Eduardo Cabrita, ex-ministro da Administração Interna, assinou um louvor de elogio aos trabalhadores que o acompanharam durante o tempo em que exerceu o cargo, nomeadamente aos motoristas, depois de um deles, Marco Pontes, ter sido acusado de homicídio por negligência no caso que levou à demissão do governante — o atropelamento de um trabalhador na A6 pelo carro oficial do ministro.

O louvor publicado em Diário da República, e tornado público pela TVI, tem a data de 4 de dezembro, um dia após a demissão de Eduardo Cabrita, que abandonou a pasta da Administração Interna depois de ser conhecida a acusação do motorista.

“No momento em que cesso funções como ministro da Administração Interna, expresso público louvor ao pessoal do apoio técnico-administrativo, do apoio auxiliar e aos motoristas do meu gabinete, pela disponibilidade, dedicação e sentido de responsabilidade que demonstraram no exercício das respetivas funções, contribuindo para o pleno funcionamento do gabinete e, deste modo, da área governativa da administração interna”, pode ler-se no louvor.

Na manhã em que se demitiu, Eduardo Cabrita, quando questionado sobre a acusação formal de Marco Pontes — o motorista que ia ao volante no momento em que o carro em que seguia o ministro atropelou mortalmente um trabalhador na A6 — defendeu-se ao dizer que era “apenas um passageiro” e que houve um “atravessamento de via não sinalizada”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Cabrita diz que é preciso apurar “atravessamento de via não sinalizada”. MP refere “atividade devidamente sinalizada”

Nessa mesma tarde, marcou uma conferência de imprensa para apresentar a demissão e evitar aquilo a que chamou um “aproveitamento político absolutamente intolerável” que poderia, aos olhos do então ministro, “condicionar a atuação do Governo”, de António Costa “ou mesmo o Partido Socialista”. Eduardo Cabrita garantiu que só se tinha mantido no cargo devido à “solidariedade do primeiro-ministro”.

“A viatura que me transportava foi vítima de um acidente que tragicamente determinou a perda de uma vida”, disse nessa mesma conferência. “Mais do que ninguém lamento essa trágica perda irreparável. A única situação verdadeiramente irreparável. A minha solidariedade para com a família da vítima.”

O motorista que conduzia o carro no dia 18 de junho de 2021, Marco Pontes, foi acusado de homicídio por negligência e de duas contra-ordenações. Segundo o despacho de acusação a que o Observador teve acesso, o condutor seguia na via da esquerda a uma velocidade de 163 km/hora.

Eduardo Cabrita demite-se depois de acusação no caso de atropelamento mortal

No processo que correu no Departamento de Investigação e Ação Penal de Évora, e que já não está em segredo de justiça, a procuradora do Ministério Público diz que o motorista Marco Pontes não teve uma “condução segura”, conduzindo sempre pela via da esquerda e não prevendo como possibilidade o “embate da viatura”. O que veio a acontecer ao quilómetro 77,6 da autoestrada, no sentido Marateca. No carro estava o ministro, três outros ocupantes e o motorista. Vinham todos da Escola da GNR de Portalegre.

A investigação da GNR apurou que o motorista, que embateu com a parte lateral esquerda do carro no trabalhador que se encontrava no separador central, excedeu em mais de 40 quilómetros a velocidade prevista na lei. Concluiu também que, apesar dos trabalhos que decorriam junto à faixa lateral direita da autoestrada, não havia trânsito, que o local estava em bom estado e que em nada “se justificou a opção pela condução pela via da esquerda”.