Menos de 20 dias depois das legislativas, o Chega realizou um jantar-comício em Benavente, no distrito de Santarém, onde o partido conquistou um dos melhores resultados das eleições. Ausente esteve a vereadora eleita na vila ribatejana, Milena Castro, que foi condenada pelo crime de recetação, mas apresentou um registo criminal limpo.

O Observador sabe que, tendo em conta o facto de ainda não ter sido tomada uma decisão por parte do Chega — a direção desconhecia o caso, mas tomará as “necessárias medidas” —, foi considerado “mais sensato” que a dirigente local não marcasse presença naquele que é o primeiro evento nacional desde que o partido elegeu 12 deputados para o Parlamento.

Vereadora do Chega em Benavente foi condenada por comprar sucata roubada a grupo criminoso liderado por militar da GNR

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

No distrito em que o partido obteve 10,91%, com 23.813 votos, André Ventura foi recebido com uma ‘guarda de honra’ composta por três cavalos montados por campinos. Na sala do restaurante, mais de 400 pessoas esperavam o líder do partido. E ainda antes do jantar tardio, da distribuição de prendas e do fado, um dos dirigentes locais, Rui Santos, traçava um desejo: fazer de Santarém um “Venturistão” (uma referência ao Cavaquistão, uma alusão aos tempos em que Cavaco Silva liderava o PSD e teve grandes resultados em Viseu). André Ventura já lhe tinha chamado “o bastião do Chega” e escolheu o distrito para “celebrar os resultados eleitorais”.

Com os olhos postos no futuro, o líder do Chega deixou claro que é preciso fazer um caminho diferente dos partidos que perderam deputados ou até representação nas eleições legislativas e assegurou que o percurso será feito sem moderação e mantendo um afastamento daqueles a que chama partidos do sistema. “O nosso eleitorado não é convertível por nenhum partido do sistema, nós é que vamos atrás do vosso eleitorado“, assegurou André Ventura.

Aliás, a moderação que, em tempos, não excluiu está, afinal, colocada de parte: “Não vão ver um desvio na nossa identidade, na nossa forma de ser, na forma de lutar. As causas pelas quais lutámos e prometemos são as mesmas que levamos ao Parlamento. Não nos podemos moderar nem vender a nenhum partido do sistema.”

No mesmo sentido, o líder do partido nacionalista disse até ser “curioso e irónico” que os líderes dos partidos que disseram que apenas falariam com o Chega se houvesse “moderação” estejam os dois “de saída”: Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos, que vão deixar as lideranças de PSD e CDS após os resultados das eleições legistativas.

Numa noite que descreveu como “histórica”, André Ventura até disse o que “nunca” pensou dizer e quis “conter-se nas palavras”, mas não conseguiu. O líder do Chega referia-se à expressão “amor cigano“, parte da música interpretada por Maria João Quadros que foi desafiado a cantar. E cantou. Mas não esqueceu.

O que também não deixou escapar da memória e fez questão de referir foi a ideia de que o Chega só teve uma “derrota” na noite eleitoral, “a maioria absoluta do PS”. Para a combater nos próximos anos, André Ventura aproveitou a geografia de Benavente e falou do Largo do Calvário para se comprometer em “tornar a vida dos socialistas num calvário” e para contrariar a ideia de “país de loucos onde parece que se gosta de ser castigado com o chicote socialista“.

“António Costa, há uma coisa que lhe garanto, disse que não passaremos, [mas] enquanto o Chega estiver com a força que está no Parlamento, não deixaremos que memória e caso de José Sócrates se repita em Portugal”, enfatizou o presidente do partido nacionalista.

A narrativa do discurso focou-se nos ataques aos adversários. Primeiro, o Bloco de Esquerda, a que chamou “o partido do táxi”, uma referência aos cinco deputados eleitos. André Ventura recordou as palavras de Catarina Martins na campanha eleitoral — em que disse que votar no Bloco seria uma derrota o Chega — e antecipou que o partido seria o próximo na “maldição no Parlamento: quem tem cinco deputados desaparece nas eleições seguintes”. “Vamos lutar para fazer o Bloco desaparecer. Era um sonho incrível naquela Assembleia”, afirmou.

“Cada pedra do lado da bancada do Chega serão 10 pedras do lado da extrema-esquerda a cair todos os dias”, acrescentou.

Seguiu-se o CDS, o partido que está “fora da Assembleia”. “Em política, a falta de humildade paga-se muito cara e os eleitores não perdoaram a quem quis humilhar-nos e ofender-nos”, acusou o líder do Chega, ao enaltecer que o partido liderado por Francisco Rodrigues dos Santos “deixou de representar” os portugueses e teve o “destino de todos os que vendem a alma ao diabo: desaparecer”.

André Ventura recusou ainda que existam “três partidos de oposição à direita” e colou a Iniciativa Liberal ao PS, dizendo que tem de ser “confrontada”. “O PS passou seis anos com muletas à esquerda e agora vai ter duas muletas à direita”, frisou, referindo-se ao PSD e à IL.

O presidente do Chega reiterou que só há “uma oposição em Portugal” e que “sempre que [o partido for] rotulado de fascista, racista ou saudosista [de Salazar]” responderá “com trabalho”. “Se o país perder a noção do que é o trabalho, perde a noção do que é a justiça”, concluiu, com o lema adaptado à cabeça: “Deus, Pátria, Família e Trabalho.”