Há currículos e currículos mas, olhando para este século, há currículos que são mais do que currículos e funcionam quase como cartas de apresentação para projetar aquilo que podem ser os currículos dos outros. Alberto Contador é um exemplo paradigmático disso mesmo: duas vitórias na Volta à França entre três triunfos em etapas (2007 e 2009), duas vitórias na Volta à Itália (2008 e 2015), três vitórias na Volta a Espanha com sete triunfos em etapas (2008, 2012 e 2014). Como ele nos últimos 20 anos só Chris Froome – que vai participar no Tour de 2022 sem grandes objetivos de vitória –, melhor do que ele na história do ciclismo só mesmo Eddy Merckx (11), Bernard Hinault (10) e Jacques Anquetil (oito). Agora, cinco anos depois da última época o espanhol mantém uma ligação direta à modalidade e à prova como comentador do Eurosport e foi nessa condição que lançou a edição que começa esta sexta-feira em Copenhaga.

Lance Armstrong diz que Alberto Contador ganhou Tour de 2009 porque foi “mais forte”

“Todas as Grandes Voltas que ganhei foram especiais por umas coisas e por outras. São mais de 20 dias a tentar encontrar solução para todo o tipo de imprevistos e a manter o nível para conseguir chegar à vitória no final”, comentou o espanhol, antes de falar ao Observador do favoritismo teórico de Tadej Pogacar nesta edição onde poderá alcançar o tri após ter ganho a Volta aos Emirados, a Tirreno-Adriático e a Volta à Eslovénia: “Ele já era favorito, não apenas por todos esses últimos triunfos mas por ter ganho também as últimas duas edições do Tour de França porque isso aumenta a sua experiência e a sua hierarquia”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“O duelo com o Roglic vai ser muito importante porque se conhecem bem e porque há também algumas outras equipas que tentarão beneficiar dessa rivalidade. Na verdade, será mais um duelo entre Pogacar e a Jumbo porque na realidade o Roglic não está sozinho na luta. Acredito que se deve também colocar o Vingegaard depois da segunda posição que conseguiu em 2021. É um corredor que colocou problemas a Pogacar e que sabemos que está muito forte, como vimos no Critério Dauphiné. A maior responsabilidade estará entre a UAE Emirates e a Jumbo Visma mas no Tour acontecem muitas coisas e veremos se não existem alguns corredores com a capacidade suficiente para surpreender”, acrescentou Alberto Contador, que não consegue encontrar paralelismo entre Pogacar e os seus antigos adversários.

“Froome, Nibali, Wiggins, Lance Armstrong, outro? Não, o Tadej [Pogacar] é diferente de todos eles, não me faz recordar nenhum dos grandes nomes do passado porque o próprio Pogacar conseguiu gerar a sua figura, com um estilo próprio de competir. Apesar de ser jovem, já está entre os melhores. Agora será o corredor que todos querem bater no Tour. É certo que vimos poucos duelos entre Tadel, Roglic e o próprio Vinegaard e temos de pensar que são desportistas que subiram muito rápida das categorias jovens a profissionais e que competem com garantias nas melhores corridas. Não podemos saber por quanto mais tempo haverá esse domínio mas o Pogacar destaca-se por competir de uma forma extraordinária no contrarrelógio e de ser muito bom na montanha. É alguém completo e demonstra isso”, salientou.

Ainda ao Observador, Contador abordou também as hipóteses de Rúben Guerreiro poder ganhar uma tirada de montanha no Tour depois do triunfo conseguido recentemente no Mont Ventoux Challenge com um dos melhores registos do século: “Sem dúvida que sim, o Guerreiro tem muita qualidade e cresceu muito nos últimos anos. A montanha é o seu território e é certo que pode conseguir algum grande resultado neste tipo de etapas”. “Problemas com a Covid-19? É um inconveniente extra para qualquer pessoa, para um desportista de elite ainda mais porque as suas defesas ficam mais baixas e é preciso ter mais cuidado que já é normal. Todas as equipas tentam isolar os corredores para minimizar riscos e há que saber conviver com a situação”, referiu ainda sobre a infeção que retirou João Almeida do Giro de Itália.

O cowboy de Pegões está pronto a disparar no Tour: Rúben Guerreiro vence isolado o Mont Ventoux Dénivelé Challenge

“O Tour é exigente desde a primeira etapa porque já se geraram aí diferenças importantes. O clima que existe na Dinamarca também não é o habitual para nenhuma prova do Tour e é algo que pode influenciar, assim como o próprio piso na quinta etapa. As primeiras nove etapas serão para sobreviver e manter as distâncias. O Tour é a corrida das corridas, a mais importante e a que maior repercussão tem. Quando competes a nível profissional comprovas que é o objetivo número 1 de todas as equipas, a pressão do Tour é incomparável. Como aguentei isso? No meu caso levei as coisas com naturalidade, sabendo que se trata da corrida mais importante do mundo onde a pressão é evidente”, destacou ainda o espanhol.

Desta vez é que é: Alberto Contador retira-se depois da Vuelta

Por fim, Contador confirmou ainda uma confissão do seu irmão, que assumiu no ano passado que o antigo vencedor das Grandes Voltas ponderou um regresso em 2020. “Vivi sempre o ciclismo como uma paixão e que continuo a aproveitar. Retirei-me num momento bonito, com boas sensações e a pandemia ofereceu-me muito tempo livre que utilizei para treinar sem ter um objetivo definido mas os números fizeram com que colocasse essa hipótese de regresso. Pensei muito, falei com todas as pessoas à minha volta e acabei por decidir finalmente que a melhor opção era mesmo deixar as coisas como estavam”, concluiu.