O presidente da Tunísia, Kais Saied, dissolveu, esta quarta-feira, o parlamento, oito meses depois de o ter suspendido para assumir plenos poderes, decisão que é vista como um revés democrático no país, berço da “Primavera Árabe”.

Kais Saied anunciou a decisão durante uma reunião do Conselho de Segurança Nacional, horas depois dos deputados terem desafiado a suspensão do parlamento e realizado uma sessão virtual, onde votaram o cancelamento das medidas excecionais implementadas pelo chefe de Estado tunisino.

“Anuncio hoje [quarta-feira], neste momento histórico, a dissolução da Assembleia de Representantes do Povo [parlamento] para preservar o Estado e as suas instituições, para preservar o povo tunisino”, destacou.

Depois de suspender o parlamento eleito e demitir o governo em julho de 2021, o Presidente Saied dissolveu em 5 de fevereiro o CSM, órgão independente criado em 2016 para nomear juízes, a quem acusa de “parcialidade” e de estar sob a influência do partido islamita-conservador Ennahdha, o seu principal inimigo político.

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Em 22 de setembro o chefe de Estado já tinha assumido plenos poderes, através de “medidas excecionais” que prolongavam a suspensão do parlamento e permitiam legislar por decreto, presidir ao Conselho de Ministros e alterar leis.

Esta quarta-feira, 120 deputados tunisinos desafiaram a suspensão do parlamento, organizando uma sessão virtual onde cancelaram as medidas excecionais decididas por Saied em 25 de julho, alegando que está a bloquear o processo democrático e a estabelecer um regime autocrático, numa votação com 116 votos a favor.

Os deputados pediram ainda a organização de eleições legislativas e presidenciais antecipadas, para combater a crise política e socioeconómica.

Durante o discurso a anunciar a dissolução do parlamento, Kais Saied classificou a sessão promovida pelos deputados como “uma tentativa de golpe que fracassou”.

O chefe de Estado tunisino acusou os participantes de “conspirarem contra a segurança do Estado”.

“As nossas forças de segurança militares e civis enfrentarão qualquer uso de violência de acordo com a lei”, alertou.

Além do impasse político, a Tunísia procura sair de uma profunda crise socioeconómica e discute com o Fundo Monetário Internacional a obtenção de um novo empréstimo.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) assegurou esta quarta-feira que as negociações com o governo tunisino para o terceiro empréstimo no espaço de uma década são “frutíferas” e saudou um programa de medidas do governo.

O plano, proposto pela primeira-ministra Nedjla Bouden, “procura compensar os desafios (…) tanto a curto prazo para reduzir as repercussões da guerra na Ucrânia na economia nacional, como a médio prazo para garantir um crescimento mais forte, duradouro e inclusivo, bem como uma melhor cobertura social”.

No início do ano, a Tunísia retomou as negociações com a instituição para tentar obter um empréstimo de 4.000 milhões de dólares (cerca de 3.580 milhões de euros) antes de abril, que lhe permitirá fazer face a uma dívida que já ultrapassa 100% do Produto Interno Bruto.

As exigências do FMI obrigam a um consenso entre sindicatos, patrões e sociedade civil sobre um projeto de longo prazo.