A Câmara de Leiria anunciou esta segunda-feira que quer iniciar o processo para comprar terrenos no Abrigo do Lagar Velho, onde foi descoberto o “Menino do Lapedo”, um espaço objeto de vandalismo há cerca de um mês.

“(…) Pretende-se lançar o processo para a aquisição dos terrenos do Monumento Nacional do Abrigo do Lagar Velho e do Centro de Interpretação do Abrigo do Lagar Velho, para defesa do superior interesse público, para além de impulsionar e incrementar diversos trabalhos e colaborações, numa lógica de aprofundamento da investigação em torno de um dos mais emblemáticos sítios que integram o património arqueológico de Leiria“, referiu o Município de Leiria, numa resposta escrita à agência Lusa.

Em 19 de fevereiro, a Câmara de Leiria, presidida por Gonçalo Lopes, informou que o sítio arqueológico Abrigo do Lagar Velho, em Santa Eufémia, classificado em 2013 como Monumento Nacional, onde foi descoberto o esqueleto do “Menino do Lapedo” (classificado em 2021, assim como os artefactos arqueológicos associados, como Tesouro Nacional), sofreu atos de vandalismo.

Na ocasião, a autarquia esclareceu que foi apresentada queixa à GNR e relatada a situação à Direção-Geral do Património Cultural (DGCP) e à Direção Regional de Cultura do Centro.

Entretanto, o Ministério Público fez saber que abriu um inquérito para investigar o vandalismo, considerando que em causa “estão factos que podem indiciar a prática de um crime de dano qualificado”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Já em 22 de fevereiro, em reunião do executivo municipal, a Câmara defendeu medidas para a segurança deste sítio arqueológico, tendo a vice-presidente e vereadora com o pelouro da Cultura, Anabela Graça, informado que se aguardava por uma reunião com o diretor-geral do Património Cultural, que ocorreu no dia 11, “no sentido de perspetivar, em termos de futuro, o que é que se pode e deve fazer”, considerando que “as entidades competentes serão muito importantes em termos desta parceria para a resolução do problema da segurança deste local”, do domínio privado.

Anabela Graça realçou então que “os danos causados pelo vandalismo” foram sobre “o denominado Testemunho Pendurado e não no “Menino do Lapedo””.

O Testemunho Pendurado, com cerca de 60 cm de espessura, preenche uma fissura estreita e alongada, na parede de fundo do abrigo cortada pela terraplanagem, situada 1,2 a três metros acima da superfície artificial do terreno. Os depósitos vieram a revelar contextos arqueológicos datados entre 24 mil e 26 mil anos.

Na resposta enviada esta segunda-feira à Lusa, a autarquia afirmou que a DGCP “informou o Município de Leiria da elaboração de um levantamento técnico e científico da afetação sobre o ‘Testemunho Pendurado'”.

“Encontra-se [a DGCP], neste momento, a efetuar as tramitações necessárias para a manutenção e salvaguarda do mesmo, estando a decorrer o processo de adjudicação dos trabalhos por parte de uma equipa de especialistas”, adiantou.

A Câmara acrescentou que “a valorização e interpretação do Abrigo do Lagar Velho e Vale do Lapedo constituem uma das ações definidas no Eixo I — Uma Comunidade, Múltiplas Heranças do Plano Estratégico Municipal da Cultura de Leiria”.

Já o Eixo IV (Abertura e Diálogo Global) deste plano, aprovado em julho de 2021 na Assembleia Municipal, tem como uma das ações a candidatura do sítio arqueológico do Vale do Lapedo a Marca do Património Europeu.

Segundo o Município, a Direção Regional de Cultura do Centro é responsável pelo convite para apresentação da candidatura à Marca do Património Europeu, que visa “reforçar o sentimento de pertença à União Europeia por parte dos cidadãos europeus, em particular dos jovens, com base nos valores e elementos comuns da história e do património cultural da Europa, e na valorização da diversidade nacional e regional, e em promover a compreensão mútua e o diálogo intercultural”.

A mensagem de humanidade revelada pelo achado arqueológico “Menino do Lapedo”, um esqueleto com cerca de 29 mil anos descoberto em 1998, inspirou a candidatura de Leiria a Capital Europeia da Cultura 2027.

A descoberta marcou a paleoantropologia internacional, por se tratar do primeiro enterramento Paleolítico escavado na Península Ibérica e porque a criança apresenta traços de “neandertal” e de “homo sapiens”.