O Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra concluiu que a pandemia contribuiu para intensificar as desigualdades estruturais na Academia, especialmente de mulheres, docentes e investigadores com dependentes ao seu cuidado.

Esta é a principal conclusão do projeto de investigação “Pandemia e Academia em casa – que efeitos no ensino, investigação e carreira? Estudo sobre as mudanças no sistema científico e de ensino superior”, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, que teve como objetivo conhecer as estratégias de adaptação ao trabalho docente e de investigação relacionados com a Covid-19, por instituições e pelos diferentes grupos que compõem o pessoal académico.

Em comunicado, a Universidade de Coimbra destacou que os resultados deste estudo empírico estão em linha com as conclusões de outros estudos internacionais.

“Demonstram que as transformações provocadas pela Covid-19 nas atividades de ensino e investigação em Portugal fizeram emergir novas fontes de desigualdades (ou agravaram as já existentes, mas ocultas ou subestimadas) entre mulheres e homens, e entre pessoas com agregados familiares de composição diferenciada”, acrescentou.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Os resultados evidenciam ainda que as respostas dadas pelas instituições aos desafios impostos pela crise pandémica foram “limitadas/insuficientes no propósito de amortecer os seus efeitos nas condições de trabalho e desempenho de docentes e investigadores”.

No documento, pode ler-se que as instituições de ensino superior e investigação assumiram que a criação de condições de trabalho em regime remoto era um problema sobretudo individual, dando pouca atenção às dificuldades que cada um deles enfrentava para acomodar responsabilidades profissionais e familiares no contexto de trabalho a partir de casa.

“Cerca de 80% da amostra não tinha tido experiências prévias de ensino por meios virtuais, tendo abruptamente passado a lecionar de forma remota, sem qualquer preparação pedagógica ou mesmo técnico-científica. Depressa também se percebeu que as gerações de estudantes — que nasceram na chamada era digital — pouco estavam preparadas para substituir a sala de aula pelos écrans, pela falta de autorregulação e de motivação para a aprendizagem, mas também, em muitos casos, por falta de meios tecnológicos e logísticos, nas suas habitações, para acompanharem as aulas”, evidenciou.

Os resultados apontam para “o reforço das desigualdades de género na divisão do trabalho académico durante o período pandémico, assumindo as mulheres a maior parcela de esforço associada ao acréscimo das exigências materiais e emocionais de ensino/aprendizagem e serviço académico durante este período – constituindo aquilo que a literatura identifica como “trabalho doméstico académico”.

“56,6% das mulheres reportaram aumento no tempo despendido no atendimento e acompanhamento de estudantes (em contraste com 45,8% dos homens) e em tarefas de gestão desempenhadas para as instituições durante a crise pandémica (47,7% versus 39,9%)”, apontou.

O estudo, coordenado por Virgínia Ferreira, relevou também o impacto do aumento das tarefas de cuidado/apoio escolar associadas à maternidade e à paternidade sobre o volume e organização do tempo disponível para o trabalho profissional, apontando também para uma maior severidade da pandemia na produtividade científica das mulheres, especialmente com crianças pequenas.

De acordo com a Universidade de Coimbra, esta análise baseou-se num Plano de investigação misto, operacionalizado com recurso a um inquérito eletrónico, entre março e abril de 2021, que originou 1.750 questionários validados, quatro entrevistas focalizadas de grupo, com um total de 31 participantes e sete entrevistas semi-estruturadas a representantes de entidades relevantes para o sistema do ensino superior e científico nacional.

“A informação produzida através destas abordagens foi analisada com recurso a técnicas estatísticas descritivas e inferenciais e a análises de conteúdo temáticas”, concluiu.