O Tribunal de Justiça da União Europeia rejeitou o pedido de tramitação acelerada das questões colocadas pelo Tribunal da Concorrência no processo em que 11 bancos recorreram de coimas de 225 milhões de euros por partilha de informação sensível.

Há três meses, em 28 de abril último, a juíza Mariana Machado, do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, considerou que a troca de informação sensível entre bancos aponta para uma “coordenação informal restritiva da concorrência”, mas entendeu esclarecer a questão junto do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), pedindo tramitação acelerada, dado o risco de prescrição (em setembro de 2023), o que, segundo fonte judicial, não foi aceite.

Na leitura da sentença, em que deu como provado que os 11 bancos que recorreram de coimas de 225 milhões de euros aplicadas pela Autoridade da Concorrência (AdC) trocaram entre si informação reservada, reduzindo a incerteza e os riscos em relação à concorrência, a juíza declarou a suspensão da instância, remetendo um pedido de esclarecimento ao TJUE relativo ao artigo 101.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), que proíbe acordos entre empresas suscetíveis de impedir ou restringir a concorrência.

Em concreto, o TCRS pediu ao TJUE que clarifique se o artigo 101.º do TFUE se opõe a que a troca de informação sensível, que Mariana Machado deu como provada, seja qualificada como “restrição da concorrência por objeto” e, se sim, se mantém esse entendimento quando não seja provada a existência de “eficiências, efeitos ambivalentes ou pró-competitivos”.

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A juíza justificou a decisão de “dar a palavra” ao TJUE pela “recente prática decisória” do Tribunal da Relação de Lisboa, que “em duas situações distintas acionou” este mecanismo, pelo caráter precursor do objeto dos autos e por não encontrar precedente para o caso na jurisprudência do TJUE sobre os conceitos de restrição da concorrência por objeto e por efeitos.

Reconhecendo que o envio para o TJUE foi invocado pelas defesas dos bancos desde o início da fase judicial, Mariana Machado justificou o momento da decisão com a necessidade da “estabilização dos factos provados e não provados”, só possível com a discussão em julgamento.

A juíza considerou relevante não terem sido dados como provados os “efeitos ambivalentes ou pró concorrenciais pretensamente decorrentes do intercâmbio” de informação, como alegaram as defesas, mas que “não se demonstraram em juízo”.

Na sua decisão, o TCRS considerou ter sido provado durante o julgamento que os 11 bancos que recorreram da decisão da AdC trocaram entre si informação sobre preços/taxas de spread (atuais e futuras) que não eram do domínio público ou que eram de difícil acesso e sistematização.

Deu, ainda, como provado que trocavam entre si valores mensais de produção, com dados individualizados de cada banco sobre quantidades comercializadas relativas ao mês anterior.

Declarou, também, provado que a troca de informação, ocorrida num mercado relativamente concentrado (em que os seis maiores bancos representam mais de 80% do mercado), “facilitou o alinhamento” e permitiu o “estabelecimento de uma coordenação informal entre as instituições bancárias”.

Contudo, “por ausência de meios de prova que a sustentem”, considerou não ter sido possível provar que “a troca de informação gerou eficiências, projetadas no bem-estar do consumidor e/ou efeitos pró-concorrenciais ou ambivalentes”, como alegaram os bancos nos seus recursos.

Sobre a questão da inconstitucionalidade da apreensão de correio eletrónico durante as buscas realizadas pela AdC, invocada pelas defesas, o TCRS considerou que a atuação da autoridade administrativa foi válida.

O processo, em que está em causa a prática concertada de troca de informação comercial sensível, entre 2002 e 2013, nomeadamente com partilha de tabelas de spreads a aplicar aos créditos a clientes (habitação, consumo e a empresas) e de volumes de produção, teve origem num pedido de clemência apresentado em 2013 pelo Barclays.

A AdC condenou a CGD ao pagamento de 82 milhões de euros, o Banco Comercial Português (BCP) de 60 milhões, o Santander Totta de 35,65 milhões, o BPI em 30 milhões, a CEMG em 13 milhões (coima reduzida em metade por ter aderido ao pedido de clemência), o Banco Bilbao Vizcaya Argentaria em 2,5 milhões, o BES em 700.000 euros, o Banco BIC em 500.000 euros, o Deutsche Bank (cuja infração prescreveu em outubro de 2020) e a Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo em 350.000 euros cada um, a Union de Créditos Inmobiliarios em 150.000 e o Banif (que não recorreu) em mil euros.

O Abanca, também visado no processo, viu a infração prescrever ainda na fase administrativa e o Barclays, que apresentou o pedido de clemência viu suspensa a coima de oito milhões de euros que lhe foi aplicada.