“Depois do Amor”

Mary Hussain converteu-se ao islamismo para casar com Nasser, piloto de “ferries” em Dover, onde vivem. O marido morre subitamente em casa, uma noite, e Mary descobre que ele tinha uma amante e um filho em Calais, levando uma vida dupla. A viúva decide ir a França falar com a outra mulher, mas é tomada por esta – que não sabe que o homem que partilhavam morreu – pela empregada de limpeza de uma agência que contactou porque está a mudar de casa. Primeiro filme do britânico de origem paquistanesa Aleem Khan, “Depois do Amor” é uma história de bigamia laconicamente naturalista em que o facto de Mary se ter tornado muçulmana não pesa particularmente no enredo nem toma um qualquer significado “político” (ninguém é hostil ou agressivo para com ela). Joanna Scanlon é excelente na protagonista, que interpreta com parcimónia verbal e reserva emotiva, fazendo passar tudo pelo olhar e pela expressão corporal.

“O Crime de Georgetown”

Christoph Waltz estreia-se a realizar e interpreta o protagonista nesta fita que se inspira num facto real: o assassínio, no Verão de 2011, em Georgetown, um bairro chique de Washington, de uma “socialite” e antiga jornalista nonagenária, pelo seu segundo marido, um alemão bem-falante e charmoso quase 50 anos mais novo que ela, muito popular no seu círculo de amigos e nos meios político-diplomáticos da cidade, e que se revelou ser um alpinista social, embusteiro e mitómano. Waltz é muito melhor à frente das câmaras do que atrás delas. “O Crime de Georgetown” revela-se um filme frágil, ingénuo e pouco seguro de si (porquê introduzir “capítulos” com títulos informativos numa história tão linear e óbvia como esta?), que caberia melhor na televisão do que no cinema. Vanessa Redgrave é a iludida mulher do burlão e Annette Bening pouco tem para fazer no papel da filha desta. Pelo menos, fica tudo despachado na canónica hora e meia.

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“Ouistreham — Entre Dois Mundos”

Emmanuel Carrère adapta aqui o livro de não-ficção “Le Quai de Ouistreham”, publicado em 2010 pela jornalista Florence Aubenas, que andou a trabalhar incógnita ao lado das funcionárias de limpeza dos “ferries” do Canal da Mancha, para dar rostos, quotidianos, vidas, àqueles mais afetados pela crise, aos precários, aos invisíveis, aos remediados, que subsistem com orçamentos rigorosamente apertados e estão no fim da cadeia laboral, em empregos instáveis, ingratos, mal pagos, repetitivos, desgastantes. E a maior parte dos quais não tem esperança de passar da cepa torta. Aubenas é rebatizada Marianne Winkler e interpretada por Juliette Binoche, que o realizador, para uma maior autenticidade, rodeou de atores não-profissionais, alguns deles interpretando-se a si mesmos. “Ouistreham — Entre Dois Mundos” foi escolhido como filme da semana pelo Observador e pode ler a crítica aqui.