O Presidente timorense pediu a ajuda de Deus e dos antepassados para que consiga, durante o seu mandato, que começou esta sexta-feira, mobilizar todos no país para a “causa nacional” e a construção do futuro. Ramos-Horta destacou ainda o longo caminho de consolidação democrática no país, mas lembra que há que enfrentar “desafios exigentes” que continuam por sanar.

“A construção do futuro do nosso país é uma causa nacional que nos deve mobilizar a todos, sem exceção”, afirmou José Ramos-Horta, no Palácio Presidencial, nas comemorações dos 20 anos da restauração da independência de Timor-Leste.

Tal como no meu anterior mandato, exercerei as mais altas funções de Estado em espírito de permanente abertura ao diálogo e inclusão — símbolos maiores da Democracia”, frisou.

Depois da cerimónia do içar da bandeira nacional, o momento mais solene das comemorações, comprometeu-se com a salvaguarda dos valores constitucionais, insistindo na necessidade da mobilização coletiva.

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“Para que, nos próximos cinco anos, juntemos esforços concertados na construção de uma melhor democracia: mais ética, mais transparente, mais justa, mais próxima e mais inclusiva”, disse.

Na persecução desse objetivo, comprometeu-se ao diálogo com os outros órgãos de soberania, partidos com e sem representação familiar, autoridades religiosas, sociedade civil, comunidades locais e cidadãos.

Esta, insistiu, é “a melhor forma de cultivar e reforçar, junto das instituições e do povo timorense, os valores que caracterizam um regime democrático aberto”, conseguindo responder ao importante desafio de “mobilização da vontade” coletiva dos cidadãos nacionais em prol do desenvolvimento.

“A resposta a este desafio encontra-se numa palavra: mobilização. Só com a mobilização intensa de todos os cidadãos para a participação em objetivos estratégicos nacionais é que poderemos responder ao conjunto de desafios que o nosso país enfrenta. Aqui a qualidade humana da liderança nacional fará toda a diferença”, enfatizou.

Horas depois de tomar posse, Ramos-Horta recebeu esta sexta-feira no Palácio Presidencial — a que voltou 10 anos depois – representantes de dezenas de países, incluindo o seu homólogo português, Marcelo Rebelo de Sousa.

“Vamos fazer ainda mais”, promete Marcelo à chegada a Díli

Um momento, disse, que quis dedicar primeiro aos timorenses e aos seus amigos, deixando uma “sentida homenagem de eterna gratidão aos heróis nacionais e sobretudo ao povo simples, anónimo, que tudo sofreu e tudo deu, com enorme sentido de sacrifício e coragem, resistiram pela libertação nacional”.

Recordando a luta contra a ocupação indonésia, Ramos-Horta celebrou a solidariedade internacional em torno à causa timorense, agradecendo o “apoio generoso” dado pelos países que apoiaram a luta pela autodeterminação.

Sublinhando e enaltecendo o apoio continuado dos parceiros do país nos 20 anos desde o momento em que, na noite de 19 para 20 de maio de 2002, Timor-Leste foi reconhecido oficialmente como país.

Ecoando mensagens que vincou durante a sua campanha, e especialmente desde que foi eleito, o Nobel da Paz voltou a destacar a importância da “unidade e comunhão” do povo e dos líderes do país durante a luta, considerando essa a receita para o futuro.

“Só em plena unidade conseguiremos construir o futuro do país com que sempre sonhámos”, disse, destacando vários dos nomes maiores da luta, incluindo Nicolau Lobato, Xanana Gusmão e Francisco Guterres Lú-Olo.

Marcelo Rebelo de Sousa e Francisco Guterres trocaram altas condecorações

Tal como no seu discurso de tomada de posse, na noite de quinta-feira, Ramos-Horta voltou a não se referir à Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) nem ao seu líder, Mari Alkatiri, um dos ausentes das cerimónias de investidura.

Xanana Gusmão também não esteve na tribuna de honra, com imagens a circular nas redes sociais que indicam que esteve, pelo menos durante parte da cerimónia de quinta-feira junto à população, mantida atrás de uma vedação colocada longe das tribunas de honra.

Mensagens ainda de agradecimento às confissões religiosas, cujo papel “inspira e incentiva a contribuir cada vez mais para a paz e a fraternidade humana, condições incontornáveis para o desenvolvimento e bem-estar geral”, e ao papel “crucial” das Nações Unidas na construção do Estado.

Considerando a conquista da independência “uma vitória de paz”, comprometeu-se a aprofundar as relações com a Indonésia, “nação irmã, amiga, solidária, que soube com elevado sentido de história receber Timor-Leste na nova condição de país soberano, seu vizinho e amigo”.

Destacou igualmente as “relações de boa vizinhança e amizade com a Austrália e a Nova Zelândia” e Portugal, de quem recordou os “laços seculares”, saudando a presença no país de Marcelo Rebelo de Sousa.

Ramos-Horta destaca “desafios exigentes” que continuam por sanar

“Timor-Leste percorreu já um longo caminho para a consolidação de uma democracia jovem, vibrante e assente nos princípios de um estado de direito. Não podemos pensar que tudo está feito, o nosso país tem pela frente desafios exigentes próprios do nosso contexto histórico e cultural”, afirmou José Ramos-Horta num discurso no parlamento, na sessão que evoca os 20 anos da restauração da independência e de vida da Constituição.

“Desafios estes que já nos acompanham há algum tempo, isto apesar da constituição estabelecer os fundamentos e a base jurídica necessária para o Estado poder atuar no sentido de atenuar as desigualdades identificadas”, afirmou.

Num discurso em que destacou o que já foi conseguido e o que falta conseguir para uma verdadeira implementação dos princípios orientadores da constituição, que cumpre 20 anos de vida, Ramos-Horta disse que o país se deve orgulhar de ser uma democracia “livre e plural, multiétnica e multirreligiosa”.

Falta, porém, consolidar os princípios de proteção social próprios de um estado de direito, afirmou, sublinhando que o Estado “deve desenvolver e implementa políticas capazes de responder de forma eficaz às necessidades” atuais.

“Só assim terá a capacidade de servir plenamente os seus cidadãos, e assegurar os seus direitos fundamentais”, afirmou, considerando essencial uma alteração de pensamento “privilegiando” as regras e normas, mas, “acima de tudo, as pessoas”.

Num longo discurso, Ramos-Horta analisou os vários componentes da lei base, aprovada pelos 88 deputados da Assembleia Constituinte, que a 20 de maio de 2002 se transformou em Parlamento Nacional.

Um texto que enfatiza o respeito pelos direitos humanos e fundamentais, separação de poderes e respeito pela democracia pluralista, sendo essencial “na construção de um Estado de Direito Democrático, assente na dignidade da pessoa humana e na soberania do povo”.