A justiça francesa abriu uma investigação contra o presidente da Interpol, Ahmed Nasser al-Raisi, no final de março, por “cumplicidade em tortura”, após uma queixa de dois britânicos, disseram esta quarta-feira à AFP fontes ligadas ao processo.

Segundo a agência noticiosa francesa, a Procuradoria Nacional Antiterrorismo (PNAT) confirmou que atribuiu uma investigação a um magistrado da instrução parisiense após uma queixa de tortura e “detenção arbitrária” em 2018 e 2019.

Em comunicado, os dois britânicos disseram que iriam apresentar esta quarta-feira provas da tortura de que acusam Al-Raisi, dos Emirados Árabes Unidos (EAU), numa audiência “a pedido de um juiz de instrução” da unidade especializada em crimes contra a humanidade da PNAT.

O major-general Ahmed Nasser al-Raisi, um oficial superior da polícia dos EAU, já estava a ser alvo de uma investigação preliminar do PNAT por outras acusações de tortura.

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Al-Raisi foi eleito para a função essencialmente honorífica de presidente da Interpol em novembro de 2021, para consternação de defensores dos direitos humanos.

A Interpol é liderada por um secretário-geral, cargo que é desempenhado pelo alemão Jürgen Stock, cujo mandato de cinco anos foi renovado em 2019, pela Assembleia Geral da organização internacional de polícia criminal.

Um dos queixosos no novo processo, Matthew Hedges, é um estudante de doutoramento na Universidade de Durham e o outro, Ali Issa Ahmad, um segurança de Wolverhampton, em Inglaterra, segundo a AFP.

Numa conferência de imprensa em outubro de 2021, na cidade francesa de Lyon, sede da Interpol, Hedges denunciou que foi acusado de espionagem durante uma viagem de estudo aos EAU.

Disse que foi detido e torturado entre maio e novembro de 2018, e “forçado a fazer falsas confissões”.

Condenado a prisão perpétua em novembro de 2018, foi indultado menos de uma semana depois sob pressão internacional.

Na mesma conferência, Ali Issa Ahmad relatou ter sido espancado e esfaqueado durante um mês de detenção entre janeiro e fevereiro de 2019, no emirado de Sharjah, um dos sete que constituem os EAU.

Ahmad disse na altura que foi acusado de apoiar a equipa de futebol do Qatar demasiado ostensivamente num jogo da Taça Asiática com uma t-shirt com a bandeira daquele país rival dos EAU.

A investigação preliminar que já estava em curso no PNAT foi iniciada após uma queixa de “tortura e atos bárbaros” apresentada pela organização não-governamental (ONG) Centro do Golfo para os Direitos Humanos sobre o destino de Ahmed Mansoor, um dos principais defensores dos direitos humanos nos EAU.

A ONG excluiu da eventual imunidade de Al-Raisi o facto de continuar a exercer funções policiais em Abu Dhabi, onde Ahmed Mansoor continuaria detido.

Al-Raisi seria, segundo a ONG, um dos responsáveis pelas torturas, um motivo de retirada da imunidade diplomática, do qual beneficia conforme o acordo, de 2008, que rege as relações entre a França e a Interpol, organização da qual acolhe a sede.

Em janeiro de 2020, o Ministério dos Negócios Estrangeiros dos EAU rejeitou as alegações “sem fundamento” feitas pela ONG sobre o destino de Mansoor.