Só Espanha deverá ter um crescimento menor do que Portugal até 2027, entre os países da coesão europeia, avisa o Fórum para a Competitividade a partir de cálculos feitos com base nos últimos dados do FMI. Além de conseguir taxas de crescimento económico menores do que todos esses países, onde se incluem as economias de leste, os dados indicam que Portugal irá crescer menos do que a média da União Europeia, mesmo com os investimentos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

É uma conclusão “muito negativa” aquela que o think tank Fórum para a Competitividade tira da análise que fez às últimas previsões do Fundo Monetário Internacional (FMI), com enfoque no conjunto de países que estão num estágio de desenvolvimento semelhante ao de Portugal, isto é, os chamados países da coesão, que incluem as economias mais pequenas da União Europeia (UE).

O que se conclui é que, além de Portugal divergir da UE na taxa de crescimento calculada entre 2019 e 2027, “só Espanha tem um comportamento pior” do que a economia portuguesa. E mais: no mesmo período, Portugal “cresce menos de metade do que a maioria destes países, alguns dos quais que até já nos ultrapassaram“, atira o Fórum para a Competitividade, organismo liderado por Pedro Ferraz da Costa e cujo gabinete de estudo é encabeçado por Pedro Braz Teixeira.

Crescimento acumulado entre 2019 e 2027. Fonte: FMI/Fórum para a Competitividade

“O mau desempenho português é especialmente grave porque os países de Leste devem ser dos estados mais afetados pela guerra na Ucrânia, dada a sua proximidade e dependência da Rússia”, acrescenta o think tank, na sua mais recente Nota de Conjuntura.

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Quase 94% dos fundos do PRR já pagos foram para setor público

Uma das principais explicações para esta divergência, segundo o Fórum para a Competitividade, está na forma como Portugal está a gastar os fundos do PRR, em contraste com os planos que existem noutros países.

Até ao momento, de acordo com a informação prestada pela Estrutura de Missão “Recuperar Portugal”, que acompanha a execução do PRR, a 6 de abril tinham sido pagos 1.600 milhões de euros da chamada “bazuca” europeia, dos quais apenas 489 milhões já estão nas mãos dos seus “beneficiários diretos e finais”. Ora, desses 489 milhões, quase 94% foram pagos a entidades do setor público.

O argumento do Governo de que, em última instância, os beneficiários são as empresas privadas não colhe, por duas razões: 1) porque, em muitos casos, não é verdade; 2) porque o tipo de empresas privadas beneficiadas indiretamente são, sobretudo, as produtoras de bens não transacionáveis, quando o que precisamos de expandir é o setor transacionável”, afirma o Fórum para a Competitividade.

O think tank afirma que se parece estar a enveredar pela ideia “profundamente errada” de estimular a procura interna. “Se o PRR for um mero estímulo da procura, pode acelerar o processo de atingir o pleno emprego, mas não terá qualquer impacto no aumento do potencial de crescimento da economia“, avisa.

Relembremos que, entre 1995 e 2011, não houve falta de procura, pelo contrário. Nesse período, o que houve foi fraco crescimento e uma explosão da dívida externa que nos levou à troika. Como é que se pode pensar que um PRR dirigido em mais de 90% ao sector público, que apenas representa cerca de 15% do emprego, pode servir para acelerar o crescimento e convergir com a UE? Por tudo isto, insistimos na necessidade de os novos fundos do PRR corrigirem este problema”, diz o Fórum para a Competitivadade.

“Orçamento de Estado para 2022 traz austeridade para as famílias”

É “muito difícil de compreender“, acrescenta o Fórum para a Competitividade, que o Orçamento do Estado para 2022 não tenha atualizado as tabelas de IRS à nova estimativa para a inflação. Ou seja, os escalões propostos na proposta que foi apresentada em outubro (e foi chumbada) voltaram a ser propostos nesta última proposta exatamente nos mesmos termos, apesar de a previsão para a inflação ter mais que quadruplicado (para 3,7%, ou 4% no caso do índice harmonizado a nível europeu).

think tank critica que os patamares de rendimento em cada escalão não tenham sido atualizados à inflação estimada pelo Governo para o conjunto do ano – uma estimativa, aliás, que o Fórum para a Competitividade considera ser “demasiado otimista“. A inflação “acelerou fortemente” de 5,3% para 7,2% em abril, segundo o INE, “aproximando-se muito da da zona euro e deixando de ser uma das mais baixas da união monetária”.

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“Além disso, a inflação subjacente [que exclui os preços dos alimentos frescos e da energia]passou de 3,8% para 5,0%, ficando ainda mais superior ao indicador equivalente dos nossos parceiros, o que não é nada tranquilizador”, nota o Fórum para a Competitividade, acrescentando que “quando amainar o problema dos preços da energia, há tendência para Portugal ficar com inflação mais elevada do que na zona euro, o que será mau para a competitividade”.

Fazendo uma simulação simples, se os preços já não subissem mais até ao final do ano, a inflação média de 2022 seria de 6,1%. No entanto, não é de excluir que, com uma eventual estabilização da situação na Ucrânia, se possa assistir a uma queda significativa dos preços energéticos e, assim, em menor grau, da própria inflação. No entanto, para se atingir o valor de 3,7% previsto no Orçamento para 2022, a inflação mensal teria que ser, em média, negativa em 0,8% entre Maio e Dezembro, o que é extremamente inverosímil”, diz o Fórum para a Competitividade.

Quanto ao Orçamento do Estado em si, o think tank considera que “é insuficiente no curto prazo” e não tem uma estratégia de médio prazo, de colocar Portugal a convergir com a UE, quando o crescimento económico é a melhor forma de diminuir o rácio da dívida”.

Para já, o desempenho da economia surpreendeu pela positiva, com o INE a estimar na sexta-feira que o produto interno bruto (PIB) saltou 2,6% no primeiro trimestre. Porém, segundo o Fórum para a Competitividade, “estes resultados, melhores do que o esperado, não deverão ser extrapolados para o resto do ano”.

Nos próximos trimestres “deverá haver desaceleração, devido à deterioração internacional, às ajudas orçamentais muito limitadas e inflação em forte aceleração”, remata o think tank.

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