Foram mais conferências do que imaginaria no início da época, não foram tantas conferências como podia pensar quando entrou a meio da época, foi a última conferência por decisão própria no final da época. Se a convocatória do Benfica para a deslocação a Paços de Ferreira já soava a despedida, no caso do treinador Nelson Veríssimo era mesmo uma despedida. Da equipa principal dos encarnados, da estrutura, do clube. No entanto, e para ele, não haverá duas sem três. E, com aquilo não conseguiu agora, à terceira será de vez. Por isso, a derradeira antevisão funcionou sobretudo como balanço de tudo o que conseguiu e falhou ao longo dos meses em que substituiu o despedido Jorge Jesus no final de dezembro até meio de maio.

P. Ferreira-Benfica. Helton Leite defende remate de Ferreira (0-1, 15′)

“Custa, é a segunda vez que passo por esta cadeira de sonho, mas sei que no futuro esta porta voltará a abrir-se. Em dezembro, a equipa estava a jogar de uma forma diferente e fizemos as alterações que achámos que devíamos fazer. Não é fácil fazer alterações com o Campeonato a decorrer, é natural que a equipa não desse uma resposta efetiva logo nos primeiros jogos mas fizemo-lo com consciência que isso podia acontecer. Acredito que num futuro próximo essa janela vai abrir-se novamente”, explicou o futuro antigo treinador do Benfica, antes de detalhar aquilo que poderia ser melhor e as ilações positivas a retirar.

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“Há momentos mais marcantes do que outros. Não foi uma missão bem conseguida porque não conquistámos qualquer título mas a perspetiva é olhar para o copo meio cheio e perceber que esta equipa fez coisas interessantes esta época. Na Liga dos Campeões a equipa deu sempre uma resposta muito positiva, deixámos uma boa imagem nas competições europeias. Ao nível interno o objetivo seria chegar ao primeiro lugar, depois o apuramento direto para a Champions, também não conseguimos. Foi um falhanço em que não conseguimos conquistar qualquer título mas houve coisas boas: marcámos consecutivamente durante quatro meses, houve jogadores que acabaram por crescer ainda mais”, salientou antes de um jogo onde apostava na vitória para terminar da melhor forma a época mesmo com várias mexidas na equipa.

Mas, afinal, o que sobra de mais uma época de desilusão para os encarnados (que não ganham qualquer troféu desde agosto de 2019)? Que legado vai o novo treinador Roger Schmidt receber no verão?

  1. Um plantel que vai sofrer uma enorme revolução depois de um ciclo falhado que aumentou a folha salarial da equipa sobretudo a partir de 2020/21 (o ano da aposta em Jesus e 100 milhões de euros em contratações), que não teve resultados desportivos, que revelou carências em algumas posições mas que noutros setores acabou por tapar em parte o aparecimento de jogadores da formação;
  2. Uma estrutura que irá também mudar de forma radical, com todo o futebol entregue a Rui Costa e Lourenço Pereira Coelho e mudanças que são extensíveis não só ao plantel mas também ao staff que acompanha a equipa mais de perto, ao departamento médico e ainda à comunicação;
  3. Uma concorrência que trocou de ordem na classificação, desta vez com o FC Porto a sagrar-se campeão e o Sporting a ficar na segunda posição, que em princípio deverá contar com as mesmas equipas técnicas e que não deverá perder as bases da equipa consolidadas nas últimas épocas;
  4. Uma formação que viu o trabalho desenvolvido “reconhecido” com o inédito título na Youth League e que não só apresenta nesta fase as melhores equipas iniciais dos Sub-19 para cima (pelas bases criadas antes e pelo recrutamento, como aconteceu com Tiago Gouveia que era o melhor elemento do Sub-15 do Sporting mas rumou ao Seixal) mas também vários jogadores com potencial para o plantel;
  5. Um clube que, no plano institucional, apesar das eleições que se seguiram à demissão de Luís Filipe Vieira no âmbito da operação Cartão Vermelho, ainda não estabilizou em definitivo também pelas aparições (que foram adiadas esta semana) do antigo líder dos encarnados e das suas declarações.

Este é o cenário que o alemão irá encontrar quando viver a primeira experiência em Portugal e na Luz. No entanto, e para já, parte do futuro é escrito no presente e nas opções que poderão ser chamadas por Roger Schmidt para fazer pelo menos a pré-temporada com o plantel dos encarnados, com Veríssimo a dar minutos a mais jogadores da formação ou com menor utilização para se “mostrarem”. Assim, comparando com a equipa que perdeu com o FC Porto na Luz, saíram Vlachodimos, Otamendi, Vertonghen, Grimaldo, Weigl, Taarabt, Gonçalo Ramos, Lázaro e Darwin Núñez para as entradas de Helton Leite, Morato, Tiago Araújo, Sandro Cruz, Meïté, Paulo Bernardo, Tiago Gouveia, João Mário e Henrique Araújo. Há quase dois anos que o Benfica não apresentava tantos portugueses no onze, cinco saídos da formação do clube.

Tiago Gouveia teve bons apontamentos, Sandro Cruz arriscou menos no plano ofensivo mas foi melhor a defender, Tiago Araújo não cometeu erros, Martim Neto e Diego Moreira ainda tiveram a oportunidade de fazerem o primeiro jogo pela equipa principal depois de terem sido campeões da Youth League. Contudo, o grande destaque foi de forma inevitável Henrique Araújo, um “matador” com características diferentes de João Félix ou Gonçalo Ramos mas que voltou a mostrar que é de facto um jogador à parte nesta fase de evolução aos 20 anos e com um perfil raro no futebol nacional. Essa foi a melhor notícia de todas para Roger Schmidt. Esse será também um dos maiores desafios de Roger Schmidt: a qualidade dos mais novos está lá, as oportunidades é que só chegaram quando pouco contava. E na próxima época?

Ficha de jogo

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P. Ferreira-Benfica, 0-2

34.ª jornada da Primeira Liga

Estádio Capital do Móvel, em Paços de Ferreira

Árbitro: Hugo Silva (AF Santarém)

P. Ferreira: André Ferreira; Delgado, Marco Baixinho, Pedro Ganchas (Nuno Lima, 65′), Fernando Fonseca (Bastos, 77′); Luiz Carlos, Rui Pires; Hélder Ferreira, Gaitán (Edmilson Mendes, 88′), Lucas Silva (Matchoi, 77′) e Butzke (Deni Jr., 65′)

Suplentes não utilizados: Jeimes, Ibrahim, Pio e Maga

Treinador: César Peixoto

Benfica: Helton Leite; Gilberto (Diogo Gonçalves, 69′), Tomás Araújo, Morato, Sandro Cruz; Meïté, Paulo Bernardo (Taarabt, 82′), João Mário (Martim Neto, 69′); Gil Dias, Tiago Gouveia (Diego Moreira, 69′) e Henrique Araújo (Yaremchuk, 74′)

Suplentes não utilizados: Svilar, Kokubo, Vertonghen e André Almeida

Treinador: Nelson Veríssimo

Golos: Henrique Araújo (4′ e 44′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Gilberto (53′) e Fernando Fonseca (57′)

O encontro começou praticamente com o primeiro golo, com demérito dos visitados e muito mérito dos visitantes: Juan Delgado perdeu a bola em zona comprometedora para Tiago Gouveia, o extremo avançou em posse, respeitou a diagonal feita no Henrique Araújo na área e assistiu bem o avançado para o remate de pé esquerdo cruzado que fez o 1-0 (4′). Em 62 minutos na Liga, o madeirense marcava o segundo golo na equipa principal dos encarnados. No entanto, e apesar de tudo aquilo que esse momento poderia conferir ao conjunto de Nelson Veríssimo, André Ferreira ficaria largos minutos como mero espectador.

Aos poucos, os pacenses foram tendo outra capacidade de chegar ao último terço, aproveitando sempre os corredores laterais para criarem superioridade e procurarem situações de finalização na área. O Benfica até tinha por vezes espaço para sair em transições mas sem que o meio-campo conseguisse saltar essa linha de pressão adversária e foi Helton Leite a manter a vantagem dos encarnados: depois de um remate de Hélder Ferreira que não parecia muito perigoso mas ainda assustou (15′), o brasileiro promovido a capitão pela primeira vez conseguiu salvar com uma palmada de recurso à última o empate de Gaitán (22′) e fez de seguida uma grande defesa a nova tentativa de Hélder Ferreira com a bola a sair para canto (27′).

O P. Ferreira tinha mais posse, mais remate e mais jogo no meio-campo adversário mas os adeptos das águias, como que queimando os últimos cartuchos da época, não deixavam de apoiar a equipa quase que dando o mote já para a próxima temporada. Foi assim, ao som de cânticos das duas bancadas com mais benfiquistas no Estádio Capital do Móvel, que um possível empate se transformou em 2-0: Gaitán teve uma jogada fantástica com Hélder Ferreira, o extremo tentou picar a bola por cima de Helton Leite que conseguiu de novo melhor e, na saída para o ataque, já depois de uma defesa de André Ferreira a remate de Tiago Gouveia, Gil Dias cruzou ao segundo poste para o desvio de Henrique Araújo de pé esquerdo (44′).

O segundo tempo começou sem alterações nas equipas a nível de jogadores mas com mexidas nas equipas a nível de qualidade. Mexidas e para pior. Apesar de o P. Ferreira continuar a tentar procurar o golo que lhe permitisse reentrar nas contas do jogo, nunca conseguiu criar oportunidades de real perigo como tinha acontecido até ao intervalo. Apesar de o Benfica continuar a ter boas chances de saída em transição para jogada com finalização, e mesmo entre a vontade manifesta de Henrique Araújo em chegar ao hat-trick, a defesa pacense foi conseguindo travar os ataques encarnados sem defesas de André Ferreira.

Assim se passaram 25 minutos de futebol até chegar o período das substituições que poderia ter o condão de mexer com aquilo que se estava a jogar, sobretudo do lado do Benfica com as entradas de mais dois estreantes vencedores da Youth League, Martim Neto e Diego Moreira. Não existiu propriamente um nexo de causalidade mas as hipóteses de golo voltaram a aparecer: Paulo Bernardo rematou rasteiro muito perto do poste da baliza de André Ferreira (68′), Deni Jr. foi lançado por Gaitán mas perdeu o duelo com Helton Leite isolado na área (77′), André Ferreira tirou a Diego Moreira a hipótese de uma estreia de sonho (86′) e travou ainda uma oportunidade de Yaremchuk após assistência de Martim Neto (90+2′). Chegava ao fim uma época que, no plano nacional, não deverá ser para esquecer mas sim para a aprender.