O ativista de extrema-direita Mário Machado revelou esta segunda-feira que se refugiou, juntamente com outras pessoas, no armazém de um restaurante no Prior Velho, ao aperceber-se que elementos do grupo motard Hells Angels iam invadir o estabelecimento comercial.

Mário Machado falava na qualidade de assistente (colaborador da acusação) no julgamento do processo Hells Angels, que tem 89 arguidos pertencentes a este grupo motard, e que estão acusados por crimes de associação criminosa, tentativa de homicídio qualificado agravado pelo uso de arma, ofensa à integridade física, extorsão, roubo, tráfico de droga e posse de armas e munições.

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Em causa está o incidente de 24 de março de 2018, em que membros dos Hells Angels, sabendo da presença de membros do grupo “Alcatraz” (grupo satélite do “Los Bandidos”) no interior do restaurante Mesa do Prior, decidiram invadir o estabelecimento com intuito violento.

Em tribunal, Mário Machado referiu que tinha sido divulgado na internet um evento para as 20h00 desse dia para reunir elementos do grupo satélite dos “Los Bandidos”, mas vários simpatizantes, alguns vindos de longe, estavam já no restaurante, ao final da manhã desse dia, para aí almoçarem.

Foi nessa altura, disse, que vislumbrou através das janelas do restaurante “alguma agitação” e “movimentação” no exterior, tendo tido a perceção imediata que seria uma ação dos elementos dos Hells Angels.

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Prontamente, Mário Machado e outras pessoas, incluindo o dono do restaurante (Paulo Rodrigues) e dois “rapazes” amigos refugiaram-se no armazém, situado nas traseiras do estabelecimento.

Uma vez na arrecadação, Mário Machado relatou que um dos rapazes ficou a segurar a maçaneta da porta para tentar impedir que alguém entrasse, enquanto ele tentava encontrar, entre talheres e outros objetos, “ferramentas para se defender”.

Notou que descobriu duas facas pontiagudas para se defender, dizendo ter a perceção que era ele o principal alvo dos agressores, nomeadamente por estar a organizar um grupo motard rival dos Hells Angels.

Em resposta à juíza presidente Sara Pina Cabral, Mário Machado disse que não se apercebeu que alguém tivesse tentado abrir a porta” do armazém e recordou que, do interior da arrecadação, “só ouviu coisas a partir” no espaço reservado à restauração.

Disse ter saído do armazém quando se apercebeu pelo barulho que a polícia tinha chegado ao restaurante e lembrou que, quando abriu a porta da arrecadação, já não estava lá ninguém dos Hells Angels, reparando apenas que havia sangue, vidros no chão e cadeiras tombadas.

Mário Machado revelou ter sido um dos rapazes que esteve consigo no armazém que chamou a polícia e que todos os presentes foram identificados pela polícia. Em resposta ao coletivo de juízes, o depoente disse que, ao visualizar a movimentação de pessoas no exterior do restaurante, antes do ataque, não conseguiu reparar se alguma delas era portadora de armas.

Durante a sessão, a procuradora questionou Mário Machado sobre fotogramas exibidos em julgamento e que continham imagens captadas por câmaras no exterior do restaurante, situação que gerou protestos e requerimentos dos advogados de defesa, que alegaram tratar-se de uma forma subtil de o Ministério Público (MP) permitir o reconhecimento visual dos alegados agressores, numa prática que classificaram de irregular, inválida e suscetível de causar a nulidade da prova.

José Manuel Castro, advogado de Mário Machado, contrapôs que “não vislumbra os vícios” processuais penais invocados pela defesa dos arguidos e, na mesma linha, o coletivo de juízes indeferiu o requerimento que contestava o procedimento do Ministério Público.

Segundo a acusação deste processo, os membros do Hells Angels elaboraram um plano para aniquilar o grupo “Los Bandidos”, em março de 2018, com recurso à força física e a várias armas para lhes causar graves ferimentos, “se necessário até a morte”.

A maioria dos arguidos anunciou na primeira sessão de julgamento, em 28 de setembro último, não pretender prestar declarações em audiência.

Devido ao elevado número de arguidos e advogados, o julgamento do processo Hells Angels decorre no Espaço Multiusos, em Camarate, Loures, com medidas de segurança a cargo da Unidade Especial da PSP.

No despacho que levou os arguidos a julgamento, o juiz de instrução Carlos Alexandre considerou que, face aos indícios analisados, “este conjunto de elementos assim agrupados não é um simples clube recreativo ‘motard’, mas um conjunto de pessoas que se organizam (…) em moldes paramilitares ou semelhantes ao modo de atuação de uma milícia”.