O chefe de Estado de Timor-Leste, José Ramos-Horta, pediu esta segunda-feira ao Tribunal de Recurso a fiscalização preventiva da constitucionalidade da lei da responsabilidade do Presidente da República, considerando o diploma do parlamento inconstitucional.

“Conclui-se que o Decreto do Parlamento Nacional n.º 63/V — Lei da Responsabilidade do Presidente de República, de 16 de maio de 2022, é formalmente inconstitucional, padecendo ainda a vasta maioria dos seus artigos de inconstitucionalidade formal”, refere o pedido a que a Lusa teve acesso.

“O decreto em seu todo é inconstitucional dado a inexistência da competência legislativa do Parlamento Nacional para elaborar a proposta de lei”, sublinha.

Assim, Ramos-Horta pede ao tribunal que considere a “inconstitucionalidade formal” do diploma, com base “na falta de competência do Parlamento Nacional para legislar sobre a matéria“.

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Pede ainda que seja considerada a inconstitucionalidade com base “na violação do princípio da igualdade perante a lei” bem como a “inconstitucionalidade formal” por violar vários artigos da Constituição.

Em alternativa, refere o pedido, o tribunal deve “considerar a inconstitucionalidade material das normas jurídicas” contidas em grande parte do articulado por violação de vários artigos da constituição.

Nos argumentos que apresenta ao Tribunal de Recurso, o chefe de Estado considera que o artigo 79.º da Constituição, sobre “Responsabilidade criminal e obrigações constitucionais” do Presidente “não contém qualquer poder legislativo e não fornece a principal base constitucional” para esta lei.

Além disso, considera, a Constituição “somente confere ao Parlamento o poder de legislar sobre o estatuto dos titulares dos órgãos do Estado como uma classe e não fornece o poder de legislar apenas em relação ao Presidente”.

Além disso, José Ramos-Horta considera que o diploma “é formalmente inconstitucional pois é uma lei legalmente inexistente por não ter sido um reflexo do texto substantivo aprovado no Plenário do Parlamento Nacional”.

Em concreto nota que o texto final enviado à Presidência da República foi alvo de uma alteração em sede de comissão que altera a versão aprovada em plenário, infringindo assim o regimento parlamentar.

“Ao alterar o pensamento legislativo e a intenção da sessão plenária do parlamento e ao fazê-lo minou a base total da abertura e do princípio fundamental criado pela CDRTL [Constituição da República Democrática de Timor], de que Timor-Leste é uma República Democrática”, refere.

Além disso, e “caso o Tribunal considere a constitucionalidade formal do decreto, é preciso analisar se as normas aí contidas são materialmente constitucionais”, sendo que “as tipificações criminais previstas (…) do decreto não estão suficientemente definidas, levando a ambiguidade sobre quais atos criminalizados ou não”, frisa.

Essa ambiguidade, sublinha, “prejudica a função constitucional do magistério de influência do Presidente, impactando na sua competência constitucional”, já que “o confinamento e limitação do exercício dos poderes discricionários do Presidente constitui uma subversão dos fundamentos do sistema semipresidencialista, constituindo uma violação da separação de poderes prevista” constitucionalmente.

“A falta de clareza e ambiguidade na descrição de uma tipologia penal no Decreto enviado à promulgação pode ser interpretado como abrangendo situações de ação política legítima que seriam protegidas pela imunidade presidencial”, nota.

Destaca ainda o facto de os crimes visarem apenas o Presidente, o que “ofende o princípio da igualdade perante a lei” e de que “não são necessários e nem proporcionais, considerando que a maior parte das condutas aí previstas, quando da sua gravidade suficiente pelo uso ou tentativa do uso de força, já se encontra previsto em lei penal geral e lei penal especial que possui o caráter geral exigido constitucionalmente”.

“A previsão constitucional de responsabilidade de violação clara e grave das obrigações constitucionais pelo Presidente da República assegura a responsabilização do Chefe de Estado, e assim a criminalização de conduta de menor gravidade, excluindo da criminalização as tentativas sem o uso de violência ou força, que representa o limite constitucional da necessidade de tipificação criminal”, sublinha.

“Assim, entende que o decreto submetido à promulgação não é de caráter geral e abstrato e, ao mesmo tempo, as restrições nele contidas diminuem a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais”, considera ainda.