A associação de clientes lesados pelo Banco Privado Português (BPP) pediu ao Tribunal do Comércio a destituição da Comissão Liquidatária do BPP, que vem acusando de arrastar o processo de liquidação do banco há mais de 11 anos.

“A falta de transparência e de comunicação, a enorme ausência de atividade da Comissão liderada pelo Dr. Manuel Mendes Paulo, junto com uma série de questões que tem sido notícia na comunicação social ao longo dos últimos meses e a ausência de respostas da entidade responsável pela massa falida do BPP, levou a Privado Clientes entender não estarem reunidas condições para que a atual Comissão Liquidatária possa prosseguir a sua atividade”, disse a Privado Clientes – Lesados do BPP em nota enviada à Lusa.

O pedido de destituição foi feito esta quarta-feira através da plataforma Citius.

A Privado Clientes espera que a nomeação de uma nova Comissão Liquidatária seja “um passo no sentido de tornar a liquidação do BPP num processo mais célere, claro e transparente”.

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A associação que junta clientes lesados pelo BPP diz que, ao longo do último ano, tentou por várias vezes contactar a Comissão Liquidatária, mas “sempre sem sucesso”.

A associação de clientes lesados pelo BPP tem sido muito crítica para com a atuação da Comissão Liquidatária, que acusa de se querer perpetuar nos cargos à custa de credores que esperam há mais de 11 anos para serem compensados. Os lesados dizem ainda que a comissão liquidatária não cumpre a ordem do tribunal de indicar quanto cada credor tem a receber.

Defendem ainda que haja já pagamentos aos credores, mesmo que parciais.

No ano passado, após consultar o processo no Tribunal do Comércio, a Privado Clientes considerou um “escândalo” os 4,1 milhões de euros gastos, em 2020, em ordenados e outros custos administrativos pela Comissão Liquidatária.

Os lesados disseram ainda que o processo não indica quem são os 28 trabalhadores nem o valor de remuneração de cada um deles, acrescentando que se for feita “uma conta rápida”, então, “em média, cada um desses 28 colaboradores custa mais de 70 mil euros anuais, pagos com o dinheiro dos credores”.

Quanto a valores fixo mensais, indicou que, de concreto, o processo apenas refere as remunerações mensais propostas pelo Banco de Portugal e que o tribunal aceitou e fixou para 2021: o presidente, Manuel Paulo, ganha 4.650 euros por mês e os vogais José Pedro Simões e José Vítor Almeida ganham cada um 3.500 euros mensais.

Em 2020, a Comissão Liquidatária do BPP teve um prejuízo de 4,2 milhões de euros, ainda segundo o último relatório desse ano consultado pelos lesados do BPP.

Já desde o início da liquidação, a Privado Clientes diz que foram gastos cerca de 45 milhões de euros em custos de gestão.

A associação disse ainda que, ao ler o processo, ficou a saber que, em 2016, a Comissão liquidatária pediu autorização para fazer aumentos salariais, mas que, “para sorte dos credores, o Banco de Portugal refutou os argumentos da Comissão e negou a necessidade de qualquer aumento na remuneração”.

Lesados do BPP acusam comissão liquidatária de se perpetuar às custas dos credores

Em setembro, após uma manifestação de lesados do BPP em Lisboa, a Comissão Liquidatária fez um anúncio do Expresso em que disse que há 6.000 credores que têm a receber quase 1.600 milhões de euros, dos quais 450 milhões de euros são créditos garantidos (do Estado), 950 milhões de euros de créditos comuns e 200 milhões de euros de créditos subordinados.

Já os ativos líquidos, aquando da liquidação do banco, valiam 700 milhões de euros, pelo que o BPP tinha uma situação líquida negativa de 900 milhões de euros, “o que resulta, desde logo, na impossibilidade de satisfação integral de todos os créditos comuns reconhecidos”, avisou a Comissão Liquidatária.

Sobre pagamentos, a Comissão Liquidatária disse que dos 450 milhões de euros devidos, pagou ao Estado 305 milhões de euros diretamente, a que se somam 100 milhões de euros resultantes da afetação de outros ativos do BPP e de terceiros, assim como ao Fundo de Garantia de Depósitos e ao Sistema de Indemnização aos Investidores.

Quanto a outros pagamentos, afirmou que “não se encontram reunidos os requisitos legais para a execução dos rateios parciais”, pois enquanto o “principal credor garantido [o Estado] não for integralmente pago, não pode dar início ao pagamento a credores comuns” e que isso “estará sempre sujeito a autorização do tribunal”.

O colapso do BPP, banco vocacionado para a gestão de fortunas, verificou-se em 2010, já depois do caso BPN e antecedendo outros escândalos na banca portuguesa.

Apesar da sua pequena dimensão, o caso BPP teve importantes repercussões devido a potenciais efeitos de contágio ao restante sistema quando se vivia uma crise financeira, emergindo como caso judicial e de supervisão, pondo em causa a ação do Banco de Portugal. Deu-se então início ao processo de liquidação, que ainda decorre.

A Comissão Liquidatária do BPP, nomeada pelo Banco de Portugal, entrou em funções em maio de 2010, sendo então presidida por Luís Máximo dos Santos, o atual vice-governador do Banco de Portugal. Atualmente é liderada por Manuel Mendes Paulo, quadro do Banco de Portugal.

O antigo presidente do BPP João Rendeiro, arguido em vários processos judiciais, envolvendo burla qualificada, falsificação de documentos e falsidade informática, e já condenado a prisão, está desde meados de dezembro detido em Durban, na África do Sul, onde foi detido quando estava fugido à justiça portuguesa.

João Rendeiro foi visto por médico da prisão devido a problema cardíaco