O juiz Ivo Rosa concordou com a decisão do juiz Carlos Alexandre em não permitir a Ricardo Salgado o levantamento dos bens que lhe foram arrestados no megaprocesso do caso BES para, com esses recursos, poder pagar à massa falida do Grupo Espírito Santo e, assim, livrar-se de uma possível pena no processo extraído da Operação Marquês.

No despacho de abertura de instrução do megaprocesso BES, assinado por Ivo Rosa a 24 de janeiro, e a que o Observador teve acesso, o magistrado lembra que o antigo presidente do BES pediu que a decisão de Carlos Alexandre fosse considerada nula e irregular. Nula por, segundo a defesa de Salgado, não estar fundamentada. Irregular porque, do ponto de vista dos advogados, não podia ter sido tomada pelo juiz Carlos Alexandre porque não foi ele quem ficou com a instrução do processo (a fase processual que segue o inquérito, ou investigação, que resulta numa acusação ou no arquivamento do caso).

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O pedido de nulidade e de irregularidade da decisão foi feito a 23 de setembro e a 22 de outubro houve mesmo um recurso para o tribunal da Relação. Porém, Ivo Rosa considerou-se competente para conhecer dos vícios invocados pela defesa, ou seja, para analisar o que está em causa, e não o tribunal superior.

A defesa de Salgado queixou-se que o juiz Carlos Alexandre se limitou a subscrever a posição do Ministério Público e que não fundamentou a sua decisão como a lei obriga. De facto, escreveu Ivo Rosa, o juiz limitou-se a “remeter para a promoção do MP a qual se mostra transcrita na íntegra”.  O MP explicou que um levantamento do arresto “revelaria uma total desconsideração pelas vítimas de crime, no que poderia ser visto como a salvaguarda do exercício abusivo dos interesses da defesa noutros processos que não este”.

Ainda assim, o juiz Ivo Rosa considerou “que o despacho em causa está minimamente fundamentado”. “Coisa distinta é saber se os fundamentos invocados têm consistência, aí deverá ser um tribunal superior a apreciar”, diz por seu turno, abrindo a porta para o tribunal superior olhar para esta decisão.

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Já quanto ao alegado vício de incompetência do tribunal, Ivo Rosa lembra que a fase de inquérito do caso encerrou a 17 de julho de 2020 e só foi distribuído para a instrução a 28 de outubro de 2021, logo o pedido de Salgado chegou antes disso. Assim todos os atos processuais são praticados pelo juiz de instrução criminal a quem estava originariamente distribuído o processo, neste caso Carlos Alexandre, “motivo pelo qual não há nulidade ou irregularidade”.

Ricardo Salgado pediu o levantamento do arresto dos bens no chamado megaprocesso do BES e no Monte Branco para perfazer um total de 10,7 milhões de euros que quer devolver à massa falida do Grupo Espírito Santo para assim conseguir ser dispensado de uma possível pena pelos três crimes de abuso de confiança que está agora a ser julgado — um processo separado da Operação Marquês por decisão de Ivo Rosa e que está agora a ser julgado. Salgado responde por três crimes de abuso de confiança por três transferências vindas da ES Enterprises, considerado o saco azul do BES, para offshores por si controladas: uma de 4 milhões de euros que recebeu e outra de 2,57 milhões (esta através de Hélder Bataglia) que recebeu na Savoices, e outra tranche de 4 milhões que recebeu noutra offshore, a Begolino (através de Henrique Granadeiro). As alegações finais deste processo estão aliás marcadas para terça-feira dia 8 de fevereiro.