Andou de charuto, dançou no balneário, levou banho de todos, ouviu a música do seu nome cantada pelos seus. Sérgio Conceição mostrou bem após a vitória na Luz frente ao Benfica que valeu a conquista do 30.º Campeonato do FC Porto (o seu sexto, três como jogador e outros tantos como treinador) a relação próxima que tem com o plantel, dos que jogam mais aos que têm menos minutos. No entanto, e como sempre frisou, há tempo para tudo. E com ou sem título, com ou sem hipótese de bater mais recordes na Liga, com ou sem possibilidade de fazer mais, um jogo oficial é sempre um jogo oficial. Sem “mas”, sem “borlas”.

FC Porto-Estoril. Evanilson acerta na trave (1-0, 54′)

“Não sou de dar rebuçados a ninguém mas vamos ver. Faz parte da estratégia para o jogo. Os quatro jogadores que não são campeões, porque não têm nenhum minuto, não fica muito difícil de ver o que vai acontecer amanhã… [sábado]”, tinha comentado na conferência de imprensa antes da receção ao Estoril. “A festa é depois do jogo. Preparámos este encontro com o espírito de muitos outros, em cima de vitórias, o que é mais agradável. Sermos já campeões não invalida a forma como temos de entrar, não a pensar em recordes mas com o foco na nossa tarefa nos 90 minutos para ganhar três pontos”, acrescentou.

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No entanto, e mais do que em qualquer outro espaço de perguntas e resposta com o técnico, Conceição foi fazendo quase um balanço da temporada e dos cinco anos no comando dos dragões, da evolução que teve como treinador à capacidade de tirar o melhor dos jogadores passando ainda pelo futebol jogado.

“Se a qualidade do jogador não estiver lá é difícil de mexer com ele. A equipa técnica é muito exigente no trabalho diário. Um jogador se for treinar e fizer quanto baste é suficiente mas para nós não serve. Temos de trabalhar no campo. E toda essa crença que eles têm na nossa mensagem, no que podem fazer, tudo junto faz com que subam de produção. Há outros que não conseguem. Temos conseguido elevar o nível da maior parte dos jogadores mas isso tem a ver com o trabalho. Evolução? Tem a ver com o meu percurso, com os diferentes grupos que vou apanhando, com o trabalho individual com os jogadores. E dentro disso perceber que sou apaixonado pelo que faço e muito dedicado ao trabalho. As coisas têm corrido bem nesse sentido, temos conseguido juntar a valorização dos jogadores aos títulos, mas continuo com o meu trabalho e nesta aprendizagem contínua que tenho de ter”, salientou o técnico dos azuis e brancos.

“Melhor plantel? O melhor plantel em que sentido? Em qualidade de jogo, individualmente? É difícil responder a isso. O meu primeiro ano tinha só o Casillas, o Maxi [Pereira], o Brahimi, o Herrera, o Aboubakar, o Otávio, que ainda anda por aí… Mais do que a qualidade individual é olhar para eles e ver o que podemos fazer com estes jogadores. Vitinha, João Mário, Francisco [Conceição], muita gente da formação que no início da época poucos acreditavam que estariam aqui. O futebol mais agradável? Depende de muita coisa. Depende do gosto de cada um. Muitas pessoas gostavam de ver o Barcelona e eu adormecia…”, comentou ainda sobre a possibilidade de esta ser a sua melhor versão do FC Porto.

Só houve mesmo dois aspetos em que o técnico teve menos palavras ou “fintou” a pergunta como fazia nos tempos de jogador como ala. “Continuidade? Fiquei sem palavras porque bebi duas ou três cervejas…”, disse sobre os pedidos para ficar no Dragão, antes de reforçar que continua apenas focado nos encontros até ao final da época. “Maior pontuação? Olho para recordes com prazer e orgulho pelo que conseguimos. Nos anos em que fizemos 85 pontos e em que não fomos campeões, fica uma palavra para os nossos rivais, Benfica e Sporting, equipas muito fortes, que vêm valorizar as nossas conquistas. Esses números e vitórias são importantes quando se atinge os títulos. Mas preferia ter 79 e ser campeão”, frisou.

Na despedida, o FC Porto voltou a ser FC Porto. Bateu mais um recorde de pontos no Campeonato, fez mais dois golos que lhe permitiram acabar com o melhor ataque dos últimos 23 anos (além de ter a melhor defesa) e selou da melhor maneira o título com um jogador em especial destaque, Otávio. E quando se pensa em toda a trajetória de Sérgio Conceição, o internacional português é o melhor exemplo do trabalho que o técnico conseguiu desenvolver ao longo de cinco anos. O miúdo com ginga, com muita técnica mas que de quando em vez desligava e era irregular tornou-se uma máquina completa em todo o campo.

A primeira parte foi talvez os 45 minutos da época no Dragão com menos volume ofensivo dos dragões e com menos chegadas ao último terço do adversário, contrariando a ideia de que o título resolvido e toda a qualidade de jogo do Estoril poderiam proporcionar um grande encontro de futebol. Com isso, foi preciso esperar 18 minutos para haver um remate potencialmente perigoso a uma das balizas, com Taremi a surgir descaído na esquerda a receber um assistência e calcanhar de Otávio para rematar tão em arco que a bola saiu pela linha lateral. Pouco depois, Vitinha teve o primeiro tiro enquadrado do jogo mas a meia distância ficou nas mãos de Thiago Silva (22′). Havia alguns pormenores individuais deliciosos como um toque de calcanhar de Evanilson que deixou Raúl Silva no chão mas o último passe teimava em não entrar. 

Otávio estava inspirado na construção de jogo, Vitinha tentava fazer variações rápidas para deslocar toda a defesa contrária mas só mesmo nos cinco minutos antes do intervalo regressaram os motivos de interesse perto das balizas ainda que sem golos: Taremi desviou de cabeça por cima um cruzamento da direita de Otávio após bom trabalho individual (40′), Ferraresi tentou fazer um chapéu na sequência de uma bola parada que Cláudio Ramos não conseguiu desviar mas atirou muito por cima (43′), Mboula conseguiu ganhar espaço para visar a baliza na área portista mas Zaidu tirou perto da linha (44′), Grujic rematou muito ao lado de pé esquerdo na saída rápida dos azuis e brancos (45′). Algo teria de mudar no jogo.

Sérgio Conceição teve durante alguns minutos Fábio Vieira, Francisco Conceição e Galeno em aquecimento mas preferiu apenas corrigir posicionamentos e pedir outra intensidade ofensiva que tinha faltado. Pouco mais de dois minutos depois, teve a recompensa: Pepe ganhou uma bola ainda no meio-campo contrário, a equipa conseguiu fazer uma jogada de envolvimento em progressão com Taremi a lançar Zaidu na esquerda e o cruzamento tenso foi desviado por Joãozinho para a própria baliza com Evanilson nas costas (48′). O marcador estava aberto, o encontro estava desbloqueado. E já depois de um remate com perigo de Arthur que ficou nas malhas laterais após bater num defesa portista, Evanilson aproveitou uma segunda bola perdida na área para tentar colocar tanto o remate que acertou na trave da baliza de Thiago Silva (54′).

Começavam os períodos de substituições, com Sérgio Conceição a tirar Vitinha e Evanilson para lançar Francisco Conceição e Fábio Vieira. O FC Porto voltava ao 4x3x3, ganhava outra largura nas alas e colocava Otávio como um ‘8’ a ter a bola que Vitinha conseguira enquanto esteve em campo. A posição ficou tão bem ou melhor ocupada, com o Estoril sem capacidade para pressionar essa zona de construção e o número 25 a abrir o livro com uma assistência para Taremi acertar de cabeça no poste (64′). Estava dado o mote para os azuis e brancos assumirem em definitivo o assalto à baliza contrária em busca do segundo golo, que não aconteceu porque Thiago Silva defendeu os remates de Francisco Conceição (65′) e Fábio Vieira (68′).

O encontro caminhava para os minutos finais sem que o FC Porto conseguisse dar continuidade a esse fôlego ofensivo que parecia deixar o 2-0 como uma mera questão de tempo e com o Estoril a ameaçar até o empate num remate ao segundo poste de Mboula que Cláudio Ramos desviou de forma acrobática para canto (74′). Rúben Semedo e Fernando Andrade (e depois Meixedo) tiveram ainda oportunidade de entrar em campo para serem campeões e o avançado conseguiria deixar marca no final da partida, demorando apenas quatro minutos para receber uma assistência de Francisco Conceição, rematar de primeira para o 2-0 e não aguentar as lágrimas antes de ir dedicar o golo a Sérgio Conceição (88′).