A antestreia da Temporada Cruzada entre França e Portugal acontece na sexta-feira na Filarmónica de Paris, com o compositor Fernando Lopes-Graça a ser tocado pela primeira vez numa grande sala da capital francesa.

“É a primeira vez que Fernando Lopes-Graça vai ser tocado numa grande sala em Paris. Esta é uma abertura para a descoberta. Há tantas obras sinfónicas importantes em Portugal e de repertório para piano, espero que os diretores de orquestra franceses estejam atentos”, disse Bruno Belthoise, pianista e coprogramador deste evento, em declarações à Agência Lusa.

O concerto “Portugal Rêvé”, ou “Portugal Sonhado”, em português, vai dar o pontapé de saída para um fim de semana onde a música portuguesa e os seus intérpretes vão estar em destaque.

Respondendo aos desafios da Temporada Cruzada, vão ser tocadas peças musicais emblemáticas dos séculos XX nos dois países, mas também novas criações encomendadas para este momento.

“Com o maestro Michaël Cousteau, tentámos verdadeiramente lançar um programa ambicioso que põe em diálogo um grande compositor do repertório francês, Maurice Ravel, com Fernando Lopes-Graça, que merece ser conhecido em todo o mundo e dar destaque aos novos compositores”, explicou.

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Assim, a Orquestra da Picardia, dirigida por Michaël Cousteau, vai interpretar em Paris a Sinfonieta op. 220, uma homenagem a Haydn, de Fernando Lopes-Graça, sendo depois tocado o Concerto para piano op. 78, de Anne Victorino D’Almeida, e o conto “O Pescador e a Lua”, interpretado pela soprano Raquel Camarinha e musicado por Benjamin Attahir, duas criações originais para esta ocasião. O concerto vai encerrar com a obra “Ma mère l’Oye”, de Maurice Ravel.

Este concerto segue depois para Portugal, com uma apresentação no dia 19 de fevereiro no Centro de Congressos da Madeira, no Funchal, a 7 de maio no Picadeiro Real, em Lisboa, e a 25 de junho no Grande Auditório do Convento São Francisco, em Coimbra.

Há cerca de 25 anos que Bruno Belthoise promove a música portuguesa em França, após uma “história pessoal” com o país, já que, apesar de não ter raízes portuguesas, desde muito cedo conviveu com portugueses em Paris, o que o levou a Lisboa muito novo, tendo voltado depois de concluir os seus estudos superiores musicais.

Fiquei estupefacto com a riqueza da música e cultura portuguesa e fiquei muito impressionado com a qualidade dos compositores portugueses, que ainda nem estavam editados“, explicou o pianista, que desde os anos 1990 leva a cabo investigação no âmbito dos compositores portugueses de forma a gravar partituras que até agora não tinham sido editadas em disco.

Bruno Belthoise considera que há vários fatores que têm contribuído para o desconhecimento da música clássica portuguesa em França.”É muito difícil um músico francês citar o nome de um compositor português e, no entanto, estamos na Europa de 2022. Isso não tem só a ver com a falta de curiosidade dos franceses, mas também com a história de Portugal, a problemática ao nível da edição, o facto de as gravações nacionais não terem saído do país, logo, a imprensa internacional nunca sequer se deu conta que esta música existia“, enumerou.

Nos últimos anos, Bruno Belthoise tem-se dedicado à edição de partituras de música portuguesa destinadas aos professores, com 2022 a ter como tema os fados para piano. Esta temporada, segundo o pianista, pode ser o momento definitivo para a descoberta da música portuguesa em França. “Gostava que, um dia, a Radio France programasse uma sinfonia de Joly Braga Santos ou a sinfonia “A Pátria”, de José Vianna da Motta. Há muito repertório. O seguimento mais interessante desta temporada seria de despertar o interesse numa certa falange francesa”, concluiu.

O pianista vai ainda ter outras iniciativas nesta Temporada Cruzada, como concertos dedicados ao conto “Kô & Kô, os dois esquimós”, da autoria de Pierre Gueguen e ilustrações de Maria Helena Vieira da Silva, reeditado pelas edições Chandeigne em 2019, e o recital “La Musique Portugaise pour le piano” que vai apresentar em diversas cidades francesas.