A “credibilidade” das forças portuguesas integradas na missão das Nações Unidas na República Centro-Africana (RCA) é a “mais elevada”, afirmou esta sexta-feira o diretor da Divisão de Polícia das Nações Unidas, Luís Carrilho, em declarações à Lusa.

“Sendo português, sou tendencioso. Visitei a RCA antes da pandemia da Covid-19 e ouvi as mais elevadas apreciações sobre o trabalho dos militares portugueses, assim como dos elementos da polícia portuguesa ali deslocados. Mas a credibilidade é um processo e as alegações devem ser convenientemente investigadas”, afirmou o Conselheiro de Polícia do secretário-geral da ONU, referindo-se à notícia do envolvimento de tropas portugueses pertencentes à missão da ONU no país (MINUSCA) no tráfico de diamantes, ouro e estupefacientes.

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“Embora todos gostássemos que não tivesse acontecido”, acrescentou Luís Carrilho, em declarações em português, “o importante agora é que as alegações que pendem sobre alguns indivíduos do contingente sejam devidamente investigadas e que as consequências sejam devidamente tiradas”.

A Lusa pediu ainda ao chefe da Polícia da ONU uma avaliação do estado atual das relações entre as Nações Unidas e as autoridades centro-africanas, alvo de vários incidentes recentes de tensão, como a notícia do envolvimento de soldados do Gabão integrados na MINUSCA em casos de abusos sexuais e violações, o ferimento de dez soldados egípcios da missão por tiros disparados por tropas presidenciais em Bangui, no passado dia 1, e agora a notícia da Operação Miríade em Portugal.

“Relativamente ao relacionamento com as autoridades centro-africanas, a nossa responsabilidade continua. [Continuamos a] trabalhar conjuntamente com as autoridades centro-africanas, no caso da polícia [da ONU] com a polícia centro-africana e com a gendarmeria nacional, [assim como] com a população e posso dizer que o nosso objetivo é continuar a fazer o melhor para a segurança e para uma vida sã e em paz da RCA”, afirmou Luís Carrilho.

O oficial português sublinhou ainda que o Conselho de Segurança (CS) das Nações Unidas “aprovou hoje [sexta-feira] a extensão do mandato por mais ano, a partir de 15 de novembro, da missão de paz da ONU na República Centro-Africana”.

A renovação da Missão Multidimensional Integrada das Nações Unidas para a Estabilização da República Centro-Africana (MINUSCA) foi aprovada com 13 votos a favor e a abstenção da Rússia e da China.

A MINUSCA, uma das maiores e mais caras missões da Organização das Nações Unidas (ONU), continuará as suas operações com até 14.400 soldados e 2.420 polícias, segundo a resolução, que confirma o reforço das tropas decidido há quase um ano.

A resolução teve como contexto um relatório do secretário-geral da ONU, apresentado por António Guterres ao CS em meados de outubro, quando propôs ao organismo máximo de decisão da ONU a extensão do mandato da MINUSCA.

Nesse texto, Guterres manifestou várias preocupações com o “inaceitável nível de incidentes, envolvendo forças internas de defesa e segurança, destacadas bilateralmente e outro pessoal de segurança, contra a MINUSCA, bem como as persistentes campanhas de desinformação”, de acordo com o relatório a que a Lusa teve acesso.

Estas ações, apontou Guterres, “obstruem a realização do mandato, ameaçam a vida dos ‘capacetes azuis’ e contraditam os compromissos do presidente (Faustin) Touadéra e do seu governo”.

No caso concreto das ações de desinformação nas redes sociais contra a ONU e a MINUSCA e membros da comunidade internacional, da sociedade civil e da oposição, Guterres disse que eram “coordenadas”.

De acordo com dados disponibilizados na página oficial do Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA), estão empenhados na RCA 188 militares portugueses no âmbito da MINUSCA. Também na RCA, mas no âmbito da missão da União Europeia (EUTM-RCA) de formação e aconselhamento das forças de segurança e defesa, estão empenhados outros 20 militares.

Em 30 de setembro, a 10.ª Força Nacional Destacada (FND) para a RCA, composta por 180 militares, recebeu o Estandarte Nacional, prevendo-se que esteja operacional a partir de 15 de novembro.

O comandante desta FND, tenente-coronel Jorge Pereira, vai chefiar um grupo composto por 169 homens e 11 mulheres, sendo que, a maior parte — 91 —, são militares do Regimento de Comandos, incluindo-se também três da Força Aérea.

A RCA caiu no caos e na violência em 2013, depois do derrube do ex-Presidente François Bozizé por grupos armados juntos na Séléka, o que suscitou a oposição de outras milícias, agrupadas sob a designação anti-Balaka.