O perito forense Duarte Nuno Vieira afirmou esta segunda-feira no tribunal de Bragança que a autópsia contradiz os factos relatados pela acusação no caso da morte do cabo-verdiano Luís Giovani.

O professor catedrático e consultor na área, que já foi presidente do Instituto de Medicina Legal, testemunhou esta segunda-feira, a pedido da defesa de um dos arguidos, no julgamento em que sete homens são acusados do homicídio do jovem em dezembro de 2019.

O especialista analisou os documentos do processo relativos à morte e elaborou um parecer que sustentou em audiência, afiançando que “o que está relatado no despacho da acusação não coincide com aquilo que a autopsia transmite”.

Perante os dados que estão disponíveis, nós temos contradições grandes entre a versão dos factos e aquilo que a autopsia nos conta. A autopsia evidencia enormes contradições entre o relato que fez parte do despacho de acusação e aquilo que as testemunhas terão contado e aquilo que depois o cadáver veio contar-nos”, afirmou aos jornalistas no final da sessão.

Para Duarte Nuno Vieira, há neste processo “contradições muito significativas” que não permitem ter a certeza do que terá acontecido, concretamente do que resultou a lesão mortal na cabeça, se de uma agressão ou outro tipo de pancada, nomeadamente numa queda.

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O perito encara com “muita dificuldade” que, se “aquela lesão tivesse resultado de um primeiro traumatismo intenso, aquele cidadão tivesse ainda a possibilidade de fazer todo o percurso que fez com a gravidade das lesões que tinha”.

“Não é uma impossibilidade, mas vejo isso com dificuldade e, portanto, em termos de probabilidade, eu avançaria mais para a segunda [a queda], mas não posso excluir também a outra hipótese, a pancada“, considerou.

O que o especialista exclui é a versão do Ministério Público que diz que o jovem foi brutalmente agredido em grupo pelos arguidos, afirmando que : “não há nada que diga que aquele jovem foi brutalmente agredido”.

“Nada, nada, em termos daquelas agressões múltiplas de pé, no chão, a pontapés, com soqueiras com paus, com vários instrumentos, não”, salientou.

Em declarações no final da sessão, Duarte Nuno Vieira insistiu que “a autópsia permite afirmar taxativamente que isso não aconteceu”.

“Que há uma pancada única, há. Agora, foi uma pancada única, se foi de agressão, se foi acidental, isso já estaria a caminhar no sentido da adivinhação”, acrescentou.

A testemunha indicou ainda que o jovem não apresentava nenhum outro ferimento, inclusive “não tem também lesões de defesa”.

A dúvida sobre a causa da lesão permanece desde a autopsia inicial que foi inconclusiva, indicando que a lesão tanto pode ter resultado de intenção homicida ou acidental.

O Ministério Público acusou oito homens pelo homicídio de Luís Giovani, um dos quais foi retirado do processo na fase de instrução que manteve a acusação a sete dos arguidos relativamente ao crime de homicídio qualificado na pessoa de Luís Giovani e reduziu para ofensa à integridade física a acusação relativamente a três amigos do jovem.

Os factos remontam à madrugada de 21 de dezembro de 2019, quando o grupo de quatro cabo-verdianos se terá envolvido numa altercação com um grupo de Bragança.

A desavença começou num bar e continuou na rua e Luís Giovani foi encontrado sozinho inconsciente e caído no chão a centenas de metros do local dos factos.

A versão inicial veiculada por amigos dos cabo-verdianos dava conta de um agrupo de “15 a 20” pessoas fez uma espera aos jovens e os agrediu com cintos, soqueira, paus.

As autoridades que tomaram conta do caso afastaram tratar-se de um caso de racismo e o Ministério Público escreveu na acusação que foi o grupo de cabo-verdianos quem foi tirar contas com os portugueses.

Até ao momento, ainda não foi esclarecida a pergunta repetida várias vezes pelo presidente do coletivo de juízes de como é que os amigos perderam, naquela madrugada, Luís Giovani, que foi encontrado sozinho caído na rua.

O julgamento dos sete acusados de homicídio começou em fevereiro de 2020 e tem novas datas marcadas para 17 de dezembro.