O preço médio da eletricidade no mercado grossista subiu 230% no ano passado e ainda podia ter subido mais se não fosse o contributo das fontes renováveis. Esta é uma das conclusões do estudo da consultora Deloitte para a APREN (Associação Portuguesa das Energias Renováveis), segundo o qual o preço de venda no mercado grossista teria sido 88 euros/MWh mais alto se não fosse o contributo das fontes renováveis.

Juntando o feito das tarifas garantidas que cobrem uma boa parte dos contratos de produção eólica em Portugal, e cujo valor (tipicamente acima do mercado em anos normais) foi ultrapassado no mercado grossista, a poupança anual conseguida por via das renováveis chega aos 300 euros na fatura dos domésticos e a 30.000 euros na fatura das empresas, aponta a análise “Impacto da eletricidade de Ordem Renovável” que atualiza um estudo divulgado em setembro do ano passado.

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O contributo das renováveis para baixar o preço de venda da eletricidade resulta de dois fatores. Esta energia tem um custo marginal muito reduzido, ou zero (porque não compra combustíveis nem paga CO2), e faz ofertas no mercado a custos muito inferiores, permitindo baixar o preço final de uma determinada hora ou período quando não é necessário recorrer a energia térmica para satisfazer a procura.

O problema é que num ano marcado por fraca produção eólica e queda na geração hídrica (as duas principais fontes renováveis em Portugal e em Espanha) o mercado ibérico teve de recorrer a centrais a gás natural durante uma boa parte do dia. E nas horas em que isso acontece, é o custo marginal desta tecnologia, mais cara, que marca o preço de toda a energia vendida naquela hora. Isso deve-se à regra do mercado marginalista que Portugal e Espanha querem mudar, pelo menos temporariamente, para acomodar a subida descontrolada do preço do gás natural.

Ainda assim, e quando se faz a conta ao preço médio, as horas em que as renováveis (outras energias menos caras como a nuclear) ditaram o preço do mercado permitiram baixar os preços grossistas. Em números globais, a redução da fatura foi da ordem dos 4,1 mil milhões de euros, poupança que desde 2016 chega aos 10,2 mil milhões de euros, referem as contas da Deloitte.

O outro fator que no caso português permitiu um contributo muito positivo para o custo da compra de energia elétrica foi a existência de contratos de tarifas feed-in (garantidas) com produtores eólicos, ao abrigo da Produção em Regime Especial (PRE). No passado estes contratos, a que muitos associavam a rendas excessivas, penalizaram os preços da energia no sistema elétrico português porque os consumidores eram chamados a pagar nas tarifas de acesso os sobrecustos que resultavam da diferença entre a remuneração contratual e os preços do mercado. Esse movimento inverteu-se no ano passado e passou a sobreganho, com um impacto positivo de 2.639 milhões de euros que é o valor mais alto em dez anos. Isto porque as cotações do Mibel atingiram máximos históricos que aliás continuam a registar-se este ano. Os cálculos da Deloitte indicam um balanço acumulado positivo de quase seis mil milhões de euros na última década.

De acordo com o estudo da Deloitte, o efeito económico positivo destes contratos para o sistema elétrico irá acentuar-se este ano, “uma vez que o preço da energia elétrica previsto para 2022 supera a tarifa garantida média atribuída à PRE”.

De fora desta análise fica o tema dos chamados “lucros caídos do céu” (windfall profits) que alguns produtores renováveis estarão a receber à boleia dos preços recorde alcançados no Mibel (mercado ibérico de eletricidade). Estes lucros acontecem quando a energia renovável é vendida numa hora em que o preço é fixado pelas centrais a gás e que passa a ser o preço de venda de toda eletricidade oferecida naquele período. Considerando que estes produtores renováveis não têm custos com o combustível, nem com o CO2, conseguem nestas horas uma margem muito superior ao gás natural cujo custo de produção fixa o preço.

Bloco quer corte à espanhola dos “ganhos caídos do céu” das elétricas

A regra marginalista tem impedido as renováveis de baixar mais os preços de todo o mercado ibérico que é muito exposto a esta realidade. Espanha avançou no ano passado com um imposto sobre estes lucros extraordinários e esta é uma ferramenta que a Comissão Europeia admite que possa vir a ser usada pelos Estados-membros para obter receitas que permitam subsidiar os consumidores mais vulneráveis ou as empresas mais atingidas pelo acréscimo da fatura elétrica.