O Millennium BCP fechou o primeiro trimestre com lucros de 112,9 milhões de euros, quase duplicando o resultado do período homólogo (que tinha sido de 57,8 milhões). Ainda assim, as imparidades relacionadas com o problema dos créditos em francos suíços na Polónia continuam a castigar o banco – só neste trimestre essas perdas (potenciais) foram superiores aos resultados consolidados do grupo, superando os 123 milhões de euros.

Excluindo esse efeito das compensações que o BCP tem sido obrigado a dar aos clientes na Polónia, o resultado líquido do BCP teria subido para 174,6 milhões de euros. Este é um tema antigo, mas só nos últimos anos começou a haver uma maior necessidade de aprovisionar estas perdas porque as decisões judiciais começaram a ir mais no sentido de dar razão aos clientes, que tinham contraído empréstimos bancários indexados ao franco suíço que levaram a que as dívidas das famílias com esses empréstimos aumentassem aquando da valorização do franco suíço face à moeda local, o zloty.

Estas provisões continuam a assumir um peso relevante, condicionando de forma negativa o desempenho dos resultados do Grupo”, diz o BCP.

Em 2008, 54,6% da carteira de crédito na Suíça era associada a este risco de crédito hipotecário em francos suíços, mas com a redução que foi sendo feita – sobretudo com acordos extrajudiciais com os clientes – agora estes clientes representam 10,7% da carteira de crédito, isto é, 2,5 mil milhões de euros.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Questionado pelo Observador na conferência de imprensa sobre quanto dinheiro (e tempo) poderá custar este problema, Miguel Maya disse não ter resposta para este problema que considerou ser um risco “político-jurídico” – isto porque este é um problema que vem de 2008 e “até 2018 nunca se passou nada e, de repente, entra-nos pela porta adentro de forma muito forte”.

Quanto tempo irá arrastar-se, mais, este problema? “Não sei a resposta a essa questão e embora tenhamos cenários, para já o que estamos a fazer é a constituição de imparidades (que não são perdas, são perdas potenciais)”, afirmou Miguel Maya, reconhecendo, porém, que estamos “longe” de poder dizer que o processo está perto do fim.

BCP cobrou mais 14,1% em comissões na operação doméstica

Considerando apenas os resultados da atividade doméstica, o resultado líquido foi de 107,6 milhões de euros, mais 29% face ao período homólogo de 2021, segundo informou o banco em comunicado enviado à CMVM,  apresentado em conferência de imprensa por Miguel Maya, o presidente da comissão executiva.

O banco conseguiu fazer subir a margem financeira em 24,1%, um indicador importante para os bancos já que reflete, em termos simples, os proveitos que o banco obtém na diferença entre aquilo que paga para se financiar (depósitos, BCE etc.) e os juros que cobra pelos créditos que concede.

A margem financeira do BCP ascendeu a 465,1 milhões de euros (incluindo operação doméstica e internacional) ao passo que o produto bancário subiu 21,2% para 700,7 milhões, com as comissões a aumentarem 12,7% para 192,8 milhões. Só na operação doméstica, o banco cobrou mais 14,1% em comissões.

O crédito concedido (stock total) aumentou 4,5%, em termos líquidos, com o banco a subir, também, os recursos totais de clientes: aumentaram 5%. O banco registou 254 milhões em imparidades neste trimestre, 97,4 milhões dos quais relacionados com a Polónia.

740 pessoas saíram do banco (em Portugal) nos últimos 12 meses

O banco aumentou em 1,1% os custos operacionais, embora em Portugal tenha havido uma redução dos custos em 5% – as despesas com advogados na Polónia, por outro lado, contribuíram aumentar os custos suportados pelo banco, indicou Miguel Maya.

O BCP terminou o primeiro trimestre deste ano com 6.264 mil colaboradores em Portugal, menos 740 pessoas do que no final do primeiro trimestre de 2021. Também foram encerradas 55 agências em Portugal – no final de março havia 421 agências.

Em 2020 já tinhamos noção de que teríamos de fazer um ajuste”, mas não foi feito devido à pandemia. Porém, “em 2021, quando chegou o momento em que indicava claramente que a economia tinha invertido, avançámos com esse processo”.

“Gostaríamos que tivesse sido de uma vez por todas, é um processo extremamente duro, especialmente para as pessoas que saem, que não são sempre más pessoas”, afirmou Miguel Maya, argumentando que agora a “principal preocupação está na contratação de pessoas”: “há uma concorrência muito forte para contratar pessoas em algumas áreas e as universidades ainda não estão a dar resposta”, afirmou Miguel Maya, indicando que o banco tem planos para contratar cerca de “uma centena” de trabalhadores.

Miguel Maya diz-se “pouco otimista” em relação à duração da guerra

Na conferência de imprensa de apresentação de resultados, Miguel Maya revelou, também, que não está “particularmente otimista em relação à guerra e ao tempo que isto vai durar“.

Isso irá fazer com que as pressões inflacionistas devam continuar: “desde o final do ano passado se sentia aquecimento da inflação” e, nesta fase, a expectativa é que “vamos ter de viver 2022 e parte de 2023 com um aumento da inflação“.

É uma situação relativamente nova, ao fim de vários anos sem inflação. Alguma inflação, na ordem dos 2%, é algo bom para a economia, a questão é qual o tempo que vai demorar até que a inflação vá para esses 2%, vai depender muito da evolução da guerra na Ucrânia”, referiu Miguel Maya.

O responsável diz que o “impacto direto para o BCP é irrelevante” mas “ramificações de segunda e terceira ordem não são irrelevantes“. As “empresas altamente dependentes de energia podem ver a sua viabilidade condicionada“, afirmou o responsável, reconhecendo que “há preocupação em alguns setores”.

Sobre a subida das taxas de juro, “na zona euro não perspetivamos uma enorme correção da política monetária, é um ritmo de normalização da política monetária que vai ser mais rápido do que se tinha previsto”.

No cenário central, não perspetivo um aumento das imparidades nos particulares. Nas empresas, houve uma redução do endividamento das empresas, que faz com que estejam mais bem preparadas”, disse o presidente do BCP.

“Não antecipamos que as taxas de juro subam para mais de 2% em 2022 nem em 2023”, acrescentou Miguel Maya, notando que “felizmente não há uma conjugação com uma subida do desemprego”.

Num comentário sobre se o Orçamento do Estado tem as respostas devidas para enfrentar a crise, Miguel Maya disse ter a expectativa de que, tal como aconteceu na pandemia, “o Estado continue, como está a fazer, com maior ou menor escala, a apoiar de forma incisiva as famílias e empresas que precisam de apoio“. “Acredito que Portugal saberá superar, com êxito, as dificuldades por que está a passar”, rematou.