Há qualquer coisa de especial entre a quinta tentativa de Auriol Dongmo e grandes provas internacionais de Pista Coberta. As marcas foram agora muito superiores nos Mundiais mas também nos Europeus realizados no ano passado o penúltimo ensaio funcionou como fator diferenciador para a luso-camaronesa ganhar a sua primeira medalha de ouro por Portugal. Aí, a lançadora foi gigante; agora, revelou-se ainda maior. E foi esse minuto antes do quinto lançamento que deu nova vitória à atleta no arranque de um 2022 em cheio.

A redenção depois da “coisa mais horrível da vida”: Auriol Dongmo sagra-se campeã mundial de Pista Coberta

Jessica Schilder, que tinha sido a grande revelação do ano até ao momento, liderava o concurso do peso com 19,64 à quarta tentativa. Chase Ealey, americana que estava a ficar pressionada pela compatriota Maggie Ewen e pela sueca Fanny Roos, sacou o recorde continental com 20,21. Auriol Dongmo, “presa” no 19,32 e na sequência de dois nulos, tinha de reagir. Fixou o horizonte, olhou depois para o céu, fechou a cara de forma concentrada como até aí nunca tinha feito e foi tecnicamente perfeita a lançar o peso. 20,43, recorde pessoal e nacional completamente pulverizado, cara fechada a intimidar as adversárias sem esboçar um sorriso até ver o grande resultado no marcador eletrónico e sair a correr a cumprimentar adversárias até chegar à zona onde se encontrava o seu treinador, Paulo Reis. No final, após o nulo de Ealey na sexta e última tentativa, caiu de joelhos, emocionou-se e voltou a olhar para cima como forma de agradecimento pela vitória.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Estava um pouco presa. Depois de duas vezes 19,32, estava a pensar: se não sair daqui alguém vai passar. Quando a Jessica Schilder passou, queria lançar longo mas fiquei um pouco presa. Quando a americana [Chase Ealey] passou, não sei onde fui buscar força, mas pensei para mim que tinha de ser agora. Depois do 20 da Chase Ealey, fiquei a olhar para cima, a pedir ajuda a Deus, porque precisava mesmo de ajuda aqui, senão não conseguia fazer uma coisa grande”, comentou no final da prova a atleta à agência Lusa.

“É uma alegria imensa e uma medalha que queria mesmo. Pedi a Deus que me desse esta medalha”, frisou, ficando já atenções nos Mundiais e nos Europeus ao Ar Livre, em julho e agosto, “porque nada cai do céu”.

“Passar os 20 metros pela primeira vez na minha carreira é uma sensação incrível. Sabia que estava pronta para melhoria do meu recorde, pois estava fortemente preparada nesta temporada de inverno, mas ainda não tinha a certeza de quando seria capaz de realizar esse meu potencial. Finalmente consegui chegar ao meu melhor resultado na hora certa e no lugar certo. Esta noite senti-me calma e estava confiante. Não tenho palavras para descrever esse sentimento de me tornar campeã do mundo, de voltar ao topo do mundo. Esta vitória vai motivar-me ainda mais a continuar com o peso ao mais alto nível”, diria depois, neste caso citada pela Federação Portuguesa de Atletismo, após a festa sempre com a (enorme) bandeira nacional.

“Estou motivada para trabalhar ainda mais duro para chegar ao pódio em Oregon-2022. Tinha sonhado com a medalha olímpica no verão passado, mas isso não aconteceu. Queria dedicar a minha medalha de Tóquio ao meu treinador, como não o fiz, então tenho a oportunidade de fazê-lo hoje”, concluiu.