Um dia depois de os talibãs retomarem a emissão de passaportes em Cabul, centenas de afegãos enfrentam temperaturas negativas enquanto aguardam a sua vez em longas filas de espera para ter autorização para sair do país. Há quem esteja desesperado, porque precisa de tratamento médico ou porque teme os islamitas, descreve o The Guardian.

Talibãs retomam emissão de passaportes em Cabul

Mohammed Osman Akbari é um dos rostos desse desespero, pois quer chegar ao Paquistão “urgentemente” para concluir a sua cirurgia cardíaca. O homem de 60 anos contou à Agence France-Presse que os médicos colocaram-lhe molas [stent] no coração. “Elas têm de ser removidas e isso não é possível aqui”, elucida.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Perto dali, há ambulâncias com pessoas demasiado doentes para conseguirem estar na fila. “Tem um problema cardíaco”, esclarece o condutor da ambulância, Muslim Fakhri, referindo-se ao homem de 43 anos que estava deitado numa maca lá dentro. Explica que quem quer o passaporte tem de estar presente para garantir que o documento é mesmo emitido.

As autoridades talibãs controlam a fila de espera. “Não queremos que nenhum ataque suicida ou explosão aconteça”, afirma o talibã Ajmal Toofan. “A nossa responsabilidade é proteger as pessoas”, prossegue, reforçando que os afegãos “não estão a cooperar”. Enquanto Ajmal falava em proteção, o The Guardian refere que outro talibã empurrou um homem, que acabou por cair com a cabeça perto do arame farpado.

Passaporte afegão

“A situação aqui não é pacifica”, menciona Mursal Rasooli, enquanto abraça a filha Bibi Hawa, de 2 anos, para protegê-la do frio. “Se a situação piorar, temos o passaporte e podemos fugir”, acrescenta. O marido está no Irão, porque no Afeganistão não conseguia encontrar trabalho.

Este domingo, a Organização para a Cooperação Islâmica (OIC) assegurou que ia trabalhar para retomar o fluxo de ajuda financeira e humanitária no Afeganistão. Martin Griffiths, secretário-geral de assuntos humanitários da ONU, fez questão de destacar as “consequências da inação claras” que farão o “Afeganistão entrar em colapso”, tais como a desvalorização da moeda, a fome e as crianças — “o futuro do país” — não frequentarem a escola. Foi ainda elaborada uma proposta sobre que medidas devem os talibãs adotar antes que as sanções sejam suspensas.

Fechado desde que os talibãs conquistaram o poder em meados de agosto, o serviço de passaportes reabriu brevemente em outubro, mas o afluxo de pedidos causou problemas técnicos, forçando os talibãs a deixarem de os emitir após alguns dias. O restabelecimento da emissão de passaporte é um teste à boa vontade dos islamitas, que se comprometeram perante a comunidade internacional a deixar sair os seus compatriotas se assim o desejarem e tiverem vistos válidos.