A Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos (SPCI) e o Grupo de Infeção e Sepsis vão traçar o perfil dos doentes internados com Covid-19 grave e muito grave, numa altura em que a maioria da população está vacinada.

Segundo o presidente da SPCI, Paulo Mergulhão, os dados a recolher neste estudo “são altamente relevantes para informar as decisões sobre utilização das novas terapêuticas disponíveis, que reduzem o risco de progressão para formas mais graves da infeção pelo SARS-CoV-2″.

A experiência dos últimos meses sugere que a população de maior risco se compõe de dois grupos distintos. O primeiro inclui pessoas não vacinadas, o que é cada vez mais infrequente – uma dúvida acessória neste contexto é a duração da proteção conferida pela vacinação e o estudo CritCov22 também vai tentar explorar esta matéria”, explicou o especialista.

O segundo grupo — acrescentou — “é o de pessoas com compromisso significativo do sistema imunitário, nomeadamente recetores de transplantes de órgãos sólidos ou hematológicos, doentes expostos a terapêutica imunossupressora ou com outras formas de imunodepressão congénita ou adquirida”.

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“É fundamental sistematizar estes dados de forma a esclarecer os verdadeiros fatores de risco para desenvolvimento de Covid-19 grave ou crítica“, sublinha Paulo Mergulhão.

O estudo vai incluir todos os doentes admitidos nos Serviços de Medicina Intensiva (SMI) entre os meses de fevereiro e abril deste ano, com o diagnóstico de infeção pelo vírus SARS-CoV-2, “mesmo que este não seja a causa da admissão”, precisa o responsável.

Os dados a recolher serão epidemiológicos e de comorbilidades “com foco particular no risco de imunossupressão” e a comparação entre os grupos (infeção por SARS-CoV-2 e Covid-19 grave/crítica) “deverá contribuir para esclarecer os fatores de risco atuais para desenvolvimento de doença grave”, frisa.

Será ainda possível recolher dados sobre o consumo de recursos e os resultados globais que deverão permitir avaliar o custo que o SARS-CoV-2 impõe atualmente aos serviços de medicina intensiva.

Uma das grandes lições desta pandemia é a do potencial disruptivo para todo o sistema de saúde de uma situação de sobrecarga sustentada dos Serviços de Medicina Intensiva, com compromisso da sua capacidade de resposta”, disse o responsável, considerando que isto tem reflexos “não só na doença crítica aguda, mas também em situações como procedimentos de elevada complexidade [como por exemplo cirurgia oncológica ou cardíaca] ou na necessidade de ocupar espaços, como blocos operatórios ou salas de recobro, com o consequente prejuízo da sua atividade programada”.

Paulo Mergulhão reconhece que a elevada taxa de vacinação no nosso país “conduziu a um aligeiramento das medidas de prevenção”, insistindo que estas “devem ser sempre relembradas”.

“A etiqueta respiratória, lavagem das mãos e utilização de máscaras nos contextos onde é recomendada continuam a ser medidas cuja importância não deve ser menosprezada. Sabemos que a vacinação reduz de forma muito importante o risco de desenvolvimento das manifestações mais graves da Covid-19, mas não o elimina totalmente”, afirmou.

Lembra que atualmente “já existem alternativas farmacológicas, como anticorpos monoclonais”, aprovados pela Agência Europeia do Medicamento, para prevenção da Covid-19 e que vários países da União Europeia “já definiram critérios para a sua utilização na proteção de doentes imunossuprimidos que não desenvolvem uma resposta adequada à vacinação”.

“Aguarda-se a sua disponibilização em Portugal e os dados recolhidos poderão ajudar a definir as populações alvo para este tipo de intervenção“, considerou.

A estas alternativas farmacológicas juntam-se os tratamentos já disponíveis em Portugal, como “as terapêuticas antivirais ou anticorpos monoclonais que são comprovadamente eficazes a reduzir o risco de progressão da infeção por SARS-CoV-2 para formas mais severas”.

“Tal como todos os outros, estes novos fármacos têm efeitos laterais conhecidos, interações farmacológicas que podem ser relevantes, contraindicações específicas e um custo que pode não ser despiciendo”, afirmou o especialista, sublinhando: “É por estes motivos que se torna fundamental a identificação de grupos ou populações com maior probabilidade de beneficiarem da utilização destas novas alternativas terapêuticas”.