Sergey Vladimirovich Cherkasov, agente do GRU, serviços secretos militares russos, utilizava o nome Viktor Muller Ferreira, era o “favorito do professor” e foi identificado ao tentar ganhar acesso ao Tribunal Penal Internacional (TPI) como um estagiário.

Antes de se candidatar ao estágio no TPI, o homem de 36 anos passou anos a construir sua identidade falsa. Um documento divulgado pelos serviços de informação neerlandês, que acredita-se ter sido escrito pelo próprio Cherkasov, descrevia toda a biografia fictícia de Viktor Muller Ferreira, nascido em 1989 no Rio de Janeiro, com detalhes como a relação próxima com uma tia e uma paixão platónica por uma professora de geografia.

Em 2014, o agente iniciou os seus estudos na área das ciências políticas no Trinity College em Dublin, Irlanda. Depois de se formar em 2018, foi para os Estados Unidos fazer um mestrado na conceituada Johns Hopkins’ School of Advanced International Studies (SAIS).

Na SAIS, Cherkasov tornou-se popular entre os alunos e professores. “Ele era o favorito do professor”, afirmou um dos seus antigos colegas em declarações à CNN, “Eu nunca suspeitei (que fosse um espião)”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O seu sotaque, no entanto, causou dúvidas aos colegas, tendo um chegado a perguntar-lhe diretamente se era russo. “Viktor” desconversou logo em seguida, “olhando para atrás, aquilo era um ‘sinal de alerta'”, contou esse estudante.

O seu excelente desempenho académico e o boa relação com os professores, valeu ao “brasileiro” uma carta de recomendação de um dos professores, que lecionava sobre genocídio, para um estágio no Tribunal de Haia.

Ao chegar aos Países Baixos, onde iria dar início ao estágio, Cherkasov viu a sua entrada ser negada pelas autoridades neerlandesas por ser considerado uma ameaça “potencialmente alta”, sendo de imediato deportado para o Brasil.

Não é clara a maneira como os agentes do país europeu descobriram a verdadeira identidade do agente russo, contudo antigos oficiais dos serviços secretos norte-americanos relataram à CNN que não é incomum o acompanhamento à distância de alguns espiões identificados para se chegar a uma rede maior. Assim sendo, o mais provável é que os EUA tenham fornecido informações sobre “Muller” aos Países Baixos antes de sua chegada ao país.

O acesso a documentos referentes a investigações de possíveis crimes de guerra cometidos pela Rússia em 2008, na Geórgia, e em 2022, na Ucrânia, seria o principal objetivo de “Muller”, suspeitam as autoridades neerlandesas.

“Se esta pessoa obtivesse a oportunidade de realmente trabalhar no TPI, ele poderia ter recolhido informações, poderia apagar evidências e poderia ter acesso a sistemas digitais”, explica o serviço neerlandês. “Por esses motivos, o acesso secreto às informações do TPI seria altamente valioso para os russos”.

O Tribunal Penal Internacional afirmou estar “muito grato aos Países Baixos por essa importante operação e de maneira mais geral expor ameaças a segurança”.

No Brasil, o agente continuou a viver como Viktor Muller Ferreira por algum tempo, até ser detido pela polícia brasileira pela utilização de documentos falsos.  Permanece, atualmente, sob custódia à espera de julgamento.