As forças de segurança de Myanmar (antiga Birmânia) prenderam dezenas de pessoas numa ação preventiva para evitar uma greve nacional no primeiro aniversário da tomada do poder pelo exército, noticiou esta segunda-feira a imprensa local.

Os opositores ao domínio militar no país apelaram aos birmaneses para que observem uma “greve silenciosa” na terça-feira, destinada a esvaziar as ruas das cidades e vilas de Myanmar, fazendo com que as pessoas fiquem em casa e as empresas fechem as portas das 10h00 às 16h00 locais.

Pelo menos 58 pessoas foram presas desde a semana passada, após avisos de que as suas lojas e empresas iriam fechar na terça-feira, de acordo com notícias do diário estatal Myanma Alinn, citadas pela agência de notícias Associated Press (AP).

Os detidos, nas cidades de Rangum, Mandalay e Myawaddy, incluem lojistas, proprietários de restaurantes, um médico, um maquilhador, um proprietário de uma loja de reparação de telemóveis e um astrólogo.

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As detenções seguiram-se a avisos oficiais de que qualquer pessoa que participasse na greve seria passível de ser processada em pelo menos quatro acusações, incluindo ao abrigo da Lei Antiterrorismo, com uma pena máxima de prisão perpétua e o possível confisco dos seus bens.

A repressão foi confirmada por amigos e familiares de alguns dos alvos, incluindo o SIP Café Club de Mandalay, a segunda maior cidade birmanesa, depois de Rangum, situada no centro do país do Sudeste Asiático.

“A página [no Facebook] anunciou que seria encerrada em 1 de fevereiro, utilizando as palavras ‘greve silenciosa’, e o café foi confiscado“, disse um dos seus trabalhadores à AP sob a condição de não ser identificado, por temer represálias das autoridades.

O Exército birmanês tomou o poder em 1 de fevereiro de 2021, num golpe militar que depôs o governo eleito de Aung San Suu Kyi, cujo partido da Liga Nacional para a Democracia (LND) estava prestes a iniciar um segundo mandato de cinco anos, após ter conseguido uma vitória esmagadora nas eleições de novembro do ano anterior.

Myanmar: Aung San Suu Kyi acusada de fraude eleitoral nas eleições de 2020

O golpe pôs fim a uma década de transição democrática no país, que já tinha conhecido uma ditadura militar entre 1962 e 2011.

Aung San Suu Kyi, 76 anos, está mantida em local secreto e já foi condenada a seis anos de prisão.

A prémio Nobel da Paz de 1991 incorre em décadas de detenção em processos pendentes, acionados pela junta militar. Outros dirigentes da LND estão a cumprir pesadas sentenças.

Duas greves silenciosas anteriores no ano passado, em março e no Dia dos Direitos Humanos em dezembro, pareceram gozar de apoio popular apesar da intimidação das autoridades, que em alguns casos não permitiram que as lojas participantes reabrissem até uma semana mais tarde.

Os avisos do governo constituem um dilema para os empresários de etnia chinesa, já que a terça-feira cai durante a celebração do Ano Novo Lunar chinês, quando muitos fechariam as suas lojas para o feriado.

Manifestações generalizadas não violentas seguiram-se à tomada do poder pelo exército em 2021, mas depois de os protestos terem sido reprimidos com força letal, começou uma resistência armada, que está ativa em zonas urbanas e rurais.

Myanmar: Junta militar sem controlo total do país um ano depois do golpe

A organização não-governamental birmanesa Associação de Assistência aos Presos Política denunciou que, no último ano, cerca de 1.500 civis foram mortos e perto de 12 mil detidos, entre denúncias de violações, tortura, execuções extrajudiciais e massacres.