Dmitri faz parte de uma brigada de elite do exército russo que esteve a combater na Ucrânia, depois de ter entrado no país vindo da Bielorrússia, no início da invasão. Atualmente numa base militar em Belgorod, cidade russa perto da fronteira ucraniana, foi informado de que será novamente enviado para combater — mas, neste momento, recusa-se a fazê-lo. E, como ele, outros colegas terão a mesma posição.

“Muitos de nós simplesmente não querem regressar. Quero voltar para a minha família e não quero voltar num caixão”, disse Dmitri. Este não é o verdadeiro nome do soldado, que o jornal The Guardian decidiu não divulgar para proteger a sua identidade. Mas é esta a situação de Dmitri e de oito dos seus camaradas, que informaram os comandantes de que não tencionam voltar a combater na Ucrânia. “Eles ficaram furiosos. Mas finalmente lá se acalmaram, porque não podiam fazer grande coisa.”

O caso da brigada de Dmitri não é o único. A edição russa da BBC também deu a conhecer o caso de Sergey Bokov, um soldado de 21 anos que passou 37 dias a combater na Ucrânia e que em abril foi enviado de volta para a Rússia, também para uma zona próxima da fronteira, com ordens para voltar a zona de combate em breve. “Se quiserem, julguem-nos, façam o que quiserem, não vamos mais para a guerra”, assegurou à BBC.

A Conflict Intelligence Team, um coletivo de investigação de bloggers russos, estima neste momento que entre 20% a 40% dos soldados russos que estiveram colocados em Kiev, Chernihiv e Sumy e que entretanto regressaram à Rússia, estarão a recusar voltar a combater na guerra da Ucrânia.

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Também Mikhail Benyash, advogado, garante ao Guardian que tem sido contactado por “centenas e centenas” de soldados que o procuram para pedir aconselhamento jurídico sobre situações semelhantes. Benyash diz que entre eles estão 12 membros da guarda nacional da cidade russa de Krasnodar, que foram demitidos por recusarem ir para a Ucrânia.

Os comandantes tentam ameaçar os soldados com temporadas detidos, mas nós dizemos aos soldados que eles podem simplesmente recusar”, explica o advogado.

Porquê? Porque, não tendo a Rússia feito nenhuma declaração de guerra formal à Ucrânia, “não há base legal para abrir um processo criminal se um soldado recusar lutar [fora] quando está colocado em território russo”. Podem, sim, ser despedidos do exército.

Isso não impede o exército russo de continuar a ameaçar os soldados que recusam ir para a linha da frente. Sergey Bokov contou à BBC que soube do caso de 20 mercenários que abandonaram a base militar russa para onde toda a sua companhia foi transferida. Os comandantes disseram aos seus soldados que, se fizessem o mesmo, seriam detidos, acusados e enfrentariam uma pena de 10 anos de prisão. “Isso afinal não era verdade, mas eu não sabia isso à altura. Não queria ir, morrer e matar. Mas também não queria ir para a prisão”, resume o soldado.

Caso a Rússia venha a declarar guerra, a situação alterar-se-á para todos estes soldados. “Em tempo de guerra, as regras são completamente diferentes. As recusas têm penalizações muito mais pesadas e eles enfrentariam algum tempo na prisão”, explica Mikhail Benyash.