Em 2020/21, o Leeds regressou à Premier League. 16 anos depois, o histórico clube inglês regressou ao escalão principal. Semanas depois de a equipa então orientada por Marcelo Bielsa atingir esse feito, Kalvin Phillips recebeu uma chamada da prisão. “Ouve isto”, disse a voz do outro lado da linha. De repente, dezenas de reclusos, em uníssono e acompanhados por pancadas nas paredes, entoaram “Marching on Together”, o emblemático cântico do Leeds.

A voz do outro lado da linha era o pai de Kalvin Phillips, peça fulcral na equipa do Leeds que atingiu a promoção e internacional inglês que esta segunda-feira foi confirmado como reforço do Manchester City, assinando por seis temporadas. Aos 26 anos, o médio vai deixar o clube que representou toda a vida, o clube da cidade onde nasceu e cresceu e o clube que o catapultou para a ribalta. E vai deixar, essencialmente, o clube que é ainda a maior ligação que tem a um pai que nunca esteve presente.

“Ele entra e sai da minha vida desde que eu era criança. Já esteve preso, já esteve cá fora, já voltou a ser preso. Meteu-se com as pessoas erradas… Drogas, lutas, tudo aquilo que podem imaginar. Não cresceu na melhor situação do mundo, nunca conheceu propriamente o pai dele, tem um passado complicado. Foi pai aos 13 anos, teve a minha meia-irmã. Ele e a minha mãe tinham uma relação em que estavam bem durante algum tempo e depois o meu pai desaparecia para fazer o que lhe apetecia. A minha mãe perdia a paciência, o meu pai era preso, saía, voltava para a minha mãe e começava tudo outra vez”, contou Kalvin Phillips, no verão passado, ao Mirror.

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Neste contexto, o internacional inglês teve uma infância essencialmente marcada por dificuldades financeiras. A família, quase sempre liderada apenas pela mãe, vivia num casa com apenas três camas: Kalvin dormia num beliche com o irmão, as duas irmãs partilhavam a outra cama e a mãe dormia no sofá da sala. “Almoçava na escola através do programa das refeições gratuitas. Via os outros miúdos com almoços que levavam de casa, com sandes e barras de chocolate. Riam-se de mim por causa disso. Eu ia para casa e perguntava à minha mãe porque é que não podia levar o meu almoço. Ela dizia que não tínhamos dinheiro para isso”, revelou Kalvin Phillips.

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“Houve alturas em que a minha mãe não jantava porque não havia comida para todos à noite. Ela tinha dois trabalhos para nos alimentar a todos. A minha avó também ajudava”, acrescentou, aproveitando para sublinhar a importância do trabalho desenvolvido por Marcus Rashford nos últimos anos no que toca ao alargamento do programa de refeições gratuitas nas escolas para as crianças das famílias mais desfavorecidas.

O médio, que tem a mesma namorada desde os 11 anos, explicou ainda que não gosta de visitar o pai na prisão — apesar de viver a escassos minutos do estabelecimento prisional, passando mesmo à porta praticamente todos os dias na ida para o treino. “Passo por lá todas as manhãs. Já o visitei umas vezes mas não gosto de o ver na prisão. Prefiro falar com ele por telefone. Falo com ele todas as semanas”, indicou.

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Kalvin Phillips entrou na formação do Leeds aos 14 anos e não voltou a sair, escalando as camadas jovens até chegar à equipa principal e ser então um dos elementos fulcrais no regresso à Premier League. As boas exibições com Marcelo Bielsa — que na última época foi substituído por Jesse Marsch — valeram-lhe o salto até à seleção inglesa, tendo sido titular em quase todos os jogos do Euro 2020, incluindo na final perdida nas grandes penalidades contra a Itália. Agora, reforça o meio-campo do Manchester City depois da saída de Fernandinho e torna-se a terceira novidade do verão para Pep Guardiola, depois do ex-River Plate Julián Álvarez e do ex-Borussia Dortmund Erling Haaland.