É possível trabalhar no Senado norte-americano sem Google? Para Ken Buck, sim. O congressista republicano de 62 anos, que representa a zona este do estado de Colorado, mantém um boicote pessoal a empresas cujas ações considera moralmente erradas, como o motor de busca mais usado em todo o mundo, a Amazon, o Facebook ou o Twitter.

Ao explicar o porquê de não usar a plataforma Google, Buck explica à revista Politico que “tudo começou com atum”. Há 30 anos, após descobrir que golfinhos estavam a ser mortos ao ficarem presos nas redes de pesca de atum, decidiu que deixaria de consumir este peixe. Este foi o início de uma série de boicotes pessoais a empresas cujas práticas considerava moralmente erradas: começou a conduzir um Ford, após a GM ter aceite dinheiro proveniente de um resgate federal. Removeu também o logótipo da Nike dos seus calções na sequência da polémica em torno de Colin Kaepernick.

“Quando vejo algo que considero uma injustiça, não me limito a não comprar o produto em causa”, partilha Buck, citado pela revista Politico.

Nos últimos dois anos, o congressista norte-americano cumpre um boicote a um leque de empresas que grande parte de Washington consideraria impossível de não usar: Google, Amazon, Apple, Facebook e Twitter. Segundo Buck, “estas empresas utilizam o seu enorme poder para esmagar os pequenos negócios com quem competem, e abusam da privacidade dos utilizadores apenas visando a obtenção de lucro”.

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Ken Buck pediu também aos seus colegas republicanos que parassem de aceitar contribuições por parte destas empresas. Pessoalmente, o republicano está a levar o boicote um passo mais longe: não utiliza o Google como o seu motor de busca; o seu staff tem ordens para não encomendar nada da Amazon; não tem conta de Facebook, nem para comunicar com a família. “Se eles [familiares] quiserem falar comigo, eles ligam-me”, defende.

O que torna o caso de Buck uma situação caricata, é o facto de ser uma das pessoas em Washington mais responsável pela supervisão de SiliconValley.

Buck ocupa o cargo mais elevado do Grand Old Party no Subcomité de Legislação Antitrust, Comercial e Administrativo da Câmara dos EUA. Devido aos trabalhos de investigação — conduzidos pelo subcomité — sobre competição nos mercados digitais, Buck ficou ciente do Bullying que as grandes corporações têm vindo a fazer aos competidores de menor escala, assim como as constantes invasões à privacidade dos utilizadores.

“Isto são crimes. São pessoas que deviam estar atrás das barras”, apontou.

“Não tenho um problema com as Big Tech [grandes empresas de tecnologia]. Tenho problemas com monopólios e como é usado o poder de monopólio”, partilhou Buck a um repórter da Politico, que o acompanhou durante um dia na sua vida de congressista, caracterizado pela falta de serviços das empresas mencionadas.

“Se ele boicotasse a Microsoft, estaria tramado”, afirma Bradford Fitch, presidente da Fundação (não partidária) de Gerência do Congresso, uma vez que todo o trabalho feito em Capitol Hill está dependente das ferramentas da empresa, desde o e-mail, ao calendário, às teleconferências.

Ken Buck admite que as suas escolhas requerem alguns sacrifícios — os quais não se importa de fazer. Como motor de pesquisa, utiliza o DuckDuckGo, uma empresa que alega respeitar a privacidade dos clientes, mas que apenas detém 3% do mercado das pesquisas.

Se tiver que esperar mais 10 segundos por um resultado de pesquisa, ou se tiver que procurá-lo numas páginas a mais, irei sobreviver”, argumenta.

Para serviço de GPS, Buck diz que utilizava o Waze — isto é, até a empresa ter sido adquirida pela Google. O mesmo aconteceu com a sua tentativa de comprar tecnologia americana: o seu computador é um Lenovo Yoga, do qual este se orgulhava, até ter descoberto que a empresa pertence agora à China.

Ao invés de utilizar a Amazon, Ken faz as suas compras através de sites de menor dimensão, como a Etsy ou Walmart.com.

Para evitar quaisquer acusações de hipocrisia, o republicano explica o porquê de utilizar o site da Walmart, um colosso norte-americano.  “Não conheço nenhuma corporação que seja verdadeiramente ‘limpa’. Como tal, o que tenho de fazer é decidir quais são as mais prejudiciais ou ofensivas e excluí-las da minha vida diária”, diz Buck. “Gostava que a Walmart não comprasse todos os seus produtos do Vietnam, Índia, Bangladesh ou China. Mas quando comparada à Amazon, a Walmart é apenas um pequeno jogador.”