A junta militar, que tomou o poder em Myanmar, em 01 de fevereiro de 2021, continua sem conseguir controlar totalmente o país apesar da violência contra os opositores, que preparam protestos no primeiro ano do golpe.

Os generais birmaneses não esperavam uma resistência tão forte quando, há um ano, puseram fim a uma década de transição democrática no país, ao derrubarem o governo eleito da prémio Nobel da Paz Aung San Suu Kyi, depois de uma esmagadora vitória nas urnas da Liga Nacional para a Democracia (LND).

Suu Kyi, de 76 anos, mantida em local secreto e já condenada a seis anos de prisão, incorre em décadas de detenção em processos pendentes, acionados pela junta. Outros responsáveis da LND estão a cumprir pesadas sentenças.

Ao longo deste ano, as bolsas de rebelião multiplicaram-se, tendo a junta militar intensificado a repressão dos dissidentes.

De acordo com uma organização não-governamental (ONG) local, a Associação de Assistência aos Presos Políticos, cerca de 1.500 civis foram mortos e perto de 12 mil detidos, entre denúncias de violações, tortura, execuções extrajudiciais e massacres.

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A frente anti-junta, liderada por milícias de cidadãos apoiadas por fações étnicas, está a crescer na região de Sagaing (centro) e no estado de Kayah (leste), onde o exército realizou bombardeamentos aéreos, esvaziando a capital, Loikaw, de grande parte dos residentes, de acordo com a agência de notícias France-Presse.

Mais a sul, opositores encontraram refúgio num território controlado pelos rebeldes karens e palco de confrontos esporádicos. A norte, uma fação da etnia kachin disse já estar pronta a “cooperar com outros grupos para estabelecer uma democracia federal”.

À crise política juntou-se a pandemia da Covid-19 a pesar sobre a economia. Com uma inflação galopante e centenas de milhares de empregos que foram perdidos, o Banco Mundial apontou para um crescimento quase nulo este ano, depois de uma contração estimada em 18% em 2021.

Grupos internacionais, como o francês TotalEnergies, o norte-americano Chevron, o australiano Woodside e o norueguês Telenor, deixaram o país, ao mesmo tempo que mais de 300 mil civis estão deslocados, alguns refugiados na Índia e na Tailândia.

Observadores têm notado um aumento de atividades ilegais na região, principalmente tráfico de drogas sintéticas.

Até aqui, o regime no poder em Naypyidaw não foi perturbado pela ação da comunidade internacional – focada no Afeganistão, no Iémen e na Ucrânia – limitada a resoluções não vinculativas do Conselho de Segurança da ONU, um plano da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) de renovação do diálogo e sanções específicas de várias potências ocidentais.

Várias ONG, incluindo a Human Rights Watch, pediram à ONU para adotar um embargo ao armamento, recusado pela China e pela Rússia.

A junta prometeu um novo escrutínio em 2023, o que é considerado pouco credível perante o caos atual.

Para assinalar um ano de golpe, opositores apelaram, através de redes sociais, para a realização de greves silenciosas na terça-feira, por todo o país.

A resposta não se fez esperar: as autoridades advertiram que tais ações poderiam ser consideradas como alta traição, um crime punível com a pena de morte, de acordo com um comunicado publicado na semana passada na imprensa oficial.