O serviço de urgência do Centro Hospitalar de Setúbal atingiu um ponto “inaceitável” sobretudo devido à falta de recursos humanos e de condições de trabalho, afirmou o diretor clínico que está demissionário. “É incrível que [os utentes] passem 7 ou 8 horas à espera de ser atendidos e depois são atendidos por tarefeiros…“, comentou Nuno Fachada, em alusão a alguns médicos externos que são colocados no hospital (por empresas) para suprir “buracos” nas escalas e onde não existe tanta “seleção”, o que faz com que “por vezes a qualidade do atendimento seja mais baixa”.

Na audição parlamentar pedida pelo PSD, esta quarta-feira, o diretor clínico explicou que, numa altura de maior acalmia na situação pandémica e com o agudizar “progressivo” dos problemas no hospital, este era o “momento próprio” para avançar para esta demissão, que foi pedida para “chamar à atenção para os problemas, que têm de ser resolvidos”.

Momentos antes, o conselho de administração tinha sido ouvido na mesma sala e o presidente, Manuel Roque Santos, tinha chamado “moção” ao pedido de demissão de Nuno Fachada. O diretor clínico disse que “não admite” que se chame “moção” a um pedido de demissão que foi secundado, depois, por 87 clínicos do serviço, todos em cargos de liderança nos respetivos departamentos.

“O dinheiro aparece sempre, no final, mas aparece tarde”, diz conselho de administração do Centro Hospitalar de Setúbal

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Numa clara resposta ao presidente do conselho de administração, Nuno Fachada diz que “uma pessoa é fácil de ser posta à margem, mas é diferente quando é a totalidade dos médicos, que não [pedem a demissão] de ânimo leve”. Estamos num “plano inclinado de descida e já estamos abaixo da linha de água“, atirou o clínico.

Eu tinha duas opções. Ou omitia o que se passava, não ficando bem com a minha consciência nem o meu juramento deontológico, ou me solidarizava com os profissionais e tentava defender o meu centro hospitalar”, afirmou.

Para já, já foram abertas vagas para a contratação de pessoal, o que leva Nuno Fachada a acreditar que “este movimento já gerou alguns desbloqueios“, mas que estão longe de ser suficientes.

Criticando a gestão do hospital, Nuno Fachada deu como exemplo que “não é entendível como é que num ano pagamos em exames de ressonância magnética um valor muitíssimo superior ao que custaria comprar um aparelho desses”. Além do desperdício orçamental, isso prejudica a capacidade do hospital de atrair jovens qualificados.

Um dos clínicos mais jovens do serviço de obstetrícia, recordou, apresentou recentemente a demissão. “Vai para a privada” ganhar mais com menos responsabilidade, explicou Nuno Fachada. “Temos esperança de que este caminho se inverta”, afirmou.