Em Portugal, durante a crise pandémica, o número de desempregados com deficiência inscritos no Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) aumentou 10%, registando-se uma forte descida nas contratações. Os números do IEFP e do Instituto Nacional para a Reabilitação (INR) indicam que apenas 17% das pessoas com deficiência têm rendimentos do trabalho. A maioria vive dependente de prestações sociais (65,7%).

É urgente pensar numa empregabilidade inclusiva, que seja vista com naturalidade a curto prazo. Porque na realidade presente, perante os riscos de inadaptação ao posto de trabalho e de despedimento, muitas pessoas acabam por ficar reféns das insuficientes ajudas do Estado.

Há mais de dois anos, a Lei nº4/2019 estabeleceu um regime obrigatório de quotas de contratação de pessoas com deficiência, aplicável a médias e grandes empresas, que está ainda longe de ser cumprido. Mas há inúmeros exemplos de progresso, até porque as quotas têm de ser alcançadas no prazo de quatro a cinco anos, consoante a dimensão. Existem subsídios para financiar as adaptações necessárias do posto de trabalho para a pessoa com deficiência, seja em termos de mobilidade e acessos ou de dispositivos especiais. O IEFP disponibiliza diversos instrumentos de apoio à inserção profissional de Pessoas com Deficiência, desde a seleção e recrutamento à adaptação do posto de trabalho, passando pela redução ou isenção de taxas.

Foi também criada a “Marca Entidade Empregadora Inclusiva” (MEEI) para distinguir e valorizar as empresas e entidades que mais se destacam na criação de emprego inclusivo. Várias empresas possuem programas específicos para a contratação de Pessoas com Deficiência, mas é preciso ter em conta o desenvolvimento futuro da carreira daqueles colaboradores, muito além da mera anulação de barreiras arquitetónicas.

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Como organizar processos de recrutamento inclusivos?

Ao longo de um processo de inclusão, as empresas devem começar por divulgar a visão, a missão e os valores que defendem, evidenciando as vantagens e formando as equipas antecipadamente, de modo a tornar a inclusão bem-sucedida e com efeitos duradouros. Um documento publicado pelo GRACE – Empresas Responsáveis, uma associação empresarial vocacionada para atuar nas áreas da Responsabilidade Social e Sustentabilidade, propõe um plano de ação para recrutar e integrar pessoas com deficiência.

Uma vez assumido o compromisso estratégico com a inclusão, é necessário desenvolver e preparar as equipas para a ação que se vai implementar. Depois de concluído o processo de recrutamento e seleção, entra-se na fase crucial de acolhimento e integração, que deve envolver mecanismos de follow-up para facilitar o estabelecimento de relações duráveis.

Desde a comunicação dos objetivos da ação de recrutamento inclusivo até à integração plena dos colaboradores, o processo desenvolve-se em cinco etapas. Reunir informação sobre os apoios públicos destinados à empregabilidade inclusiva é tão importante como manter uma rede de contactos com entidades e associações do terceiro setor, que detêm um conhecimento profundo das realidades locais.

Qual é a diferença entre diversidade e inclusão?

De facto, uma das tendências dominantes no meio empresarial é a constituição de equipas de trabalho tão diversas quanto inclusivas, refletindo a composição da sociedade em que se inserem. Embora remetam para conceitos distintos, diversidade e inclusão são complementares em contexto organizacional.

A diversidade diz respeito à pluralidade de identidades, de culturas e formas de pensar, percursos de vida e experiências que podemos encontrar num grupo de pessoas. Ao formar equipas diversas, com pessoas de diferentes origens, percursos e competências, criam-se as condições ideais para a criatividade e inovação.

A inclusão está relacionada com a satisfação de necessidades individuais, proporcionando ambientes livres de discriminação e preconceito, onde crescem sentimentos de pertença. Uma atitude inclusiva envolve um conjunto de ações que devem proporcionar a todos a igualdade de oportunidades, direitos e participação.

As aspirações das novas gerações estão a transformar as estratégias de recursos humanos e a levar muitas organizações a redefinir o seu propósito. Atualmente, a maior parte dos candidatos ao primeiro emprego prefere trabalhar em empresas que apoiam a diversidade e defendem os mesmos valores com os quais se identificam.

Casos de sucesso

Um dos primeiros passos, no Santander, foi o contacto com o ICF – Inclusive Community Forum, um centro de estudos e laboratório de ideias criado na NovaSBE com o objetivo promover uma comunidade mais inclusiva para pessoas com deficiência. No âmbito desta parceria, ajudaram a construir um processo de recrutamento inclusivo que foi assumido por 28 empresas que fazem parte do ICF. O Banco facilitou a integração de oito pessoas com deficiência, avaliando em seguida o impacto da experiência nas equipas e capitalizando os efeitos benéficos para todas as partes.

«Precisamos de normalizar a inclusão na sociedade»

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A Associação VilacomVida nasceu em dezembro de 2016, com o propósito de promover a inclusão laboral e social de pessoas com Dificuldades Intelectuais de Desenvolvimento (DID). Conversámos com a presidente e entusiasta da inclusão, Filipa Pinto Coelho:

O que são os Cafés Joyeux? 

“Trata-se de um projeto de restauração inclusiva de qualidade, que contribui para fomentar a inclusão, promovendo a autonomia dos jovens com perturbação ligeira do desenvolvimento intelectual. Queremos mostrar que estes jovens têm capacidade de enriquecer a comunidade e criar valor no emprego, nas relações entre as pessoas e assim ajudar a transformar mentalidades. E, ao mesmo tempo, contribuir para desmistificar preconceitos e trazer mais diversidade à sociedade. A ideia é juntar trabalhadores com limitações cognitivas e trabalhadores sem limitações, para prestar um serviço de qualidade que beneficie toda a gente”.

 

Como surgiu o projeto?

“Entre outubro de 2018 e março de 2020, testámos este modelo de intervenção para a vida autónoma com um café-escola, o Café ComVida, em Lisboa, que foi um sucesso e nos mostrou que uma iniciativa destas pode ser sustentável financeiramente. Entretanto, conhecemos o modelo dos Cafés Joyeux, em França, e achámos que poderíamos internacionalizar a marca em Portugal. O primeiro Café Joyeux português vai abrir em novembro, em Lisboa, junto à Assembleia de República, e contamos abrir um segundo, em Cascais, no início do próximo ano.”

 

De que forma é que estes cafés fazem a diferença?

“O Café ComVida proporcionou 4400 horas de treino em autonomia para jovens com deficiência cognitiva ligeira; empregou quatro jovens na equipa e acompanhou mais 26 em eventos de catering. Servimos seis mil clientes num ano e meio, com um feedback excelente! Muitas vezes estes jovens transitam da escola para centros ocupacionais, sem nunca terem oportunidade de serem autónomos, trabalharem e serem remunerados.  Este projeto permite-lhes mostrar o que valem, por trás do rótulo muitas vezes injusto da incapacidade. Para quem passa na rua trata-se de um estabelecimento normal, e é assim que queremos que seja, para permitir que as pessoas sejam surpreendidas pela qualidade do serviço. Precisamos de normalizar a inclusão e trazer mais diversidade à sociedade e às nossas vidas!”

Também estão em curso vários projetos que visam reforçar a capacidade das escolas na preparação dos jovens para a vida ativa, atribuindo-lhes o selo de “Escola Inclusiva”. Essa distinção implica a realização de ações de formação em competências sociais e empregabilidade, uma plataforma de mediação para ligar as escolas e as empresas, manuais e apresentações para docentes, assim como a promoção da oferta de estágios curriculares para alunos com deficiência.

As aspirações das novas gerações estão a transformar as estratégias de recursos humanos e a levar muitas organizações a redefinir o seu propósito. Atualmente, a maior parte dos candidatos ao primeiro emprego prefere trabalhar em empresas que apoiam a diversidade e defendem os mesmos valores com os quais se identificam. As questões da equidade devem ser respeitadas, tal como a orientação sexual e identidade de género que, no caso do Santander, motivou a criação de uma comunidade interna para acompanhar e integrar pessoas LGBTQI+. Para chegar a este nível é necessário envolver diretamente os líderes e managers, que devem atuar como facilitadores voluntários em apresentações e workshops, ajudando a formar novos colaboradores em Diversidade e Inclusão. Os “apóstolos da causa”, como são internamente conhecidos, são os mentores que espalham a mensagem, ajudando-a a crescer no Banco e na sociedade, em geral.

Café servido com o coração

A relação do Santander com este tema traduz-se em várias histórias de sucesso como a da Associação VilacomVida. Premiada pelo Banco, esta Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) tem como missão fazer a ponte entre famílias, escolas e empregadores, fomentando a empregabilidade das pessoas com Perturbações Ligeiras do Desenvolvimento Intelectual (PLDI), nomeadamente Trissomia 21 ou que sofram de quaisquer Perturbações do espectro do Autismo, entre outras.  Atualmente está a implementar em Portugal a rede de Cafés Joyeux (ver entrevista), uma iniciativa pioneira no apoio à empregabilidade de pessoas com limitações cognitivas. A ideia nasceu em 2017, em França, onde já existem cinco estabelecimentos que integram 51 colaboradores com algum tipo de incapacidade. Apoiar a realização e autonomia, demonstrando que a inclusão é compatível com a rentabilidade económica, é o principal objetivo desta iniciativa cujo projeto-piloto “CafécomVida” permitiu beneficiar mais de 30 jovens.

O alinhamento com os princípios do recrutamento inclusivo e da promoção da diversidade reflete-se na cultura empresarial do Santander que, em Portugal, vê 86% dos trabalhadores declararem que sentem orgulho em trabalhar no banco. As empresas que agregam maior diversidade conseguem combater a discriminação e o preconceito na sociedade a partir das suas práticas laborais. Trabalhar em ambientes inclusivos ajuda a desenvolver a empatia e a capacidade de gerir emoções, as próprias e as dos outros, facilitando as relações de cooperação que conduzem ao aumento da produtividade e do bem-estar.

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