na mesma.

O julgamento do processo principal das ‘dívidas ocultas’ prossegue na próxima semana, com a audição dos dois últimos arguidos, o antigo diretor do SISE Gregório Leão e o antigo diretor da Inteligência Económica da instituição e arguido António Carlos do Rosário.

Após o interrogatório dos dois antigos dirigentes do SISE, segue-se a audição dos declarantes.

A justiça moçambicana acusa os 19 arguidos no processo principal das ‘dívidas ocultas’ de se terem associado em “quadrilha” e delapidado o Estado moçambicano em 2,7 mil milhões de dólares (2,28 mil milhões de euros) – valor apontado pela procuradoria e superior aos 2,2 milhões de dólares até agora conhecidos no caso – angariados junto de bancos internacionais através de garantias prestadas pelo Governo.

As ‘dívidas ocultas’ foram contraídas entre 2013 e 2014 junto das filiais britânicas dos bancos de investimentos Credit Suisse e VTB pelas empresas estatais moçambicanas Proindicus, Ematum e MAM.

Os empréstimos foram secretamente avalizados pelo Governo da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), liderado pelo Presidente da República à época, Armando Guebuza, sem o conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo.