O ministro dos Negócios Estrangeiros garantiu este sábado que Portugal poderia “fechar amanhã a torneira do gás ou do petróleo russo”, quando a União Europeia (UE) tenta negociar um embargo energético à Rússia, acreditando num acordo nas próximas semanas. Já sobre a duração da guerra na Ucrânia, Gomes Cravinho admite que guerra se arraste mas prevê “derrota estratégica” da Rússia.

“Aquilo que está a dificultar não é nada do campo político, mas sim do campo técnico e económico [porque] há uma assimetria de impacto das sanções. Portugal, por exemplo, não teria nenhuma dificuldade em fechar amanhã a torneira do gás ou do petróleo russo, [mas] outros países têm uma dependência, muito em particular a Hungria, mas também a Eslováquia e a Bulgária têm dificuldades”, declarou João Gomes Cravinho.

Falando no final da reunião informal dos ministros dos Negócios Estrangeiros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), em Berlim, o chefe da diplomacia portuguesa explicou que “esses países [mais dependentes] pedem apoios, pedem períodos transitórios, pedem que haja, da parte da Comissão Europeia, um investimento forte no desenvolvimento de outras soluções, nomeadamente gasodutos, oleodutos e isso, naturalmente, não se faz de um momento para o outro”.

De acordo com João Gomes Cravinho, ao nível dos Estados-membros, “as discussões continuam, mas o objetivo é partilhado por todos, que é o de cortar a dependência europeia dos combustíveis fósseis vindos da Rússia”.

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Já quando questionado sobre prazos para os 27 chegarem a acordo sobre aquele que é o sexto pacote de sanções à Rússia, apresentado pela Comissão Europeia no início de maio, o governante estimou que, “durante o próximo par de semanas, em princípio, haja soluções que satisfaçam a todos”.

“Estamos todos unidos quanto àquilo que é o objetivo de fundo, que é o de reduzir e eliminar a dependência do petróleo e do gás”, vincou João Gomes Cravinho, rejeitando que este novo pacote de medidas restritivas seja suavizado.

“Qualquer que seja a solução, o pacote terá seguramente um impacto muito significativo para a economia russa e para a capacidade russa de alimentar a sua máquina de guerra”, adiantou João Gomes Cravinho.

Em causa está um sexto e novo pacote de sanções contra Moscovo devido à invasão da Ucrânia, no final de fevereiro passado, após a Comissão Europeia ter abrangido, no anterior conjunto de medidas restritivas, a proibição da importação de carvão.

O pacote mais recente, apresentado por Bruxelas há duas semanas, prevê uma proibição total de importação de todo o petróleo russo, marítimo e por oleoduto, bruto e refinado, para assim haver uma eliminação gradual da dependência energética europeia face à Rússia, que permita assegurar rotas de abastecimento alternativas e minimizar o impacto nos mercados globais.

Ainda assim, este sexto pacote de sanções à Rússia, centrado na proibição gradual das importações de petróleo pelos Estados-membros até final do corrente ano, prevê uma derrogação de um ano suplementar para Hungria e Eslováquia.

A Hungria já veio rejeitar a proposta de um embargo progressivo da UE ao petróleo russo nos termos propostos pela Comissão Europeia, alegando que põe em causa a segurança energética do país.

A guerra na Ucrânia expôs a excessiva dependência energética da UE face à Rússia, que é responsável por cerca de 45% das importações de gás europeias. A Rússia também fornece 25% do petróleo e 45% do carvão importado pela UE.

Sobre o conflito, acreditando que a Ucrânia pode vencer a guerra, Gomes Cravinho frisa o “gravíssimo erro” de Putin na invasão.

“Por um lado, tornou-se claro que a Rússia não tem capacidade para conquistar os seus objetivos a curto prazo e sem custos elevadíssimos e isso é positivo, mas por outro lado, sabemos também que a Rússia tem uma capacidade militar que torna extremamente difícil que as forças ucranianas consigam repelir, no curto prazo, forças invasoras da Rússia e, portanto, a nossa expectativa neste momento é que isto pode durar na medida em que nenhuma das partes tem capacidade militar para resolver a situação num prazo curto”, disse João Gomes Cravinho que frisa a hipótese da vitória ucraniana.

“Acredito, acredito. Quando falamos de vencer ou perder uma guerra, não são conceitos simples, [porque] pode haver uma situação em que um lado até tem algum ganho territorial, mas a um custo tão elevado que, efetivamente, constitui uma derrota e aquilo que é fundamental é que a Rússia tenha aqui uma derrota estratégica, o que significa que qualquer avanço que possa ter tem um custo tão elevado que nunca o faria se soubesse de antemão o custo”, argumentou João Gomes Cravinho.

De acordo com o ministro português, “também é derrota estratégica se a Rússia não consegue alterar as fronteiras por via da força”.

“É, creio que para todos, muito visível que houve aqui um gravíssimo erro” do Presidente russo, Vladimir Putin, disse o ministro, acrescentando: “Um erro de cálculo e também na metodologia escolhida para resolver as dificuldades com a vizinhança, e esse erro paga-se muito caro”.

Reforçando que “a Rússia está a caminho de uma dura derrota estratégica”, o chefe da diplomacia portuguesa adiantou que, depois disso, a NATO “voltará a falar” com Moscovo, “num quadro em que se tornou evidente que não se pode voltar a repetir este tipo de comportamento internacional”.

Assim, a Aliança Atlântica pretende “estabelecer um diálogo com a Rússia”, mas sem “permitir absolutamente qualquer ganho de causa, qualquer tipo de expansão territorial, qualquer tipo de vantagem conquistada pela força” e visando ainda salvaguardar “condições para que os vizinhos da Rússia se sintam absolutamente seguros”, concluiu João Gomes Cravinho.

Cravinho destaca “boa base de otimismo” contra divergências no alargamento da NATO

O ministro dos Negócios Estrangeiros português destacou ainda este domingo a existência de uma “boa base de otimismo” relativamente à adesão da Finlândia e Suécia à NATO, que permitirá resolver as “questões em aberto”, nomeadamente as divergências apontadas pela Turquia.

“Penso que há uma boa base de otimismo [porque] todos nós estamos conscientes de que divergências que possam existir são sempre pequenas face àquilo que é verdadeiramente importante, que é o reforço da Aliança e o reforço da segurança da Finlândia e da Suécia”, declarou João Gomes Cravinho.

O chefe da diplomacia portuguesa realçou que “a Turquia, a Finlândia e a Suécia estão num processo de diálogo para resolver as divergências”, após Ancara se ter mostrado reticente face ao alargamento da Aliança Atlântica.

“Aquilo que aconteceu este domingo foi uma repetição, já entre nós — a 30 [e sem os chefes da diplomacia finlandesa e sueca] –, do apoio fortíssimo em relação à adesão da Finlândia e da Suécia e a própria Turquia diz que tem como objetivo que a Finlândia e a Suécia possam entrar, mas tem algumas preocupações e a Finlândia e a Suécia saberão como resolver as questões em aberto”, adiantou João Gomes Cravinho, em declarações aos jornalistas portugueses.

Para permitir a adesão da Finlândia e da Suécia à NATO, é necessário o aval dos 30 membros da Aliança Atlântica.

Na véspera da reunião na capital alemã, o Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, manifestou-se desfavorável à entrada da Finlândia e da Suécia na NATO, por acolherem militantes curdos que a Turquia considera como terroristas.

Foi a primeira voz dissonante no seio dos 30 aliados a propósito desta matéria.

A entrada de um novo Estado-membro na NATO requer unanimidade, o que significa que a Turquia poderá bloquear a adesão dos dois países escandinavos, cuja candidatura deverá ser formalizada nos próximos dias.

Porém, já no sábado, o porta-voz de Recep Tayyip Erdogan veio garantir que a Turquia “não fecha a porta” à entrada destes dois países nórdicos na Aliança Atlântica.

Na sequência da guerra na Ucrânia, a Finlândia e a Suécia iniciaram um debate sobre a adesão à NATO, que, a concretizar-se, significará o abandono da histórica posição de não-alinhamento dos dois países.

A Rússia, que partilha 1.340 quilómetros de fronteira terrestre com a Finlândia e uma fronteira marítima com a Suécia, avisou que será forçada a tomar medidas de retaliação se Helsínquia aderir à NATO.