O Tribunal de Recurso timorense declarou esta sexta feira a inconstitucionalidade formal da lei da responsabilidade do Presidente da República, aprovada pelo parlamento, invocando a separação de poderes e a natureza do regime semipresidencialista do país.

“Num regime semipresidencialista como o timorense”, refere o  acórdão a que a Lusa teve acesso, uma interpretação do artigo 95 da constituição, “que admita a consagração de um Estatuto de responsabilidade criminal apenas relativamente ao Presidente da República, omitindo-a quanto ao Parlamento e ao Governo, não é conforme à Constituição e aos princípios nela consignados, violando designadamente aquele preceito e o princípio da separação de poderes, com interdependência de poderes”.

A lei foi aprovada em maio – mês em que Ramos-Horta tomou posse como Presidente — depois de um debate e aprovação acelerado, durante apenas três horas, em sede de comissão, na especialidade, tendo participado apenas deputados das bancadas que sustentam o governo.

Antes de deixar o cargo, o seu antecessor, Francisco Guterres Lú-Olo, aprovou vários diplomas pendentes mas deixou esta polémica lei para ser apreciada pelo atual chefe de Estado, que pediu no início de junho a sua fiscalização preventiva.

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No acórdão a que a Lusa teve acesso, o coletivo dos juízes considera que a lei padece “de inconstitucionalidade formal”, tendo notificado da decisão hoje o Parlamento Nacional e o Presidente da República.

Na decisão de hoje, os juízes não dão razão a parte dos argumentos do chefe de Estado, considerando que não padece de inconstitucionalidade a inclusão, depois do voto em plenário, de um novo número a um dos artigos da lei.

Os juízes também não consideram ter verificado inconstitucionalidade no que toca à competência do parlamento para legislar sobre esta matéria, algo invocado por José Ramos-Horta.

No pedido de fiscalização, José Ramos-Horta considerava que a polémica lei “é formalmente inconstitucional, padecendo ainda a vasta maioria dos seus artigos de inconstitucionalidade formal”.

O diploma pretendia, segundo o próprio preâmbulo, regulamentar aspetos do artigo 79 da Constituição, que se refere à “Responsabilidade criminal e obrigações constitucionais” do chefe de Estado, definindo o regime jurídico a aplicar no caso de “violação clara e grave das suas obrigações constitucionais”.

“A presente lei define os crimes cometidos no exercício de funções pelo Presidente da República e as respetivas sanções, e fixa as normas especiais de processo aplicáveis ao julgamento dos crimes e da violação clara e grave das suas obrigações constitucionais”, refere-se na proposta.

Um dos aspetos mais importantes da lei tem a ver com as “obrigações constitucionais” do chefe de Estado, especialmente no quadro de ameaças de que José Ramos-Horta poderá vir a dissolver o parlamento, algo exigido pelo Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), de Xanana Gusmão, que apoiou a sua candidatura.

Assim, e entre os seus vários aspetos, a proposta prevê penas de prisão de entre dois e oito anos em casos de “coação contra órgãos constitucionais”.

“O titular do cargo de Presidente da República que, por meio não violento nem de ameaça de violência, impedir ou constranger o livre exercício das funções de órgão de soberania ou de órgão de governo próprio do poder local ou regional será punido com prisão de dois a oito anos, se ao facto não corresponder pena mais grave por força de outra disposição legal”, acrescenta.

“O titular do cargo de Presidente da República que, nas mesmas condições, impedir ou constranger o livre exercício das funções do Provedor de Justiça é punido com prisão de um a cinco anos”, determina ainda.