O economista João Borges de Assunção defendeu, em entrevista à Lusa, que as empresas deveriam receber uma indemnização compensatória do Estado devido aos confinamentos, considerando que essa fórmula é mais adequada do que os apoios implementados.

“O confinamento foi o Estado que expropriou as empresas. Não eram as empresas que tinham uma má estratégia. Foi o Estado que criou uma barreira à atividade económica. O que as empresas têm neste momento, ou o que deveriam ter, é uma indemnização compensatória”, disse à Lusa o professor da Universidade Católica, numa entrevista acerca do Orçamento do Estado para 2022.

O economista frisou que algumas empresas “teriam morrido da Covid-19, e mereciam apoio por causa da doença, mas há outras que desapareceram por causa das políticas públicas”.

“É a política pública do confinamento, que é uma decisão pública, legítima, mas é uma decisão pública, é essa política que leva muitas empresas ao tapete”, considerou o académico. Falando à Lusa na Universidade Católica, em Lisboa, João Borges de Assunção disse também que, na sequência da crise, não se está a assistir a um fenómeno de destruição criativa na economia.

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“Para mim, aqui o argumento da eficiência e da destruição criativa não é verdade. O argumento da destruição criativa é que as empresas que aparecem são mais produtivas que as que desaparecem, e é bom que as novas empresas substituam as empresas antigas. Isso é a destruição criativa positiva. Isso é bom, isso é inovação”, começou por explanar.

Porém, atualmente não há “nenhuma destruição criativa”, mas sim uma “expropriação por travagem à normal atividade económica por parte de decisões públicas”, daí defender que “o conceito adequado é o da indemnização compensatória”. “Se depois não for suficiente para elas sobreviverem, então muito bem, iam ao tapete”, vincou.

O professor da Universidade Católica considera que atualmente nas falências “estão as empresas que já não eram viáveis antes e que agora têm uma espécie de bolha de salvação com estes programas de apoio públicos, e as empresas que não eram viáveis e que mereciam ser indemnizadas e que vão receber um apoio insuficiente para aquilo que mereciam”.

“Muitas delas vão estar a pagar dívida o resto da vida para pagar um confinamento que não decidiram, não é? E separar conceptualmente as duas e na prática é muito difícil”, acrescentou, frisando que “as entidades públicas que tiverem esse trabalho, se forem sérias, que é um grande se, vão ter uma grande dificuldade em fazer essa separação de uma maneira inequívoca”.

João Borges de Assunção considerou ainda, relativamente às chamadas empresas “zombie”, que se mantêm em atividade apenas com apoio externo e têm dificuldade em assumir os seus compromissos, que “durante uns anos não há grandes alternativas a uma espécie de perpetuar, porque ninguém quer neste momento falências aceleradas na economia”.

“Isto durará apenas até 2022 e 2023. Portanto, a partir de 2023 eu acho que o próprio sistema financeiro já mais ou menos conseguiu empurrar a resolução contabilística das moratórias até ao final do ano pelas mesmas razões”, sustentou.

O economista disse ainda acreditar que “quanto mais rápidos forem os processos de insolvência, maior é a eficiência da economia”, pelo que para as “empresas que fiquem ‘zombie’ o ideal era que fossem resolvidas rapidamente e que houvesse uma alteração de propriedade”.

João Borges de Assunção prevê que vá haver “uma cicatriz enorme desta crise devido à maneira como a política foi conduzida e, nesse sentido, bem, vai aparecer na forma de uma dívida”.

“A distribuição dessa dívida vai estar em toda a sociedade. Uma parte ficará no Estado, outra foi as empresas. […] Essa dívida vai estar distribuída, mas só daqui a dois ou três anos é que teremos uma ideia precisa do aumento enorme de dívida e da redução das poupanças que esta crise criou”, prevê o economista.

Empresários reclamam igualmente, segundo estudo da EY, alterações fiscais para apoiar resiliência

Ao mesmo tempo, os empresários portugueses inquiridos num estudo da EY “chumbam” o sistema fiscal português e reclamam alterações ao IRS, IRC e IVA no Orçamento do Estado para 2022, para apoiar a resiliência das famílias e das empresas.

Segundo as conclusões da quarta edição do “Survey EY” sobre o OE2022 – a divulgar esta quinta-feira e que, entre 06 e 24 de setembro, inquiriu 72 empresas com operação em Portugal – os empresários nacionais “chumbam” o sistema fiscal português, atribuindo-lhe uma avaliação global de 2,02 numa escala de um a cinco, abaixo dos 2,15 da análise anterior.

Quanto às medidas prioritárias defendidas no OE2022, 92% dos inquiridos apelam a um alívio no IRS “para proteger as empresas e famílias e colocar o país no caminho do crescimento” após a pandemia, enquanto 67% elegeram a redução da carga fiscal pela eliminação de situações em que se observa uma cumulação de impostos, taxas e contribuições (como a incidência de IVA sobre taxas e outros impostos devidos na aquisição de alguns bens e serviços).

No terceiro e quarto lugar da lista de prioridades identificadas pelos empresários surgem alterações ao IVA e ao IRC, consideradas fundamentais por cerca de 60% da amostra.

Relativamente ao IRS, dois terços dos inquiridos gostariam de ver no OE2022 uma redução da progressividade da taxa de imposto, enquanto 63% defendem um aumento do limite global de deduções à coleta das despesas de saúde e das despesas gerais familiares, “para fazer face às despesas acrescidas decorrentes da pandemia”.

Praticamente metade da amostra (49%) pede que sejam atualizadas as tabelas de retenção de IRS, de forma a proteger o rendimento líquido das famílias ao longo de 2022.

Já em matéria de IRC, as medidas apontadas como tendo “maior potencial para estimular o tecido empresarial português” são a redução das taxas de tributação autónoma e da derrama estadual e as relacionadas com a flexibilização de prazos para reporte de créditos e prejuízos fiscais.

Também amplamente defendidas são iniciativas que estimulem o investimento, nomeadamente a majoração de amortizações de investimentos a realizar em 2022 que visem a criação de postos de trabalho e o alargamento do prazo para reinvestimento de mais-valias fiscais que caduquem em 2022.

De forma a “estimular a sua competitividade e contribuir para a dinamização do mercado de trabalho”, cerca de seis em cada 10 empresários (63%) pedem a reintrodução do benefício fiscal associado à criação de emprego jovem e a criação de um crédito fiscal (57%) para atenuar os custos do investimento em processos de digitalização.

No capítulo do IVA, 75% dos empresários defendem que o alargamento da taxa intermédia de IVA a todos os escalões de consumo de eletricidade “é a medida que teria um impacto económico mais positivo”.

Simultaneamente, e “reconhecendo a importância dos setores da hotelaria e restauração para o crescimento económico”, as empresas defendem “a aplicação generalizada das taxas reduzidas de IVA aos respetivos serviços, de forma a compensar as fortes perdas registadas ao longo do último ano e meio”.

No que se refere aos impostos especiais sobre o consumo, 63% dos empresários consideram importante a manutenção das taxas do ISV (Imposto Sobre Veículos) e IUC (Imposto Único de Circulação), “para salvaguardar impactos negativos adicionais sobre o setor automóvel”.

Segundo nota a EY, “ainda que se trate de uma fatia importante da amostra, esta percentagem traduz um forte decréscimo face ao “survey” anterior, em que 88% dos empresários apelaram à não alteração destes impostos”.

No setor imobiliário, o estudo revela que os inquiridos “veriam com bons olhos a eliminação do adicional ao IMI [Imposto Municipal Sobre Imóveis] para as empresas”, sendo esta uma medida considerada importante por 61% dos respondentes.

OE2022: setores automóvel e imobiliário defendem fiscalidade promotora de competitividade

O inquérito da EY evidencia ainda que, “em termos globais, o sentimento dos empresários portugueses em relação ao sistema fiscal piorou este ano”, passando dos 2,15 para 2,02 (numa escala de um a cinco).

Todos os domínios analisados mereceram nota negativa por parte dos empresários, com destaque para o acesso e celeridade do sistema de justiça fiscal (1,46) e o elevado peso da carga fiscal total (1,68), as duas áreas mais mal avaliadas pelas empresas”, aponta.

Por outro lado, os incentivos fiscais à inovação e à I&D (Investigação & Desenvolvimento, 2,71) e a qualidade da interação com a Autoridade Tributária e Aduaneira (2,51) são os domínios que “merecem maior reconhecimento” por parte das empresas, enquanto a avaliação da estabilidade do sistema fiscal (2,10) é a mais elevada desde que o “survey” é realizado.

“Apesar de, em termos estatísticos, Portugal ser a oitava economia da União Europeia com menor carga fiscal (34,8% do PIB [Produto Interno Bruto] em 2020, com base nos resultados divulgados em maio de 2021 pelo Instituto Nacional de Estatística) a mesma tem vindo a crescer gradualmente nos últimos anos, sendo este o valor mais alto de sempre”, refere o ‘country tax leader’ da EY, Luís Marques, citado num comunicado.

O inquérito foi realizado maioritariamente a empresas dos setores da indústria transformadora (21) e retalho e bens de consumo (10), a maior parte das quais com um volume de faturação superior a 25 milhões de euros (44) e mais de 250 trabalhadores (39).

Os entrevistados são, sobretudo, responsáveis pela área fiscal (18), diretores financeiros (11), diretores administrativos ou financeiros (10), presidentes executivos (11) e outros (22).