O presidente da Câmara de Comércio de Angra do Heroísmo (CCAH) considerou nesta quarta-feira “pouco claro” o processo das Agendas Mobilizadoras do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) nos Açores, alegando que teve acesso a “pouca informação”.

“Desde o princípio, percebemos que este processo estava a ser conduzido de uma forma muito pouco clara e muito pouco aberta. Nós próprios tínhamos muito pouca informação. Fomos surpreendidos com toda esta situação”, afirmou o presidente da associação empresarial Marcos Couto, numa audição de mais de quatro horas na comissão parlamentar de inquérito à operacionalização agendas mobilizadoras do PRR nos Açores do Parlamento açoriano.

Marcos Couto disse que alertou o presidente do governo regional, José Manuel Bolieiro, e o secretário regional do Emprego, Duarte Freitas, bem o Conselho Económico e Social dos Açores, de que “o processo estava a ser pouco claro, demasiado fechado e opaco e que isso poderia causar problemas”.

Defendeu, por isso, que “devia ser mais aberto e transversal, com o conhecimento geral”.

Segundo o presidente da CCAH, houve uma “entrega clara” do processo por parte do governo regional às “câmaras de comércio”, mas a CCIPD “quis liderar o processo”.

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Marcos Couto disse que a associação empresarial de Ponta Delgada escolheu liderar o consórcio do turismo e que a Federação Agrícola dos Açores afastou a CCAH da liderança da agenda da agroindústria.

“Um ou dois dias antes do fecho das agendas, recebo uma chamada a dizer que a Federação Agrícola não aceitava que a câmara de comércio liderasse a agenda do agroalimentar e que, no máximo, aceitaria se fosse partilhada essa responsabilidade entre a Câmara de Comércio de Angra e a federação agrícola”, avançou, alegando que na sequência disso foi convidada a liderar o consórcio a fábrica de laticínios da ilha Terceira Pronicol.

“Chegámos onde? O que é isto? Estão aqui a brincar com as associações e com as pessoas? Isto é pior do que a República das Bananas”, exclamou.

O presidente da Câmara de Comércio de Angra do Heroísmo alegou ainda que, numa conversa privada com um consultor, o presidente da CCIPD, Mário Fortuna, terá dito: “As agendas são minhas e eu é que mando nisto”.

Questionado pelo PS sobre emails em que adjuntos do secretário regional das Finanças sugeriam à CCIPD a integração de empresas em agendas, e em que convocavam reuniões entre empresas específicas, o governante e os consultores, Marcos Couto disse que “desconhecia na totalidade” o conteúdo da correspondência trocada, assegurando que “em relação à Câmara de Comércio de Angra isso nunca aconteceu”.

“Nunca o governo contactou com a Câmara de Comércio de Angra para introduzir, nem retirar a empresa A, B ou C”, sublinhou.

Acrescentou ser “inegável” que havia “uma grande proximidade” do presidente da associação empresarial de Ponta Delgada com o secretário regional das Finanças e o seu gabinete.

“As reuniões eram, por aquilo que sabíamos, diárias ou quase”, apontou.

Questionado sobre o porquê de as empresas açorianas não terem avançado com candidaturas antes de o executivo açoriano ter contratado as consultoras, o responsável disse que os empresários estavam “à espera da agenda para os Açores”, tendo em conta que tinha sido anunciado que haveria uma verba específica para a região.

“Só muito depois se percebeu que as empresas açorianas concorriam em pé de igualdade com as nacionais”, explicou.

A comissão de inquérito às agendas mobilizadoras foi aprovada por unanimidade no parlamento açoriano em outubro de 2021, depois de vários partidos terem questionado a gestão feita pelo governo regional (PSD/CDS-PP/PPM) às verbas previstas no PRR para o arquipélago ao abrigo daquele programa.

Em causa estava uma verba inicial de 117 milhões de euros, financiada pelo PRR, destinada a projetos de inovação, turismo e agroindústria, a que poderiam candidatar-se as empresas açorianas que apresentassem projetos em consórcio com outros grupos económicos.

Na sequência de críticas ao processo, os consórcios criados nos Açores deixaram cair as propostas, em outubro, a pedido do presidente do governo regional, que disse ter a “garantia” do Governo da República de que a verba destinada à região não estava em causa.