Na única passagem pelo distrito de Faro, onde a CDU perdeu o mandato nas últimas eleições, a estratégia foi deixar o microfone à disposição. De volta, João Oliveira leva “murros no estômago” e o “calor de uma sala cheia”. Mas também deixou sementes, ou melhor, continua a fazer crescer as raízes das críticas ao Partido Socialista.

Decididos a reconquistar o mandato que perderam nas legislativas de 2019, os comunistas vieram a Sul deixar os microfones abertos para quem bem entendeu. Antes do comício da noite a caravana fez duas paragens estratégicas. A primeira no único município do distrito que está nas mãos dos comunistas. Em Silves, no centro de saúde de São Bartolomeu de Messines, João Oliveira foi recebido com entusiasmo, mas deixou que o foco da atenção fossem os utentes da unidade de saúde.

Com uma média de idades bem avançada, um após o outro aproximaram-se do microfone instalado para explicar os problemas que ali se vivem. Não há médicos, os que há não são portugueses e têm manifestas dificuldades de comunicação, já que vários utentes se queixaram de “não perceber nada” do que os clínicos tentam explicar nas consultas.

Num registo de proximidade e escuta atenta, João Oliveira não resistiu a dizer que ouvir os testemunhos de dificuldades daquelas pessoas era “mais um murro no estômago”. Com tempo para fazer mais perguntas a quem ali esteve esta manhã, Oliveira preocupou-se com a história que Maria Nascimento, de 72 anos, ali levou.

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“Venho cá sempre que há reuniões, o meu marido está há 7 anos paraplégico na cama e não tenho ajudas nem para uma fralda. Não temos cá médicos, os que são bons vão embora, os outros não estão cá tempo nenhum, não nos conhecem, não nos podem ajudar. Devíamos juntar-nos todos cá para exigir uma coisa melhor na saúde”, explicou Maria Nascimento frente ao microfone e depois num registo mais discreto a João Oliveira.

Mas não foi a única, nem o único tema em que a CDU aproveitou para deixar o microfone aberto. Horas depois, numa sessão em Lagos, o tema era a habitação. Houve lágrimas, de quem sempre “sonhou em comprar casa em Lagos”, mas que perante o aumento dos preços do arrendamento “e a construção apenas de luxo” teve que deixar esse sonho e houve também quem “agradecesse o trabalho ao longo dos anos da CDU”, mostrando-se atento aos pedidos de maioria absoluta “perigosos” de António Costa.

Na resposta, de João Oliveira, as críticas à lei Cristas. A contracena estava lançada e seria impossível resistir a mais uma oportunidade de atirar críticas à direita. Com uma ação mais participada de manhã, no entanto, a última frase foi a mesma e captou a atenção: “Camaradas, logo à noite há comício em Faro e há autocarros para quem precisar, estamos a organizar tudo para esse grande momento”.

E os autocarros lá estavam. Pouco antes das 21 horas, hora agendada para o início do momento musical — de Ricardo Martins e Cláudio Sousa, nas guitarras portuguesas — os autocarros paravam perto da entrada da Universidade de Faro onde a sala se compunha para ouvir a cabeça de lista Catarina Marques, a presidente da câmara de Silves Rosa Palma e, claro, João Oliveira.

A caravana até pode ter sofrido alguns contratempos, mas uma coisa é certa, a máquina bem oleada dos comunistas continua a ser eficaz para encher auditórios, mesmo em tempo de pandemia, mesmo numa noite de inverno fria.

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E quem apanhou o autocarro até ao comício em Faro saiu de lá com a bagagem recheada de críticas ao PS. Se António Costa não responde, João Oliveira explica.

“Em matéria de convergência já se percebeu que a única coisa que o PS quer afastar é a convergência com a CDU e já se percebeu também porquê”, começou por dizer explicando: “Porque a convergência com a CDU obriga o PS a dar resposta a problemas”.

E a colagem do PS à direita é um dos focos centrais. Diz o secretário-geral temporário que com a CDU os socialistas têm que “abandonar opções da política de direita a que querem dar andamento, têm que adotar medidas de combate às injustiças e de valorização do trabalho, reforçar os serviços públicos e combater os interesses dos grupos económicos”.

Com António Costa a dizer que volta a levar ao Parlamento o Orçamento que precipitou a crise política, a CDU insiste no ponto que ditou a clivagem entre os dois partidos: o aumento do salário mínimo nacional para os 850 euros.

“Não é para daqui a quatro ou cinco anos, mas para este ano e para o próximo que o salário mínimo deve ser fixado em 800 e 850 euros”, atirou o comunista dizendo ainda que “de nada servem as boas intenções” quando se recusa “revogar as normas gravosas da lei laboral”.