Mais de 5.000 comunicações, das quais a grande maioria teve origem judicial — 4724 —, e cerca de 900 decisões com elementos de prova que por sua vez resultaram em acusações ou condenações. Estes são estatísticas recolhidas ao longo dos 14 anos de vida do Conselho de Prevenção para a Corrupção que será substituído pelo Mecanismo Nacional Anticorrupção, um órgão que terá mais do que funções de fiscalização.

O balanço da atividade do Conselho foi apresentado esta segunda-feira por José Tavares, o presidente da instituição que também preside ao Tribunal de Contas. Os dados recolhidos pelo Conselho e que têm sobretudo origem em comunicações judiciais indicam ainda que mais de metade destes casos — 51% — , , foram arquivados por falta de elementos de prova. A corrupção foi o crime que mais comunicações suscitou — a maioria das comunicações é o resultado de denúncias — com um terço dos casos reportados, seguido do peculato e do abuso de poder.

Cerca de 40% das suspeitas comunicadas tiveram origem em denúncias anónimas. Quase 25% foram comunicados por um particular identificado, enquanto 21,3% tiveram origem num reporte institucional. As estatísticas recolhidas desde 2008 mostram ainda que o número de comunicações tem vindo a subir quase todos os anos, tendo atingido os 745 em 2021. O número de decisões com condenação ou acusação não tenha acompanhado esse crescimento na mesma proporção, o que também reflete a circunstância de muitas das denúncias não virem acompanhadas de elementos de prova como documentos que permitam desenvolver a investigação.

Para os responsáveis do Conselho de Prevenção da Corrupção, o aumento do número de participações não resulta necessariamente de mais crimes, mas sim de uma maior consciêncialização das pessoas e entidades para o “fenómeno” da corrupção e demonstra que o “trabalho de formiguinha” efetuado pelo Conselho ao longo deste anos teve resultados. Um dos dados sublinhados por José Tavares é o número crescente de entidades públicas que tem um plano de gestão de riscos da corrupção, o que considerou ser uma “verdadeira reforma no setor público” que vai ser alargada ao setor privado com o Mecanismo Anti-Corrupção que vai entrar em vigor esta quarta-feira.

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O Mecanismo Anticorrupção não vão iniciar funções de imediato, irá passar ainda por uma fase de instalação a definir pelo Governo, período durante o qual o Conselho de Prevenção da Corrupção irá manter-se em funções. Depois todos o trabalho feito será transferido para a nova entidade cujo presidente será proposto pelo Presidente do Tribunal de Contas e pela Procuradora-Geral da República, mas cuja nomeação é decidida pelo Governo. A escolha do próximo homem forte do combate à corrupção é umas das principais preocupações atuais do presidente do Conselho da Concorrência.

Este novo organismo terá funções reforçadas, juntando as funções de prevenção e fiscalização a competências de controlo e sancionamento.

Obras Públicas. Tribunal de Contas vai estar muito atento a novo regime

José Tavares destacou a intervenção do Conselho ao nível de recomendações produzidas que qualifica de “estruturais” na medida em que o seu não acolhimento resulta em responsabilização dos visados e os 44 pareceres elaborados sobre projetos legislativos emitidos pela instituição a pedido do Governo. O novo regime de revisão automática dos preços das empreitadas das obras públicas não foi um destes diplomas, confirmou o presidente do Conselho de Prevenção da Corrupção.

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Quando questionado sobre o não envolvimento nesta legislação que foi promulgada com alertas pelo Presidente da República, o também presidente do Tribunal de Contas referiu que não questiona opções político legislativas. Deixou no entanto, a nota de que é um diploma a que o Tribunal “vai estar muito atento” e acompanhar, bem como fazer aplicar, ainda que “alguém possa não concordar”. José Tavares destacou a grande importância da contratação pública na função de controlo do Tribunal de Contas. “É uma área que sempre nos preocupou” porque representa 25% a 30% da despesa pública e corresponde a 15% do Produto Interno Bruto. “O Tribunal não pode ficar alheio a um tema tão importante”.

O presidente do Conselho de Prevenção da Corrupção considerou ainda que Portugal não precisa de mais leis para combater a corrupção. “As que existem são suficientes na minha opinião. Só precisamos de as aplicar bem e termos instituições que funcionem de forma célere”, sublinhando ainda que “muitas leis criam confusão e retiram clareza”. Este alerta foi reforçado por Orlando Romano, procurador que é membro do Conselho de Prevenção da Corrupção.

“Uma alteração permanente permanente das leis cria instabilidade”. Ainda que as leis tenham de acompanhar a dinâmica da sociedade, Orlando Romano avisou que as pessoas não podem viver numa sociedade que está sempre a mudar as leis. “Estar sempre a alterar leis é péssimo em todos os sentidos e na área financeira leva a que os investidores se afastem”.