A agência de notação financeira Fitch Ratings decidiu manter inalterada a notação de risco da dívida portuguesa – tal como a perspetiva associada – apesar do “aumento da incerteza política” associado ao chumbo do Orçamento do Estado e a marcação de eleições antecipadas para janeiro. Essa é uma incerteza que, porém, não deverá colocar em causa o cumprimento das metas orçamentais no futuro próximo, acredita a agência de rating.

A informação foi confirmada ao final desta noite de sexta-feira, em relatório divulgado pela agência. A notação permaneceu em BBB, dois níveis acima da fasquia que separa os “investimentos de qualidade” e a “dívida de alto risco” (vulgo, lixo). Manteve-se, também, a perspetiva “estável” que já existia.

“Com as medidas de apoio relacionadas com a pandemia a serem gradualmente retiradas, o fracasso na aprovação do orçamento não deverá criar riscos significativos para as metas orçamentais de curto prazo, na opinião da Fitch”, pode ler-se no relatório. A agência acrescenta, porém, que “as eleições suscitam alguma incerteza acerca da política orçamental para além de 2022“.

As sondagens recentes indicam que o Partido Socialista poderá ganhar as eleições com uma votação de 39% (…), mas isso não seria suficiente para uma maioria absoluta ao abrigo das regras eleitorais portuguesas”, diz a Fitch.

Olhando para as contas públicas do Estado português, a agência de rating assinala que “o impacto do choque pandémico foi menos grave do que a Fitch antecipou, numa primeira fase” e o crescimento económico “mais forte do que o previsto” tem beneficiado a receita fiscal – por outro lado, os planos de estímulo público lançados pelo Governo têm sido “contidos“.

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O impacto nas contas públicas tem sido atenuado pelo facto de parte dos apoios ter sido dado na forma de garantias públicas em crédito (em detrimento de transferências ou subsidiação direta). Num cenário de utilização total, essas garantias envolveriam 3,7% do PIB, diz a Fitch, notando que para já este mecanismo “ajudou a limitar o impacto das ajudas no défice orçamental no curto prazo, porém criam-se possíveis riscos contingentes para as contas públicas” no futuro, salienta a agência de notação financeira.

A Fitch prevê um défice público de 4,4% em 2021, o que compara bem com os outros emitentes que partilham este rating BBB. Porém, há risco de que o défice possa ser maior do que o previsto, afirma a agência.

Os conflitos políticos em torno dos salários da Função Pública e pensões (…) e a pressão para que haja mais apoios para compensar o aumento dos preços da energia criam alguns riscos negativos nas nossas projeções orçamentais”, atira a Fitch.

Outros riscos, na análise da Fitch, estão ligados à TAP e ao Novo Banco. Quanto à banca, no geral, a agência afirma que existe uma situação de “estabilidade apesar do choque pandémico. “As métricas de capital do setor melhoraram em 2021, mas as almofadas de capital continuam a estar entre o moderado e o baixo, em alguns bancos, o que os deixa vulneráveis a choques que afetem a qualidade dos ativos”, conclui a Fitch, salientando que existem “desafios estruturais” na banca e os empréstimos que estiveram sob moratória ainda estão rodeados de alguma “incerteza”.

Ao Observador, outra agência reconhecida pelo BCE, a DBRS Morningstar, comentou na semana passada que as eleições marcadas para o próximo dia 30 de janeiro devem resultar num parlamento “fragmentado”, “sem um vencedor claro“. A DBRS acrescentou que a sua expectativa é que o próximo Governo irá manter o controlo do défice mas avisou que qualquer atraso na chegada dos fundos do PRR pode ser “disruptiva“.

“Rating”. Agência DBRS prevê eleições “sem vencedor claro” mas acredita que próximo Governo irá manter controlo do défice

A preocupação especial com o impacto das eleições antecipadas na execução do PRR foi, também, partilhada pela agência Moody’s, que indicou que “esta incerteza é negativa para o crédito português já que um impasse político poderá impedir o Governo de conseguir executar as metas necessárias para que os fundos do NextGenerationEU possam ser libertados”.

O ministro das Finanças repetiu várias vezes nos últimos dias que, embora exista alguma incerteza sobre quais medidas é que podem avançar no início de 2022 (num contexto de execução orçamental por duodécimos), a primeira prioridade do Governo é que à entrada em 2022 “o País consiga em particular no que tem a ver com o PRR aplicar o mais rapidamente possível”.