O presidente da Assembleia da República salientou esta terça-feira, perante o parlamento dos jovens, a importância da arma da filosofia para estimular o entendimento e combater a desinformação, numa “aula” em que partiu do pensamento de Immanuel Kant.

Com 132 jovens deputados do Ensino Secundário sentados à sua frente, o professor universitário Augusto Santos Silva recorreu à epistemologia do filósofo prussiano do século XVIII para falar sobre o impacto da desinformação na democracia.

“Dizia [Kant] que as nossas preocupações se podem resumir a três perguntas: O que podemos saber? O que devemos fazer? E o que podemos esperar?”, assinalou o presidente do parlamento, tendo ao seu lado a ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, e o presidente da Comissão de Educação e Ciência, o deputado socialista Alexandre Quintanilha.

Para Augusto Santos Silva, que ao longo da sua intervenção também citou filósofos da Antiguidade Clássica como Pitágoras e Sócrates, a resposta a essas questões de Immanuel Kant “é praticar a boa filosofia” – uma ferramenta para se formular juízos, “a razão crítica”.

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“O grande ensinamento da filosofia é o pronome pessoal nós. Cada um de nós e nós em conjunto é que pensamos. Não somos recetáculos passivos — ou, em linguagem filosófica, não somos tábula rasa -, mas sim sujeitos ativos. É isso mesmo que quer dizer cidadania”, frisou o presidente da Assembleia da República.

Augusto Santos Silva especificou depois que cada cidadão é igual em dignidade, livre enquanto ser humano e integrante de uma comunidade — uma comunidade ou coletividade onde há assuntos para se tratar em conjunto.

“E para tratarmos esses assuntos em conjunto com respeito uns pelos outros e, sobretudo, com respeito por nós próprios”, completou, antes de recorrer novamente à filosofia kantiana.

“Sermos nós próprios a pensar pela nossa cabeça, a pensarmos em conjunto e de forma organizada. Essa é a melhor arma contra os factos alternativos e a pós-verdade. A máxima é esta: Desconfiem sempre de quem não procura a verdade e desconfiem sempre de quem diz que já chegou à verdade, porque a busca da verdade é uma tarefa infinita”, concluiu.

Ana Catarina Mendes lembrou que esta iniciativa do parlamento jovem tem 25 anos e foi impulsionada pela antiga deputada socialista Julieta Sampaio e referiu perante os deputados do Ensino Secundário que não sonhou exercer as suas atuais funções de ministra.

“Nos meus ativismos pela despenalização da interrupção voluntária da gravidez, pela autodeterminação de Timor-Leste, por uma associação de estudantes mais participada ou para que os meninos mais pobres pudessem ter acesso à escola, em algum dia sonhei ter a responsabilidade de poder mudar a vida de muitas pessoas no meu país”, contrapôs, recebendo uma prolongada salva de palmas dos jovens deputados.

Perante os jovens, Ana Catarina Mendes falou sobre casos atuais de desinformação na Rússia sobre a guerra da Ucrânia e defendeu uma permanente atitude de “rigor no debate, respeito e tolerância pela diferença”.

“A democracia constrói-se pela pluralidade e diversidade”, advogou, antes de Alexandre Quintanilha se referir a dois dos principais desafios que se colocam aos mais jovens: As alterações climáticas e demográficas.

Se Augusto Santos Silva antes dera uma lição de sobre filosofia, Alexandre Quintanilha recorreu ao método científico, mas ambos em defesa da mesma ideia antidogmática.

“Os fanáticos e os tolos estão cheios de certezas. Os sábios estão cheios de dúvidas. A desinformação reforça preconceitos, e os preconceitos minam a confiança nas instituições e na ciência”, acentuou o professor catedrático e presidente da Comissão de Educação e Ciência.

Nesta sessão nacional do Ensino Secundário, na sala de reuniões plenárias do parlamento, participaram 132 jovens deputados de 66 escolas eleitas em sessões distritais e regionais. Em debate, estão 22 projetos de recomendação aprovados nessas sessões distritais e regionais dos diferentes círculos eleitorais.

Segundo o parlamento, o tema “Fake news: o impacto da desinformação na democracia” foi lançado pela Assembleia da República no início do ano letivo e o desafio foi aceite por 487 escolas do Ensino Secundário do continente, das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, bem como pelas escolas portuguesas dos círculos da Europa e de Fora da Europa, do 10.º ao 12.º ano de escolaridade.