Francisco Rodrigues dos Santos não desistiu da ideia de contar com Manuel Monteiro como candidato a deputado nas próximas eleições legislativas. Os dois conversaram sobre a solução, o antigo líder do CDS já manifestou as suas reservas e anseios, e Rodrigues dos Santos ficou de encontrar uma solução para enquadrar Monteiro como possível trunfo eleitoral. Mas não a qualquer preço.

O Observador sabe que Manuel Monteiro terá transmitido a Francisco Rodrigues dos Santos alguma resistência em abraçar o desafio se o atual presidente do CDS não desse um sinal inequívoco de esforço de união do partido e de reintegração do portismo. À cabeça, Monteiro fez saber que queria que figuras como Nuno Melo e Cecília Meireles fossem repescadas e fizessem parte da solução.

De resto, o antigo líder do CDS tornou público esse apelo quando, em declarações à edição semanal do Expresso, pediu um “esforço” nesse sentido. “Se sentir que há um esforço de envolvimento de todas as pessoas, incluindo ex-presidentes, ex-ministros, ex-dirigentes e críticos, para contribuir para a afirmação política do CDS, eu estaria disponível”, reconheceu o democrata-cristão que antecedeu a Paulo Portas na liderança do CDS.

Entretanto, os dois já falaram sobre a questão e Monteiro, que regressou ao partido precisamente pela mão de Francisco Rodrigues dos Santos, terá manifestado vontade de regressar ao Parlamento ao lado de Nuno Melo e de quadros como Cecília Meireles, uma solução rejeitada em teoria pelo atual presidente do CDS.

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Esta segunda-feira, em entrevista à RTP, Francisco Rodrigues dos Santos disse mesmo que Manuel Monteiro seria um “ás de trunfo” do CDS nestas eleições legislativas. “Tenho muita simpatia pessoal por Manuel Monteiro. É uma pessoa idónea, credível e séria, que partilha comigo esta visão do CDS enquanto partido popular. É natural que haja vontade em contar com Manuel Monteiro, que seria um ás de trunfo.”

No entanto, na conversa a dois, Manuel Monteiro terá até mencionado a importância de ver Paulo Portas na campanha do partido, o que, dado o histórico de rivalidade entre os dois, seria improvável de acontecer — e isto para dizer o mínimo.

Monteirice faz soar alertas no Caldas

O ruído criado em torno deste cenário já está a criar alguma resistência na direção do CDS. Entre os mais próximos de Rodrigues dos Santos, as declarações de Manuel Monteiro ao Expresso não caíram bem e há quem veja nas exigências que está a fazer a Francisco Rodrigues dos Santos o princípio de uma jogada maior para se posicionar no futuro.

A leitura faz-se assim: Manuel Monteiro não ignorará que a relação entre o bloco de Francisco Rodrigues dos Santos e o que resta do portismo está para lá de poder ser salva; qualquer conversa de união entre fações será irrazoável nesta altura do campeonato; logo, fazer depender um regresso ao Parlamento de um armistício entre as partes é saber que esse regresso está condenado à partida. No final do dia, Manuel Monteiro poderá sempre alegar que quis ajudar e que a atual direção não fez a sua parte.

No caso de querer vir a disputar a liderança do CDS no futuro — hipótese que Monteiro tem vindo a rejeitar em cada entrevista — uma estratégia desta natureza permitiria capitalizar politicamente um eventual mau resultado de Rodrigues dos Santos nas legislativas e fazer do antigo presidente democrata-cristão um homem de possíveis consensos entre blocos há muito desavindos no interior do CDS.

Seja como for, e apesar da desconfiança crescente, a direção do CDS ainda não desistiu de contar com Manuel Monteiro apenas e só se aposta tiver uma relação custo-benefício razoável. Não vale tudo e os mais próximos do líder do CDS têm profunda convicção que Rodrigues dos Santos jamais se porá assim nas mãos de Manuel Monteiro.

Para lá de quem pode ou não acompanhar o antigo presidente na lista de deputados, há ainda a questão do círculo eleitoral: a menos de 72 horas horas de fechar em definitivo a lista de candidatos a deputados, a única coisa certa é que Francisco Rodrigues dos Santos será cabeça de lista do partido em Lisboa. Tudo o resto está em aberto. Na eventualidade de os astros se alinharem ao ponto de Manuel Monteiro ser candidato, os distritos do Porto e, sobretudo, de Braga poderiam ser hipóteses para encaixar o ex-líder do CDS.

Para um partido que conseguiu eleger apenas cinco deputados nas legislativas de 2019 e que segundo todas as sondagens realizadas até ao momento deve ficar abaixo dessa meta nas próximas eleições, todos os lugares contam e é importante não violar as próprias lógicas internas só para acomodar uma eventual candidatura de Monteiro.

Até porque Francisco Rodrigues dos Santos tem intenção de integrar nas listas gente da sua direção — como Filipa Correia Pinto, Pedro Melo, Cecília Anacoreta Correia ou Martim Borges de Freitas — e também de respeitar a vontade de algumas estruturas que se mostraram leais à sua liderança. Tudo somado, a margem de manobra para experimentalismos é reduzida.

“Este PSD decidiu estar mais próximo de António Costa do que de Sá Carneiro”

Aconteça o que acontecer, Francisco Rodrigues dos Santos tem até quarta-feira, data em que se realiza mais um Conselho Nacional do partido, para fechar e aprovar as listas de candidatos a deputados. E o tempo corre contra o líder democrata-cristão: depois de ter alimentado a expectativa de ir coligado com Rui Rio nestas legislativas, o presidente do CDS acabou por ser surpreendido pelo recuo do social-democrata e tem agora de se adaptar às novas circunstâncias

De resto, o volte-face acabou por dominar grande parte da intervenção de Rodrigues dos Santos no último Conselho Nacional do CDS, que aconteceu este domingo. À porta fechada, o líder democrata-cristão acusou Rui Rio de ter dado uma “pirueta” no caminho que o PSD tinha seguido até então (coligação nos Açores ou dezenas de alianças nas autárquicas) para ensaiar uma candidatura a solo nestas legislativas.

“Este PSD decidiu estar mais próximo de António Costa do que de Sá Carneiro”, chegou a criticar Francisco Rodrigues dos Santos, já depois de ter argumentado que votar no CDS é a única forma de garantir que não há bloco central entre PS e PSD.

Na já referida entrevista à RTP, 24 horas depois do Conselho Nacional de domingo, Francisco Rodrigues dos Santos voltou a denunciar a “pirueta” de Rui Rio e sugeriu que só o voto no CDS pode evitar o reforço de um PSD que quer ser “cada vez mais socialista”. “O PSD escolheu o caminho mais difícil para construir essa alternativa ao PS.”

Nessa intervenção junto dos conselheiros do partido, Rodrigues dos Santos garantiu ainda que os críticos internos e os “amiguinhos” que circulam nas redações e nos espaços de opinião vão ter mais uma “desagradável surpresa” a 30 de janeiro porque, argumentou o líder do CDS, o partido “vai ter um bom resultado” nas legislativas.

*Artigo atualizado às 20h54 com declarações de Francisco Rodrigues dos Santos à RTP